ANGOA . A MÃO DE DEUS no rio dos elefantes . Não há palavras para vos descrever o que senti ali acocorado entre os dedos Dele - 3ª de 3 partes
Por
Dy - Dionísio de Sousa (Reis Vissapa) - Autor de “Ninguém é Santo” escrito para todos os Angolanos que amaram e amam a terra que os viu nascer ou crescer…
(…) NA FOZ DO RIO QUATIR - Ninguém me ligou peva e só quando cacei o almoço e o jantar com dois tiros de caçadeira é que a vizinhança debandou alvoraçada. O trabalho não era nenhum. Medir diariamente numa vara hidrométrica as oscilações de caudal o que me ocupava pouco mais de dois minutos, sobrando-me tempo para explorar aquele paraíso que jamais se apagará da minha memória. Dei com a mão de Deus quase um mês depois de ali estar. Já calcorreara a pé os quinze quilómetros que me separavam de umas das mais formosas quedas de Angola, as quedas de Montenegro e banhara-me em piscinas naturais únicas no mundo com o fragor da água caindo em anfiteatro sobre o meu corpo.
Decidi um dia explorar um rio de aluvião apelidado de Rio dos Elefantes, palmilhando a areia do seu leito seco para montante uns largos quilómetros. Alcateias de babuínos (Macaco Cão) tentando amedrontar-me com os seus latidos, as fêmeas correndo com os seus rebentos à cacunda e os mais excitados fazendo-me caretas. Manadas de impalas pulando com uma elegância ímpar e Olongos de cornos altivos fugindo ao retardador. Foi quando deparei com ela, a mão de Deus. Enormes monólitos naturais de granito, dispostos de forma circular bem em frente aos meus olhos fazendo lembrar a mão do Senhor. Mais de dez metros de altura que eu marinhei com sofreguidão para do alto poder deslumbrar-me com a paisagem.
Foi quando os vi e precisaria mais que uma crónica para vos descrever a beleza e o encantamento daquele momento. No interior daquela construção ciclópica uma manada de elefantes com as suas crias banhava-se numa lagoa circular, largos metros abaixo da minha posição estratégica. Não há palavras para vos descrever o que senti ali acocorado entre os dedos de Deus. Há uns meses atrás vi em casa um filme classe B em que uma menina viera para a Namíbia para ver o pai que se separara da mãe oito anos antes, tendo vivido todo esse tempo na Europa.
Uma história mal contada de um desastre de avião em que a menina se aventura pelo deserto dentro com um negro que lhe ensina os segredos da natureza e da região, à procura do pai desaparecido que se envolve numa luta com terroristas, não sei onde. A Mão de Deus é a única coisa decente do filme, embora erradamente situada em território Namibiano. Os elefantes que eu vi há cinquenta anos atrás ainda por lá andavam. A minha mulher ficou transtornada quando me ouviu a soluçar baixinho com a comoção. – Mas o que se passa homem. – Não se passa nada, foi só a Mão de Deus que me acenou de novo.
Reis Vissapa
As escolhas de T´Chingange
ANGOLA . A MÃO DE DEUS no rio dos elefantes. Não há palavras para vos descrever o que senti ali acocorado entre os dedos Dele - 2ª de 3 partes
Por
Dy - Dionísio de Sousa (Reis Vissapa) - Autor de “Ninguém é Santo” escrito para todos os Angolanos que amaram e amam a terra que os viu nascer ou crescer…
(…) Menos de um ano depois uma sólida amizade desenvolveu-se entre todos nós. Eu era mais novo do grupo e talvez o mais irreverente o que deu em vários desterros compulsivos para lugares de beleza inimaginável, acabando esses castigos por se tornarem uma bênção de Deus. Evito escrever crónicas verdadeiras sobre essa época por que deixam sempre a impressão de autobiografias exageradas. Não resisto a falar-vos da Mão de Deus.
O Nissan azul dos serviços veio a derrapar nos barros negros até à Oncócua conduzido por Luís Negrão grande amigo cuja história interessante e trágica contarei numa outra crónica mais lá para a frente. Depois de bebermos umas Cucas na loja de mato do Serafim partimos em direcção ao Cunene onde o meu colega me deixou sozinho a largos quilómetros de distância da civilização. Fiquei instalado numa construção inacabada sem portas nem janelas e apenas com telhado.
Um luxo sem luz ou água. Mobília o meu burro de campanha e a mala do rancho, vizinhos meia dúzia de osgas empanturradas de moscas e mosquitos, aranhas com um bojo amarelo enorme e cerca de seis centímetros de largo que corriam a uma velocidade estonteante, uma cobra rateira que fugiu pela janela a sete pés e uns rilhetes semelhantes aos dos cães que vim mais tarde a constatar que o meu alojamento era usado como W.C. pelas hienas.
Depois de ter passado três meses numa tenda na foz do rio Quatir, afluente do Cubango, encontrava-me finalmente num hotel de alto de luxo. Dormi que nem um justo e de madrugada com o sol a raiar olhei pela suposta janela e dei de caras com uma das paisagens mais belas da margem do Cunene. Bandos de capotas e perdizes debicavam sementes e insectos num frenesi perante os meu olhar sonolento. Uma manada de impalas pastava pachorrentamente junto ao arvoredo que sombreava o rio e dezenas de “chicos-laricos “ pulavam numa chinfrineira pegada de árvore para árvore.
As opções do Soba T´Chingange
ANGOLA - DESTINOS . PÁSSARO DE MEL - Morre um capim, nasce outro…
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DY – Dionisio de Sousa (Reis Vissapa) - Sempre Angola e a sua magia
O Unimog da brigada dos rios ziguezagueava as margens do Cunene, deixando as esplendorosas quedas do Ruacaná para trás dirigindo-se para a foz do rio dos elefantes, onde tencionavam montar o nosso acampamento. Por idade foi-me reservado o lugar da carroçaria e os meus gritos para o Monteiro Ferreira abrandar o andamento dando-me tempo para me desviar das espinheiras e manter o equilíbrio, se chegavam aos seus ouvidos ele não ligava peva. Quando estacionámos num idílica clareira que marginava o rio cristalino, todos os arranhões das unhas de gato deixaram de arder com o bálsamo que aquele éden emanava. Os silvos competiam em beleza com os mutiátis e mulembas de porta altivo rodeando um círculo de terra perfeitamente calcado e acolhedor.
Um frémito de prazer percorreu-me o corpo e o sangue parecia acalentar-me as entranhas. Ali estava eu aos dezassete anos, deslumbrado com aquele paraíso perdido nas terras do Cuanhama. Os dias deslizavam fascinantes pelos meus olhos quando medíamos a profundidade do Cunene espiando-lhe os contornos do leito com uma vara hidrométrica. Vogávamos pelos seus braços num Zodiac pneumático, rodeando ilhas de encanto e descendo rápidos imprevistos onde as águas saltavam em novelos de espuma alva. Verde de mil matizes coloria as margens povoadas de águias pesqueiras e íbis elegantes e, de longe-em-longe encontrávamos caíndes de invulgar delicadeza, dessedentando-se nas águas frescas. O meu periclitante calendário precisava cerca de um mês naquele lugar onde a mão de Deus se esmerara.
Aos fins de tarde descansávamos o corpo exausto nas cadeiras articuladas de lona verde usufruindo o fabuloso espectáculo de uma família de hipopótamos que desde o dia que ali havíamos chegado se instalara no remanso que distava meia dúzia de metros da margem. O macho e a fêmea brincando com a cria em cabriolas ágeis e surpreendentes para o avantajado dos seus corpos! Vamos ter visitas - Murmurou o Ferreira, quebrando a magia do instante. Achas? Perguntou fleumático o Negrão. O Artiaga no seu habitual pragmatismo acrescentou: – Só se forem algumas muximbas que venham montar aqui as suas cubatas. Tirando as idas do Esteves ao Chitado para renovar o rancho, nada nem ninguém aparecia por ali.
Uma avezinha graciosa batia asas pairando quase por cima das nossas cabeças, chilreando aflita como se quisesse comunicar algo. É o pássaro-do-mel, comentou o Alfredo com o cachimbo fumegante na boca. Este aqui? - Sim esse que anda aqui por cima de nós. E então? - Vem anunciar visitas. A descrença lia-se no olhar dos meus companheiros de brigada, mas ninguém ousava pôr em dúvida a experiência do Ferreira, no que dizia respeito a assuntos de mato. Se calhar! Disse o Blandira. O experimentado caçador, remeteu-se a um mutismo próprio dos homens que conheciam África e os seus segredos, só quebrado pelo Boa noite, durmam bem! Quando nos fomos deitar.
O pássaro-do-mel não mentira ao Alfredo. Tivemos na realidade duas visitas em vez de uma. Por volta das quatro da manhã uma restolhada assustadora pôs todo o mundo fora das tendas num abrir e fechar de olhos. O Monteiro estava cá fora com a Winchester 73 que o Jonh Wayne usara no filme do mesmo nome e que nós chamávamos de “Trinta x Trinta”. Xíííuuu… Elefantes! Murmurou baixinho para mim. Onde estão? Não os ouves!? Oiço mas não vejo. Mas eles vêem-te, podes crer. Não foi grande ideia ter montado o acampamento no trilho deles, não estão nada satisfeitos.
Mas foi o Alfredo que escolheu este lugar. Pois foi isso que o pássaro de mel me veio dizer, retorquiu. Os elefantes ainda reclamaram por algum tempo a sua passagem, mas a fogueira ainda flamejante e o barulho que fizemos levou-os a irem beber ao rio por um atalho. Já o sol se aproximava do meio-dia quando o Comandante Reis, chefe da Brigada dos Rios, chegou ao acampamento numa visita inesperada.
No advento da televisão e do telemóvel, lembro-me vezes sem conta do meu Pássaro de Mel. Espero ansioso que ele me faça uma visita alertando-me para uma manada de elefantes que vêm repreender-me por ter feito o meu acampamento no sítio errado. Acho que o Monteiro Ferreira os levou a todos para parte incerta, pois tal como eu não gostava de telemóveis. Por onde andará ele agora, mais os elefantes e a alegre família de hipopótamos que morou ao meu lado quando eu tinha dezassete anos! Lá longe no Cuanhama.
Kissanji: - Instrumento musical - tábua de forma rectangular, onde se fixam umas palhetas de metal que accionadas transmitem sons (Angola).
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