Terça-feira, 31 de Outubro de 2023
VIAGENS . 99

NAS FRINCHAS DO TEMPO – NO REINO XHOBA - (HOODIA)

"DOS TEMPOS DE DIPANDA“ - Crónica 3510 – 31.10.2023

-Às margens do Cubango - “Missão Xirikwata” - “Tropas cubanas para Angola, já!” - Nossas vidas têm muitos kitukus…

- Escritos boligrafados da minha mochila – Aleatoriamente após 1975 e, ou entre os anos de 1999 a 2018

Por: T´Chingange (Otchingandji) – Em Lagoa do M´Puto

sacag11.jpg Cubanos em Angola para resolver os conflitos entre o MPLA, a UNITA e a FNLA!? Uma treta! As forças cubanas iam fundamentalmente para ajudar o MPLA. Luís Marinho da Revista VISÂO adiantou na conversa secreta entre Otelo e Fidel - Diz Otelo: “Foi uma conversa muito secreta, na qual Fidel começou por me contar que tinha recebido uma visita de Agostinho Neto, presidente do MPLA, que se mostrara muito apreensivo com o que estava a acontecer em Angola. Havia muitas forças em confronto: a FNLA, apoiada pelo Zaire e os americanos e a UNITA, apoiada pela África do Sul…”

E, continua: “…Quanto ao MPLA, Agostinho Neto temia que ficasse isolado, uma vez que também estava muito dividido interiormente. O MFA, via Rosa Coutinho, tinha evitado que o MPLA se afundasse. Tinha sido uma directiva do MFA. Agostinho Neto considerava que, se não houvesse apoio militar significativo, o MPLA seria esmagado. Segundo Fidel, Agostinho Neto já tinha contactado Costa Gomes, a quem pedira que as forças militares portuguesas ficassem em Angola, depois da independência, para arbitrar o conflito.”

john4.jpg E, continua: “… A resposta de Costa Gomes tinha sido muito evasiva e, Agostinho Neto não acreditava que o presidente português aceitasse o pedido. Desta forma, pediu apoio militar aos cubanos. Fidel Castro pediu a minha opinião (É Otelo que o diz), sobre isso, confessando que estava hesitante; garantiu-me que se as forças militares portuguesas ficassem em Angola depois de 11 de Novembro, não enviaria tropas cubanas para apoiar o MPLA. Caso contrário, estava disposto a envolver-se no conflito.”

E, continua: “…Eu disse-lhe abertamente que não acreditava que as tropas portuguesas podessem ficar em Angola depois da independência, tendo em conta a situação interna em Portugal, mas ofereci-me para levar uma mensagem ao Presidente Costa Gomes, a quem pediria que desse rapidamente uma resposta ao dirigente cubano.”

guevara0.jpg E Otelo, continua: “… No entanto, aconselhei Fidel a preparar as suas tropas para seguirem para Angola. Quando cheguei a Lisboa, no dia 31 de Julho, fui directamente para uma reunião do Conselho da Revolução, que só terminou por volta das seis da manhã do dia seguinte, 1 de Agosto. Apesar disso, falei com Costa Gomes no seu gabinete do Palácio de Belém, e expus-lhe a situação.”

E, continua: “… Só me disse que o assunto ficava com ele. Acho que Costa Gomes nunca respondeu a Fidel (mentira, digo eu…). De certa forma, esta conversa marcou o destino de Angola”. De facto os primeiros contigentes cubanos chegaram a Angola nos primeiros dias de Outubro. Foram transportados de barco e desembarcaram em Porto Amboim. Sabe-se que assim não o foi pois, entraram muito antes! Lá mais para a frente, vamos ficar a saber

sara1.jpg Oficialmente, Cuba só respondeu ao pedido do MPLA em 5 de Novembro (Acho que foi bem antes com o envio de concelheiros e observadores…) . Foi então desencadeada uma operação de transporte de tropas, por via aérea, denominada operação Carlota, que, até à data da independência, 11 de Novembro, colocou em Luanda cerca de três mil soldados cubanos, afinal os principais responsáveis pela reviravolta registada na situação militar, favorável ao MPLA.

CUBA14.jpg Por todo o lado, em Angola, de Cabinda ao Cubango, dia para dia, viam-se menos caras conhecidas da rua, no bairro, no trabalho; médicos, engenheiros, padeiros, contínuos, bancários.  Davam o fora - bazavam de um momento para o outro  sem nada dizer, talvez escondendo sua cobardia; não queriam ficar para assistir aos dez e onze de Novembro porque tudo era uma incógnita… Para trás iam ficando cidades fantasmas aonde só o vento uivava com alguns cães deixados ao abandono. Malange foi assim em um certo tempo, a cidade mártir, os relatos radiofónicos das emissoras, Oficial, Católica e Rádios Clube, eram de arrepiar…

(Continua…)

O Soba T´Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 12:51
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Terça-feira, 8 de Agosto de 2023
VIAGENS . 50

NAS FRINCHAS DO TEMPO – UM CACTO CHAMADO XHOBA (HOODIA)

- "DOS TEMPOS DE DIPANDA“ - Crónica 3460 – 08.08.2023

- Boligrafando estórias em Swakopmund e Cape Cross - Em direcção a Ondundozonanandana mais a Norte… Foi no ano de 1999

Por gettyimages-1162778255-612x612.jpgT´Chingange (Otchingandji) – Em Amieiro do M´Puto

gettyimages-97389630-612x612.jpg Viver assim num perfeito NADISMO titubeando versos amarelados ou mesmo cobertos de pó, envolto assim num mukifo de aposentos forrados com ele e, como se o fossem azulejos enquadrados na estória duma estação de caminho-de-ferro do M´Puto desactivada – Um NADA numa estação aonde já não passam comboios, faz muitos anos. Nestas viagens pensa-se e fala-se em coisas longínquas como que para preencher o espaço-tempo.

Naquela estrada de terra batida com sal, dura, do nada, verificamos haver muitas gaivotas voando; elas subiam e desciam bruscamente até esta estrada dura de sal escurecido. Achamos que havia qualquer coisa de diferente em essas manobras de voo e, observando mais atentamente podemos ver a elas, as gaivotas, deixarem cair qualquer coisa de seus bicos e, em seguida em voo picado descerem também acompanhando o pedaço de coisa.

gettyimages-94975018-612x612.jpg Em realidade havia manchas no piso com umas cascas destroçadas. Vai daí paramos para ver o que era aquilo e eis que deparamos com dezenas de manchas húmidas que afinal, eram caracóis do mar com uma ou outra ostra. Aí estava nossa incógnita, um mistério. Eram gaivotas lançando bem do alto aqueles pequenos animais para assim se desfazerem no choque em contacto com o piso da estrada C34, quase na milha 72 do Dorob National park. Mistério bem interessante.

Assinalamos o rumo de sua procedência e metemos por uma picada de piso seguro até chegar ao mar. Deparamos logo com muitas algas lançadas ao mar com a maré e, tendo nelas esses caracóis com mais de cinco centímetros. Iam e vinham com a ondulação. Aquilo era um pitéu grátis e, assim foi: apanhamos o quanto podemos desses burriés gigantes para mais tarde cozinharmos no Dolfim Park.

gettyimages-520307596-612x612.jpg Andávamos a medo pois que vimos bastantes marcas de bichos que o deveriam ser de chacais mas, a imaginação galgava para outras bestas como a hiena e o leopardo. Até confrontamos as pegadas com um livro que levávamos mas, nada o foi em definitiva certeza. Claro que ficamos vigilantes perante aquela vastidão e aonde as miragens era permanentes, cansando literalmente os olhos pois que até víamos nas dunas em terra, lagos de água bem azulinha; coisa nunca vista – muitas miragens…

E, afinal aonde nos encontrávamos. Bem! Estávamos já além da milha 72, perto de Cape Cross. Chegos ali, espanto - podemos ver milhares de focas, umas com crias outras cuidando delas lançando uivos guturais em tons variados. Guinchando suas forças. Uns chacais que espreitavam o descuido das mães focas para atacarem suas crias – algumas de nascimento recente. Vimos este acontecimento na mais tranquila função e, a mãe, correndo desajeitadamente para a tentar salvar, não o conseguiu…

gettyimages-521401248-612x612.jpg O mais destacável, depois das miragens, depois dos medos, era o cheiro forte que já se sentia a um quilómetro deste promontório. Promontório muito farto de pedras roliças, grandes – penedos! Penedos em que, os corpos destes animais se confundiam com elas, as rochas escurecidas. O cheio era um misto de peixe apodrecido com gordura de sebo exalado de seus corpos.

swakop16.jpg É essa gordura que as protege do frio e lhe dão melhor agilidade para deslizar na água, fugir a tubarões e baleias que por aqui, as visitam com regularidade. Passados tantos anos, ainda posso sentir aquele cheiro. Mais à frente e já na via D 2301, podemos ver os esqueletos de barcos e peixes de grande porte – Talvez baleias. Entre o macabro e o belo, a Costa dos Esqueletos é o nome também conhecido como "As Portas do Inferno", repleta de ossos de baleias e até gente pirata que deram à costa…

– Lugar assombroso…

(Continua…)

O Soba T´Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 17:19
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Domingo, 6 de Agosto de 2023
VIAGENS . 48

NAS FRINCHAS DO TEMPO – UM CACTO CHAMADO XHOBA (HOODIA)

- "DOS TEMPOS DE DIPANDA“ - Crónica 3458 – 06.08.2023

- Boligrafando estórias entre Welvis Bay e Swakopmund - Em direcção a Ondundozonanandana mais a Norte… Foi no ano de 1999

Por:swakop20.jpgT´Chingange (Otchingandji) – Em Amieiro do M´Puto

swakop19.JPGO vento sopra forte do lado de Dorop National Park trazendo areias por quilómetros e eu, galgava-os com receio de haver ali um furo de pneu, o carro teimava em desviar-se para a esquerda mas, em realidade era a força do vento quente que me forçava a preocupação – As nossas palavras são como sombras que nunca podem explicar por inteiro a luz de medos ou ansiedades que sempre transportamos connosco.

Nunca isentos de culpas e formulando nossos destinos, assim o deixávamos derramado, nosso ADN, na mistura do vento, do pó e quenturas com adrenalina; culpados de muitos nenhures ou pequenas coisas, assim formando grandes castelos. E, íamos sim, soprado vida na terra do nada na direcção de Walvis Bay, o principal balneário da Namíbia e um dos mais bem preservados exemplos da arquitectura colonial alemã no mundo.

Walvis Bay, foi fundada em 1892 como sendo o principal porto do Sudoeste Africano Alemão; um dos poucos lugares da África onde uma minoria considerável da população fala alemão e tem raízes germânicas. Fica no trajecto da Rodovia B2 e da Rede Ferroviária Transnamibiana, que vai Windhoek e a Walvis Bay. Tem seu próprio aeroporto e prédios notáveis, bonitos, um espanto no meio duma vastidão de areia.

swakop18.jpg Neste descobrir de novas coisas ficamos num aprazível mas modesto conjunto de bungalows situado junto ao mar e margem dum rio de areia, mulola de nome Swakop, o que deu origem a este nome à cidade tipicamente alemã aonde morou o ET, um amigo extraterrestre de nome Eduardo Torres. E, assim atirando palavras desprendidas, recordamos terras com vazios aonde a verdade e a mentira passam pela mesma boca como rastos de picada que viram lendas.

Aqui e ali no meio da secura do Karoo íamos pendurando como tufos de teias nas espinheiras do tempo nossos medos e angústias e coisas do mundo sem saber se tudo era o que parecia ser. Diz-se de que, quem quer falar de assuntos sigilosos vai para o deserto mas, nós, não arriscávamos limpar o lacre dos actos e pensamentos porque já tinhamos o coração endurecido na vulgaridade vivida.

swakop17.jpg Um pouco antes de chegar a Welvis Bay deparamos com lagoas repletas de flamingos – o Bird Sanctuary na estrada M36. O Naukluft e Sossusvlei com suas dunas mágicas foram ficando distantes, mais a Sul. Uma volta rápida a Welvis Bay, umas compras indispensáveis para curtirmos sobrevivência na noite que se aproximava e já a caminho de Swakopmund, assentamos arraial no Dolfim Park – um conjunto de chalés, bem confortáveis.

Da varanda deste chalé podíamos admirar a imensidão do Oceano Atlântico vindo saudar-nos com bátegas chapadas nas rochas – um recife que se estendia ao longo da costa, um cheio intenso a mar – um lugar bem aprazível aonde ficamos duas noites.

swakop13.jpg Esta frescura do Atlântico é devido à corrente fria de Benguela que já se fazia sentir há quase quinhentos e cinquenta anos atrás quando por aqui passaram os navegadores portugueses a caminho da Índia das especiarias. Por ordem do rei D. João II, Diogo Cão passou por aqui deixando padrões como o de Cape Cross, construído lá pelo ano de 1482 e, que fica a uns escassos 130 quilómetros mais a norte de onde agora nos encontramos…

(Continua…)

O Soba T´Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 11:17
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Segunda-feira, 31 de Julho de 2023
VIAGENS . 42

NAS FRINCHAS DO TEMPO – UM CACTO CHAMADO XHOBA  (HOODIA)

- "DOS TEMPOS DE DIPANDA“ - Crónica 3452 – 31.07.2023

- Boligrafando estórias em Krabbehoft Guesthouse and Catering. Estávamos ainda em LUDERITZ Foi no ano de 1999

Por swakop5.jpgT´Chingange (Ot´chingandji) – Em Amieiro do M´Puto

luderitz01.jpg(…) Isto (eu mesmo, o kota…), só pode fazer confusão a quem anda sempre teso, com seus colarinhos engomados, cheio de obséquios e unhas estimadas, sem nunca sentir os medos indefinidos que arrepiam as carnes como pés de galinha e arrepios de levantar medos no cocuruto do toutiço. Desfigurado pelo tempo, cheio de cãs, estonteado pelos muitos calores, posso ver minha barba crescer em troços grossos e brancos de um milímetro de comprimento que, só uma gillette de três lâminas as pode debastar.

Passeio pelo mundo, o meu isolamento procurando entreter-me cada vez mais só desencantado com amigos e inimigos – um mundo de loucura e, metido entre meus botões de casca de ostra a fazer estilo de mandela em dia de balalaika zulu… Por vezes as companhias são obtusas e confusas, cheias de nove e onze horas como se fossem os donos de todos os relógios; já me aconteceu destas tormentas mas, agora interessa é continuar a falar de Luderitz, lugar de hienas peludas dum cinzento acastanhado.

luderitz12.jpg Chegamos ali ao fim duma tarde, um frio com vento de arrepiar para cima de nós, deslocando a areia de um para o outro lado da estrada, ora preta de alcatrão ora indefinidamente tapada de areia esquindivada do Kalahári. Aqui, nem pensar em ficar em camping a contar as estrelas e ver aonde está esse Cruzeiro do Sul. A areia era-nos cuspida pelo Nosso Senhor como gente desabençoada, rolos de capim amarfanhado fugindo no medo e no sentido do vento e, nós aqui feitos loucos, uns extra terrestes zoando espantos; assim tinha sido até aqui, assim o foi na estrada que nos trouxe até aqui - Pópilas

Recolhemo-nos no Krabbehoft Guesthouse Catering e apartments embrulhados em nossos kispos tiritando das quinambas e nas orelhas, batendo o dente como metralhadoras do filme do dia D. Vou vos contar - tudo ao molhe e fé em Deus! Havia gente jovem de muitos lados e, na confusão do meu Inglês raspikui do Friday, misturava-se com o “je suis” e falas com tremas na vontade de “seja o que Deus quiser”- Saravá! Dizia eu, para desatarraxar as encrencas das porcas sextravancadas…

luderitz15.jpgAfinal não éramos os únicos malucos a andar soprados ao vento frio da aventura. Ao chegar ali, os hóspedes têm a sensação de ter caído repentinamente nas páginas de um romance de Hemingway, talvez Papillon. Bem! Uma mistura de tudo… Um espírito e, um ambiente ultra "bush", uma caserna bechuanaland com gente estendida pelos corredores dormindo em sacos cama. Óh gente doida! Lá fora as hienas castanhas farejavam os bidons de lixo, os restos de pizza, do tutano dos ossos, assim mesmo como se fossem cães dos arrabaldes duma qualquer outra cidade.

Aqui em Luderitz, as horas acordam cedo desfazendo-se em minutos gélidos pelos sopros do mar, gozando mais regradamente os bens da inteligência e da vida; remexo a chávena com meu especial milongo de adstringir triglicéridos, uma cachaça, aguardente medronho do M´Puto trazida em contrabando para aquecer, pois claro. Ao redor predominava o cheiro de café ondulado em falas da Croácia, do Xingrilá, das Maldivas e até estalidos de mucancala, mucuisse ou mucubal khoisans falando em Morse – acho que era só para fingir ou trinando sons do Alá…   

luderitz1.jpgAssim feito muambeiro, tomei com um agrado, aquele agora da vida na forma de café arábico. Desolando-me numa sinceridade gemida de tudo o que é ilusão, indeferia-me nos contornos que se transportam sempre às costas, um pessimismo que sempre se enrola no soalho do cerebelo. Assim taciturnado, com o kispo enfiado pelas orelhas, todos os cinco (T´Chingas, Marco Manhanga, Ricar, Tilinha e Mãe Bibi), fomos ver o padrão de Luderitz numa ponta pedregosa colocado pelos Tugas em tempos de lá para trás do mu-ukulu, do muito antigamente.

Naqueles tempos de quando ainda se alimentavam sonhos de grandeza com Diogo Can que só chegou ao N´zaire River e, mais tarde o Bartolomeu Dias que passou o Cabo Bojador, e o Vasco das Barbas chamado Gama, que dominou as Índias. Sei o quanto é difícil ler o indecifrável mas soe dizer-se que a teoria do pessimismo quando implodida num deserto, é bem consoladora para os que sofrem e eu, com meus sessenta e quatro anos nesse então (tempo de há catorze anos), já não tinha fornalha para alimentar lentas combustões. Isso - Na forma de chatice! É do frio cortante…

 (Continua...)

O Soba T´Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 08:09
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Quinta-feira, 17 de Setembro de 2020
KALUNGA . IX

MOKANDAS XINGUILADAS NO TEMPO. Crónica 3060

Moçâmedes / Baía dos Tigres /Angola - OS “NOSSOS” CÃES SELVAGENS – 14.09.2020

- Xinguilar: Palavra angolana que significa entrar em transe em um ritual espiritual… 

Por:

tigres1 Teresa Sá Carneiro.jpg Teresa Sá Carneiro

kimbo 0.jpg As escolhas do Kimbo

tigre01.jpg Tive uma infância feliz e muitos cães à minha volta como não poderia deixar de ser. Desde muito pequenos, eu e meus irmãos, vivemos entre eles. O nosso 1º, o querido Lumumba, um “vira-latas” rafeiro, amoroso que chegou a nossa casa no colo do meu pai (lembro como se fosse hoje) foi o nosso companheiro fiel até à adolescência. Acredito ter sido algum presente de um cliente pobre pois, era assim que meu pai, advogado, recebia o pagamento por trabalhos que fazia. Davam-lhe presentes lindos, sem qualquer sombra de dúvida. Ao chegar a casa e ao pousá-lo no chão da varanda, imediatamente, o Lumumba escondeu-se atrás de um vaso de flores. Tenho esta imagem gravada na memória tal como a do último dia que o vimos com vida, também em nossa casa, muitos anos depois. Algum tempo depois tivemos o Bobi, lindo, grande, de pelo grosso cor castanho-caramelo, que chegou a nossa casa acompanhando um amigo nosso de infância e, nunca mais quis ir embora.

tigres2.jpg Dócil e igualmente amoroso, ao contrário do que se dizia sobre o temperamento da sua raça, ele era um cão da Baía dos Tigres, região de cães selvagens. Por este motivo questionava-se se seria uma raça boa para conviver com crianças pequenas mas, a verdade é que ele foi o nosso fiel companheiro, e tal como o Lumumba, o grande amigo daqueles tempos de infância. A Baía dos Tigres era uma península isolada no Distrito de Moçâmedes, que depois se transformou em ilha nos idos anos de 1940, sem nada produzir nem plantar nas suas areias secas. Não havia água em nenhum lugar. Uma história ligava estes cães de raça " Cão Tigre" à minha cidade de Moçâmedes, outrora um dos maiores centros de pesca de Angola e, depois abandonada - vila fantasma. A pequena vila foi fundada por pescadores do Algarve, por volta de 1860, mas séculos antes já tinha entrado nos mapas de portugueses e ingleses pela invulgar quantidade e qualidade de peixe, que lhe valeu a alcunha de "Great Fish Bay".

tigre5.jpg Conta-se que no inicio do século XX teria acontecido um surto de raiva em Moçâmedes, e que o governador da época teria dado ordem para se executar todos os cães da cidade. Muitos donos rebelaram-se contra aquela situação e não querendo perder seus animais de estimação, resolveram metê-los num navio na calada da noite e levá-los para um local longínquo onde não pudessem ser encontrados. Assim, rumaram até à Baía dos Tigres que consideraram ser o melhor lugar para deixá-los. Ali já existia uma raça selvagem de cães deixados pelos Holandeses, os Bóhers, quando da ocupação da África do Sul e com a chegada dos cães da minha cidade resultou no cruzamento que levou à raça “Tigres”. Imperava a lei da selva onde só os mais fortes sobreviveriam; tornaram-se uma raça diferente. Eram ferozes, naturalmente selvagens. Adaptaram-se ao meio e, sobreviviam.

tigre02.jpg Pelo hábito de nadar para encontrar alimento, tornaram-se excelentes nadadores. Eles bebiam água do cacimbo enquanto as gotículas não se misturavam com a água salgada. Era na crista das ondas do mar que encontravam essas gotículas adocicadas para matarem sua sede. E, assim esta raça, sobreviveu adaptando-se às condições agrestes daquele deserto, um canto das terras do fim do mundo. Viviam em matilhas, completamente isolados, alimentando-se de peixes e focas que vinham na Corrente Fria de Benguela desde a Costa dos Esqueletos - Cape Cross, aparentemente sem precisar de água para viver - ouvia meu pai dizer isso desde muito pequena, sobre aqueles cães.

tigre9.jpg Mas tudo não passava de uma cisma, acreditava eu! Viviam em nossas casas como qualquer outra raça, e não eram poucos, pela cidade. Realmente cães grandes (impunham um certo respeito) mas,  os domesticado, não faziam mal a ninguém.  Devo ao Bobi uma aventura da minha pré-adolescência; a minha guarda até altas horas de uma noite após ter chegado a casa depois de uma festa de aniversário de uma amiga. Meus pais tinham saído, meus irmãos já dormiam, e uma familiar que estava em casa com responsabilidade de me abrir a porta adormeceu; claro que fiquei do lado de fora. Sentei-me no chão da varanda sem saber o que fazer e já quase dormitando em cima da pedra, sinto o Bobi puxar-me pela roupa e, lá fui eu com ele. Levou-me até ao outro carro do meu pai que estava no fundo do quintal guardado na garagem da casa. Entrei, tonta de sono, deitei-me no banco de trás; ele sentou-se do lado de fora, de plantão. Sei que a porta do carro estava fechada mas não me lembro de ter sido eu a fazê-lo. Foi assim que meus pais me encontraram, já alta madrugada, mas só após terem ido àquela hora até casa da minha amiga aniversariante para saberem onde eu estava. Foi uma noite tensa! Este foi o Bobi o “feroz” cão Tigre que nos acompanhou por tantos, e tão felizes anos da nossas vidas.

tigre0.jpg Adenda 1 - Teresa Sá: Numa explicação mais detalhada acrescento o seguinte: de menor densidade, as gotículas de água doce ou seja, o orvalho da noite (o nosso cacimbo) depositadas em noites sem vento na crista das ondas, permaneciam por algum tempo sem se misturar com a água do mar. Era assim, logo pela manhã, bem cedo que os cães se jogavam ao mar para matarem a sede. Eram um relógio da natureza bem intrincado! Acredito que, em noites de vento esse orvalho não se depositasse e, eles quebrassem esse ritual lambendo as pedras roliças impregnadas desse cacimbo. É realmente muito interessante e estimulante pensar-se em tudo isto.

luderitz14.jpgAdenda 2 - José Augusto D. Ferreira: Conhecia a história dos cães "Baía-dos-Tigres". Eram, remotamente, descendentes dos "Cães d`Água" algarvios, levados de Portugal pelos pescadores que os utilizavam como auxiliares na pesca. À mistura com cães domésticos ou de estimação, foram levados clandestinamente para a Baía dos Tigres com a intenção de os resgatar mais tarde, por fazerem falta no trabalho. Pelo isolamento, cruzamentos sucessivos, e auto-selecção pela lei do mais forte, adquiriram características uniformizadas. Nos anos 50, o veterinário Dr. Abel Pratas, após a escolha e captura de vários exemplares selvagens, obteve o apuramento e a estabilização de uma nova raça de cães que, mantendo a designação "Baía-dos-Tigres", foi registada oficialmente. Tive a oportunidade de ver alguns deles em Luanda, numa das exposições realizadas para a divulgação da raça. Castanhos ou negros, pela pelagem e morfologia faziam lembrar os "Cães-de-Água", mas eram maiores. Julgo que a raça já não existe por vários motivos, entre eles a descolonização. É possível que os cães dos Bóers fossem da raça "Leão da Rodésia" (Ridgeback). Ver no Google em "Cães da raça Baía dos Tigres", na página "Gente do meu Tempo (Baú de Recordações)". O texto é longo mas interessante.

luandino2.jpg Adenda 3 - Anónimo: O nome de baía dos tigres deve-se ao facto de, por efeito dos ventos formarem-se nas dunas junto à praia listas a toda a altura das mesmas c/ alto e baixo-relevo, umas com a cor castanha da areia outras mais escuras, o que visto do mar lembrava a pele de um tigre.

A baía dos tigres tinha nos anos 60, administração e junta de freguesia, posto da guarda-fiscal, correios, hospital, delegação marítima escola primária, igreja de S. Martinho dos Tigres, um clube desportivo e recreativo, uma carreira aérea bissemanal. Inicialmente a vila era abastecida de água por navios da companhia portuguesa "Sociedade Geral" posteriormente com a conclusão das obras de captação na foz do rio Cunene, acabou o racionamento da água.

Foi uma festa a sua inauguração. Inúmeros habitantes dedicaram-se logo ao cultivo de pequenas hortas, plantio de árvores casuarinas. Tudo morreu, tudo foi abandonado com todas as incertezas antes e pós independência do país.

Foi pena pois muita gente, ainda hoje tem saudades daquela terra inóspita, difícil, que foi habitada por homens e mulheres, Madeirenses de coragem que ali investiram toda uma vida de trabalho e onde ficaram sepultados os seus antepassados.

Teresa Sá Carneiro - 14-9-2020



PUBLICADO POR kimbolagoa às 11:21
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Segunda-feira, 11 de Dezembro de 2017
MALAMBAS CLXXXIII

MOKANDA DO DIA – 10.12.2017Tukya I . Peixe da chana - Apaziguando rijezas adversas, perfilando anjos com a singularidade do mundo . É o nosso pensamento que cria a nossa realidade…

Por

t´chingange2.jpgT´Chingange

Na voragem dinâmica da vida, procuro actualizar-me no dia-a-dia e, ao longo da minha vida registei em meus arquivos de memória muitas notas, alguma que nem quereria registar mas, nem sempre as borrachas do tempo e da singularidade do facto se destroem com um estalar de dedos. Em África também há rios que se apagam na terra, nunca chegam ao mar como o Cuando e o Cubango que formam o Delta do Okavango ou o Etosha Pan e outros que desaguam em desertos de areia fina e, que em tempos foram pântanos ou lagos rasos.

etosha4.jpg O Etosha Pan, é um lago seco de 120 quilómetros formando o chamado Parque Nacional Etosha, um dos maiores parques da vida selvagem da Namíbia. A vasta área é principalmente seca, mas após uma chuva forte, ela adquirirá uma fina camada de água, que é fortemente salgada pelos depósitos minerais na superfície desta grande panela. O Etosha Pan é principalmente lama de barro seco dividida em formas hexagonais que à medida que seca, racha, e raramente é vista com uma fina camada de água cobrindo-a.

etosha6.jpg Foi no Etosha que vi a maior diversidade de animais. Supõe-se que o rio Cunene alimentasse o lago em idos tempos, mas os movimentos tectónicos da placa ao longo do tempo causaram uma mudança na sua direcção, resultando em um lago seco e deixando a referida panela salgada. Agora, o rio Ekuma, o rio Oshigambo e o rio Omurambo Ovambo são a única fonte sazonal de água para o lago.

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Tipicamente, pequenas águas do rio ou sedimentos atingem o lago seco porque a água penetra no leito do rio ao longo de seu curso de 250 quilómetros, reduzindo a descarga ao longo do caminho. Estas vastas zonas de poucos declives formam as chamadas planícies africanas, chanas ou anharas de clima extremamente seco. E, o curioso é de que a esta mesma latitude e para o lado poente temos os desertos junto a costa do Sul de Angola e Norte da Namíbia que são banhadas pela corrente fria de Benguela.

etosha2.jpg Refiro a corrente fria de Benguela porque constitui um dos mais importantes factores de moderação climática desta zona de África com introdução na fauna as focas e pinguins transportados em icebergues que vindos da Antártida aqui são largados. No Namibe, Tômbua, Baia dos Tigres e a Costa dos Esqueletos. Pode até verificar-se famílias de golfinhos na Angra dos Negros a actual Moçâmedes, lugar aonde os albatrozes ou alcatrazes voam baixinho junto aos barcos pesqueiros.

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Cabe qui referir que ante da independência de Angola, em 1975, a pesca tinha importância no mundo porque chegou a ocupar o segundo lugar na escala dos maiores produtores, logo a seguir à República do Perú. Vasculhando minha memória recordo os muitos contadores de estórias de caça e pesca e, até dum amigo meu de nome Araújo ter andado a passear uma pacaça em pleno centro de Luanda; em plena Mutamba. Era muito vulgar entre 1950 e 1960 comprarmos carne de caça a vizinhos que se internavam pelo mato em aventura de caça.

etosha0.jpg Para milhões de pessoas que vivem no mato e nunca viram o mar, o mar não passa de um mistério longínquo e insondável naqueles idos tempos mas no entanto, estes comiam peixe seco saído do mar. Na era colonial e a partir da costa eram enviadas “malas” de peixe para o interior; estas malas iam por comboio ou levadas por camionistas praticando no seu dia-a-dia uma aventura. O peixe sem cabeça, fosse corvina ou carapau, depois de seco e salgado era acomodado em camadas sobrepostas e em zig-zag simétrico, cabeça com rabo – rabo com cabeça.

etosha5.jpg Formavam blocos compactos atados e contidos em esteiras feitas com fibras de grossa mateba. Estas malas de peixe tinham tanta popularidade e valor comercial no interior de Angola que a partir dos anos cinquenta se transformaram no principal produto de candonga no interior do território. E, por que razão se contrabandeava o peixe seco? Vais ser assunto da próxima mokanda cujas falas vão incidir sopre o peixe capim nascido do pântano …

Nota: Alguns dados, foram retirados das Crónicas de Kandimba de Sebastião Coelho

O Soba T´Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 13:05
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Segunda-feira, 23 de Janeiro de 2017
MISSOSSO . XXVIII

NAMIBE - Um texto de Setembro - O Etelvino ainda tinha aquela cor de frango depenado a quente - arrastava-se penosamente pela praia, como tartaruga pronta a desovar...

soba k.jpgAs Opções de T´Chingange

Por

DY00.jpg Dionísio Dias de Sousa - Dy

O Etelvino ainda tinha aquela cor de frango depenado a quente. Arrastou-se penosamente pela praia, como tartaruga pronta a desovar. O sol escaldante torrou-lhe a epiderme, e fez com saltassem escamas do peito dos pés. Tinha desabelhado de lugares frios, onde ganhara vida. Marinhou as escarpas da cordilheira da Chela, deixando para trás as areias brancas que enfeitiçavam o Atlântico e deslumbrou-se com as árvores gigantescas que se agarravam aos granitos e aos basaltos, como bruxas desgrenhadas caídas do céu.

mucu1.jpgAdmirou-lhes as formas e os frutos de sabor intenso. Dessedentou-se nas cascatas que despencavam como ninfas pelas encostas, borrifando-lhe o rosto e refrescando-lhe a pele. No ponto mais íngreme, circundou a vista pelo planalto ajoelhado aos seus pés. Sentiu-se como o patriarca Moisés divulgando a palavra de Deus.

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Deliciou-se com os riachos rasgando os prados com águas cristalinas, saltitando aqui e ali sobre rochas que gemiam música à sua passagem e manchas de arvoredo prestando-lhes homenagens, abanando as copas ao ritmo da brisa fresca, como cristãos adorando santos de procissão. Reparou nas criaturas de Deus que caminhavam as encostas com pezinhos de rola, e alegria de estrelas.

maian5.jpg Os seios desnudos abanando ao ritmo dos seus risinhos discretos, com as argolas de latão reluzindo e chocalhando ao sol nos braços e nas pernas. Murmúrios das suas bocas graciosas chegavam-lhe aos ouvidos numa linguagem ininteligível. Inspirou forte os odores selvagens e almiscarados que lhe invadiram as narinas. Abriu as asas como um condor e lançou-se ao espaço num suicídio premeditado, planando o céu em desenhos circulares, abrindo caminhos entre os flocos de algodão que caminhavam lentos em direcção ao sol.

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Mergulhou a pique em direcção ao solo e aterrou com ternura num prado de flores silvestres, onde pássaros coloridos levantavam em bandos recortando figuras no firmamento. Escolheu criteriosamente o espaço para construir o ninho. Desventrou a terra e regou-a com o seu suor. Engravidou-a com sementes de esperança e assistiu pasmado ao rápido desabrochar do pão. 

monteiro1.jpg Descansando os seus cansaços ao entardecer ao som do mungir do gado gentio de cornos enormes, onde pousavam pássaros de bico vermelho, que faziam a limpeza das suas peles de cores diversas, parecendo borrões de tinta ressaltando de uma parede. E a serenata dolente que escutava, desfazia-se em magia no poente incandescente, escondendo-se ao longe no negrume da cordilheira que o rodeava, aconchegando-lhe o corpo e a alma. E o crepúsculo envolveu-o com um lençol gigante vindo dos céus, confeccionado por anjos com linhas de tons violeta e laranja.

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Miríades de estrelas acenderam a noite e iluminaram-lhe o rosto numa magia estranha que o fez pequenino, mostrando-lhe a dimensão grandiosa da terra, que rezava na escuridão em cânticos de mil criaturas Uma conspiração conjunta contra a paz e o silêncio, numa sinfonia que começou a decifrar. Uma enorme sensação de gratidão foi envolvendo o seu dormir, e os sonhos desenrolavam-se ao sabor dos dias. A sua pele foi adquirindo a tonalidade morena das areias do deserto que palmilhara antes de subir ao planalto.

ÁFRICA8.jpg Roubando-lhe a tonalidade branca e pálida que navegara com ele do outro lado mundo. África moldava-o como o cinzel de um escultor, enrijecendo-lhe os músculos, e pintando-o com as cores do princípio da criação. Mudou-lhe a pele e o sangue e moldou-lhe um espírito novo, sem limitações de espaço ou tempo.

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E as memórias antigas esfumaram-se como o fumo das fogueiras, que ardiam ao som de histórias novas, tão antigas como o mundo. E no crepitar da lenha que vomitava chamas ao céu, deixou-se imolar em sacrifício, ao sabor das rezas das fadas e duendes de pele escura que lhe saravam a solidão.

missosso1.jpeg E é neste deslumbramento universal que se deita na esteira de caniço, e se deleita com a magia melancólica da íris que o contempla, como se fosse o único. Neste esplendor concebe uma mulher nova, moldada com o ardor de África, o fulgor das estrelas, a ternura das planícies, o mistério dos bosques, os odores das flores selvagens e a sensualidade das cascatas despencando-se fogosas num ramalhete de flores de pétalas de espuma branca: A mulata.

Reis Vissapa



PUBLICADO POR kimbolagoa às 11:29
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Quarta-feira, 1 de Outubro de 2014
FRATERNIDADES . LXVIII

MOÇAMEDES Tempos do tira-linhas maluco

Por

  Eduardo Torres

Em 1961, tendo sido extinta a Brigada do C. F. Moçamedes, fui transferido pra o colonato da Cela, após ter estado hospedado na pensão do Monte; fui viver com o amigo Francisco Ferrer, que só conheci na secção de desenho aonde éramos colegas de profissão. Criamos uma amizade que nos levou a morar juntos. Até conseguir a rescisão de contrato, vivemos em Freixo por cerca de seis meses. São amizades que nascem, para permanecerem pela vida fora, independentemente de podermos estar perto, ou longe. Há favores que nunca se pagam, mas a razão de permanecermos gratos pela vida fora, é um dever de consciência. Trabalhávamos ambos, na fiscalização da hydrotecnic, fornecendo os elementos necessários, a partir dos registos de topografia sob a chefia do engenheiro Castanheira.

Isto foi numa época em que se desenhavam curvas de nível com o tira linhas maluco, em que era preciso ter mão firme, para ser de facto desenhador. Não havia computadores nem programas para facilitar como o é agora. Era nesse então ter a precisão necessário para afinar os tira linhas a fim de manter o traço com a mesma espessura. Mais tarde apareceu a caneta Graphos, com os seus aparos numerados, permitindo manter a espessura de acordo com o número de aparo utilizado.

Era forçoso desenhar sobre a tela, limpar-lhe a gordura com talco, e começar a riscar, sabendo que não eram possíveis emendas, porque a dita tela não permitia raspagens com lâminas. Isso sim, …. É que era desenhar!... Que saudades do tempo em que o talento se impunha, porque era preciso técnica pessoal, de tal modo, que os trabalhos se tornavam personalizados. Em tudo há virtudes e defeitos! Claro que sou a favor de novas tecnologias, utilizo iPad para escrever e contactar os meus filhos fora do pais e, aceito a evolução verificada e que tem efeitos positivos pela rapidez em uma qualquer profissão, mas não posso esquecer os difíceis tempos das múltiplas dificuldades para se efectuar um trabalho de desenho, um projecto em geral com as cópias ozalid, primeiro usando painéis de vidro que se expunham ao sol para revelar por um tempo cronometrado e mais tarde as rotativas de tirar quilómetros de perfis e, sabem que mais, até sinto saudades…

As opções do Soba T´Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 18:45
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Terça-feira, 11 de Dezembro de 2012
DO BRASIL AO NAMIBE . IX

{#emotions_dlg.xa}FÁBRICA DE LETRAS DO KIMBO

Por

 T´Chingange

Foi com base nos documentos enviados por Simão da Luz Soriano que Bernardino Figueiredo escolheu Mossâmedes para bivacar a futura colónia. Após vários pedidos de apoio e ainda em Pernambuco, foi em sede de Cortes do Reino com o aval do Ministério da Marinha, creditado 18 contos a uma comissão formada em Recife para fins de organizarem a expedição; Além das provisões para os meses de viagem e as primeiras necessidades de instalação haveria de se incluir utensílios agrícolas, ferramentas e alguns engenhos com maquinaria apropriada para produzir açúcar e aguardente. A barca Tentativa Feliz largou de Recife com cento e quarenta e três colonos e o brigue Douro, que foi destacado pela marinha para escoltar os desalojados; divididos entre as duas naves totalizavam 171 criaturas contabilizando cinco crianças de tenra idade que não constaram na lista.  

 Com uma salva de cortesia por tiros de canhão do brigue Douro, deram vivas à rainha D. Maria II, e à nova colónia de Mossâmedes, despedindo-se de terras do Brasil no vigésimo terceiro dia de Maio do ano de 1849. A bordo podia ver-se os acenos de panos brancos agitados do cais de Recife, distinguindo-se na lonjura da terra o monte verde de Olinda até ficar uma mancha indefinida na bruma do horizonte. A 4 de Agosto de 1849 uma outra bruma surgia no horizonte que gravada em emoções surgia mais árida do que se imaginava, um areal imenso até aonde a vista alcançava; os ansiosos olhos perscrutavam indícios de verdura entre o amarelado da nua terra.

 Aquela baia de Angra dos Negros, um lugar de N´tumboera mesmo um areal imenso, quebrado apenas por uns juncais perto da praia com réstias de vegetação represada nas margens dum rio seco; era o areal imenso do deserto do Namibe, início do agressivo e grande Calahári bordejado aqui pela baia do soba mucubal Mussungu. Isto é uma África perdida, falavam entre si os novos colonos, desconhecendo que entre aqueles poucos indígenas dispersos no além das dunas não era crime roubar. Entre os Mucubais é uma honra roubar gado e quanto mais roubar maior consideração se tem entre a sua tribo. Mucubal que não roube, corre o risco de ficar solteiro; ou se é foito na arte de extorquir ou não se terá admiração de seu povo, suas futuras esposas. Foi um agitado progresso até aos dias de hoje, e é pena que os novos donos não reconheçam valor aos seus construtores. A chegada desta colónia ao lugar de Mossâmedes, hoje Namibe, revestiu-se de importância crucial para o desenvolvimento rápido da agricultura, especialmente das culturas da cana do açúcar e do algodão.

Referência Bibliográfica: Uma fazenda em África de João Pedro Marques

(Continua…)

Kandandus

O Soba T´Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 01:23
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Sábado, 8 de Dezembro de 2012
DO BRASIL AO NAMIBE . VIII

{#emotions_dlg.xa}FÁBRICA DE LETRAS DO KIMBO

Por

: T´Chingange

Foi entre-os-rios Giraúl e Bero que chegaram os primeiros habitantes de Mossâmedes. Após ser dada independência ao Brasil a 7 de Setembro de 1822, pelo príncipe regente do Brasil D. Pedro, uns quantos Portugueses de Pernambuco, descontentes, atravessaram o Atlântico e, seguindo a latitude de 10 º, deram início à colonização do sul de Angola, mais propriamente o deserto do Namibe. Angola nesse tempo, estava entregue a uns quantos funantes; verdadeiramente não havia uma política de verdadeira colonização e para ali eram mandados os deportados a cumprir penas por crimes cometidos na metrópole, o Puto distante. A partir do rio Giraúl era só deserto, não havia gente, uns quantos Kwanhamas, população pouco significativa e, a sul do Kunene não se via alma, daqui o chamar-se “Namíbia” que, em língua Ovambo, quer dizer terra do nada; a verdadeira razão daquela possessão Portuguesa não se estender até à Cidade do Cabo; limitaram-se a espalhar padrões, mas viram que a aridez da costa não permitia nesse então, a fixação de gente.

 Eram 171 almas desejando fazer vida pois que, do outro lado do Atlântico, Brasil, viam-se perseguidos por nacionalistas eufóricos com a sua emancipação. A 23 de Maio de 1849 aqueles 171 Luso-brasileiros embarcam na “Tentativa Feliz”e no bridge “Douro” da Marinha Portuguesa chefiados por Bernardino Freire de Figueiredo Castroe, decorridos dois meses de viagem aportam a 4 de Agosto de 1849 em Angra dos Negros, um lugar de N´tumbo (Welwitschia mirabilis).

 Aqueles primeiros habitantes idos de Pernambuco, chegados ao Namibe, começaram por viver quase como indígenas, em toscas cabanas de pau a pique e varas do mangue cobertas a capim; ali viviam homens, mulheres e crianças em promiscuidade, comendo quase exclusivamente peixe temperado a óleo de palma, sendo o pão de mandioca fornecido pelos escravos serviçais que tinham as suas lavras nas margens do Giraúl. A maior parte dos colonos idos com Bernardino eram carpinteiros, ferreiros, caixeiros e alguns comerciantes que tudo venderam ao desbarato na precipitação de abandonar o Brasil mas, Bernardino teve o especial cuidado de levar consigo alguns técnicos agrícolas especializados em plantações de cana-de-açúcar e construção de engenhos.

 Simão da Luz Soriano, foi o alto funcionário do Concelho Colonial que se interessou pelo requerimento de Bernardino Figueiredo dirigido ao Ministério da Marinha e Ultramar solicitando relatórios sobre Angola e auxílio material, a fornecer pelo Estado, que permitisse o transporte de pessoas e bens desde o Recife até local a escolher, em terras angolanas. Luz Soriano, elaborou um relatório detalhado intitulado "Memória sobre a Angra do Negro", indicando o local apropriado para a fixação daquela saga de gente. E, foi deste modo que se concretizou a fixação dos primeiros habitantes de Mossâmedes, a actual Namibe. É uma lástima que recorrendo às paginas de Internet da cidade do Namibe e Órgãos Oficiais de Angola não dêem qualquer pormenor desta saga humana, um despropósito aberrante que qualquer historiador isento reprovará mesmo que sendo um mwangolé prepotente. E, assim se criou com a descolonização nada exemplar, uma nova diáspora em Portugal: a dos filhos de Mossâmedes. Pelo observado, em quase quarenta anos de Angola independente, jamais os nomes de Bernardino e essa remota gente serão relembrados na cidade que fundaram. A população que o invocava e o respeitava, já lá não se encontra a viver.

(Continua…)

Kandandus

O Soba T´Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 00:31
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Terça-feira, 19 de Julho de 2011
DO BRASIL AO NAMIBE . VII

{#emotions_dlg.xa}FÁBRICA DE LETRAS DO KIMBO

"Colonização do Namibe e Planalto central de Angola"

 Deserto 

Os árabes já praticavam comércio negreiro, transportando escravos para a Arábia e para os mercados do Mediterrâneo Oriental, a fim de satisfazer as exigências dos sultões, mustafás e xeiques. As guerras tribais africanas, favoreciam esse tipo de comércio, visto que a tribo derrotada era vendida aos mercadores. A transfega de gente escrava do continente Negro para as Américas estima-se de entre 9 a 10 milhões, sendo a metade destes da África Ocidental. O pico do tráfico de "peças humanas" ocorreu entre 1750 a 1820, quando os negreiros carregavam em média uns 60 mil por ano; os porões bafientos iam abarrotados numa mole de coisa imunda. O vazio demográfico no continente Negro, tornou-se evidente após tamanha operação de negócio nesse então normal, que acometeu a África até meados do século XIX.

 Tentativa Feliz

As caravelas dirigiam-se ao Norte e Nordeste do Brasil, à Bahia e ao Rio de Janeiro, para as colônias americanas e antilhanas. As naus aportavam na Jamaica, Baamas, Haiti, Saint-Eustatius, Saba, Saint-Martin, Barbuda e Antigua, Guadalupe, Granada, Trinidad & Tobago, Bonaire, Curaçao e Aruba. destes lugares das Antilhas partiam outras levas em direção às Carolinas e à Virgínia nos Estados Unidos a serem usados nas plantações de tabaco e algodão da Virgínia.

 N´tumbo . planta do Namibe

Relembro o que já foi escrito em Kalukembe I acerca dos filhos do Puto: «Foi entre os rios Giraúl e Bero que chegaram os primeiros habitantes colonos de Mossâmedes. Eram 171 almas desejando fazer vida pois que, do outro lado do Atlântico, Brasil, viam-se perseguidos por nacionalistas eufóricos com a sua emancipação. A 23 de Maio de 1849 aqueles 171 Luso-brasileiros embarcam na “Tentativa Feliz” e no bridge “Douro” da Marinha Portuguesa chefiados porBernardino Freire de Figueiredo Castro e, decorridos dois mêses de viagem aportam a 4 de Agosto de 1849 em Angra dos Negros, um lugar de N´tumbo. Após o grito do Ipiranga brasileiro, Portugal levou mais de cem anos a recompor-se e disciplinar o encontro consigo mesmo. Angola nesse mesmo tempo, era uma colónia penal de degredados que zelavam do território com rédea solta. Na crónica N´Guzo VII do Kimbo Lagoa pode ler-se:Muitos expedicionários idos da Metrópole sucumbiram vítimas de doenças e combates para garantir o que agora é a fronteira Sul de Angola, país independente e pouco amistoso com a história e os portugueses resvalando sempre para uma prepotente arrogância e até desvirtuação da verdade.

Referência de consulta: Blog Mossâmedes do antigamente e Torre da História Ibérica

(Continua...)

O Soba T´Chingange

 



PUBLICADO POR kimbolagoa às 22:43
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Sexta-feira, 15 de Julho de 2011
DO BRASIL AO NAMIBE . VI

{#emotions_dlg.xa}FÁBRICA DE LETRAS DO KIMBO

"Colonização do Namibe e Planalto central de Angola"

Piratas

Convem recordar que do fim do século XV a metade do XIX, o contacto dos navegantes europeus com o Continente Negro, serviu apenas como uma grande reserva de mão-de-obra escrava, a ser extraída e exportada pelos comerciantes para o resto do mundo, mais própriamente para as Américas do Norte e Sul sendo no Norte usados como mão-de-obra nas culturas de algodão (E.U.A.) e do Sul e mar do Caribe para trabalharem no plantio e manuseamento de cana de açucar. Traficantes de quase todas as nacionalidades montaram feitorias nas costas da África fazendo incursões no interior do território a recolher "peças" humanas a serem negociadas como gado. Havia também piratas que atacavam de surpresa o litoral apresionando o maior número de gente. Este procedimento de ataque rápido era mais frequente nas ilhas de cabo Verde e Açores aonde podiam ter um dominio total do espaço com cães amestrados na busca de gente como se fossem coelhos.

 Serra da Chela

Os cães de fila brasileiros por exemplo, que têem no genes por constante ensinamento a busca de pessoas, foram usados na procura de "fujões" escravos que ousavam fugir dos engenhos de açucar. Mercadores negreiros europeus, com o crescer da procura por mão-de-obra escrava, associaram-se militarmente e financeiramente com sobas e régulos africanos dando-lhes em troca o poder das armas, pólvora e cavalos por forma a estes se afirmarem como autoridade. Os prisioneiros das guerras tribais eram encarcerados em “cubatas” na costa Atlântica, aonde esperariam a chegada dos navios negreiros que os levariam como carga humana pelas rotas transatlânticas.

 Fundador de Mossâmedes (Namibe)

Bernardino Freire de  Castro

A partir da metade do século XIX as costas africanas passaram a não ter interesse ao comércio de negreioros por via do término da escravatura pelo que, passou a ser vista como saída para encaminhar gente desavinda de outras paragens juntando-se-lhes os degradados para ali enviados por castigo penal; na maior parte dos casos eram rúfias da sociedade que a todo o custo tinham de ser afastados da metrópole. Alguns dos novos colonos, idos do Brasil e Ilha da Madeira para Mossâmedes buscaram lugares mais frios e de terras férteis subindo o plananto após galgar as Serras da Leba e Chela; gradualmente, e enquanto decorriam batalhas a conter sublevação de alguns sobas mais a Sul, a colónia ia-se formando ao redor de barracões num lugar que se veio a chamar de Sá da Bandeira, o actual Lubango. Falar destas odisseias é recordar a missionação dum povo, duma gente que não deixou de peregrinar a vida. Nestes folhetins de ordem temporal, aleatória, recorde-se essa estirpe de gente miscigenada a quem chamaram de Chicoronhos (Xi-colonos), oriundos das ilhas da Madeira e Açores, após estarem alguns anos na Olinda brasileiro.

Referência de consulta: Blog Mossâmedes do antigamente

(Continua...)

O Soba T´Chingange

 



PUBLICADO POR kimbolagoa às 06:33
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Domingo, 10 de Julho de 2011
DO BRASIL AO NAMIBE . V

{#emotions_dlg.xa}FÁBRICA DE LETRAS DO KIMBO

"Colonização do Namibe e Planalto central de Angola"

 

 

 

 

 

 

 

Welwiitschia . Namibe

Eis que voltamos a terras de África, lugar início do grande deserto conhecido então por Damaralândia a recordar os primeiros povoadores daquela costa entre a foz do rio Giraul e o rio Bero, gente descontente que a partir do Brasil para ali rumou na esperança de formar um nova colónia; ali viviam homens, mulheres e crianças em promiscuidade, comendo quase exclusivamente peixe temperado a óleo de palma, sendo o pão de mandioca fornecido pelos escravos serviçais que tinham as suas lavras nas margens do Giraúl. Decorria então, o ano de 1849. Convem aqui recordar o que já foi escrito em Kalukembe III: "Os primeiros colonos Luso-brasileiros de Pernambuco chegados a Angra dos Negros na foz do rio Bero a 4 de Agosto de 1849, fundam Mossâmedes relacionado-se desde logo com o gentio daquela região chamados de Kuvale e estendem as suas relações aos Kuanhocas, Cuepes e os Cuíssi com quem intercâmbiam vivências. Os madeirenses chegam ali passados 36 anos, já no meio de muita agitação por parte dos países fortes da Europa liderados por Bismark, que nesse então já ali punham seus olhos cobiçosos, sua prepotência e apetência. Seguindo o eixo colonizador Namibe, Lubango e S. Pedro de Chibia estes madeirenses em breve iriam seguir viagem a juntar-se à colónia de Boéres já bivacados em Oluvango. Convém aqui recordar que o rio mais a Sul chamado de Cunene, inicialmente foi tomado como sendo o grande Zambeze. O Cunene junto à foz, perdia-se nas areias do Namibe (Costa dos esqueletos) formando lagoas aonde o boi cavalo, (hipopótamo), procriavam sem grande altercação"

José Bonifácio . Patriarca da Independência do Brasil  

No Brasil, após a proclamação da independência a Sete de Setembro de 1822, as tropas fieis à Coroa Lusa, que tinham a maior parte de sua oficialidade formada por portugueses ou destes descendentes, opuseram-se ao Imperador D. Pedro I e seu Governo Constitucional; para que os velhos laços se rompessem houve séries batalhas em várias regiões. A esta turbulência de emancipação foi-lhe dado o nome de Guerra da Independência e prolongou-se pelo resto de 1822, indo até 1823. Só a 2 de Julho de 1823 é que a Bahia se tornou independente; o Ministro José Bonifácio de Andrade e Silva contratou a armada comandada pelo Almirante Inglês Lord Cochrane para fazer o bloqueio à marinha portuguesa que pretendia socorrer a Bahia isolada e em polvorosa; quase sempre, não há parto sem dôr, nem emancipação sem sublevação. Uma boa parte dos portugueses saídos do Brasil, da Bahia, do Recife e uns poucos de Sacramento na Cisplatina, refugiaram-se a Sul da colónia Angolana tendo feito assentamento no início do deserto do Namibe junto aos rios Bero e Giraúl como atrás,  já foi dito.

(Continua...)

O Soba T´Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 08:05
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Sexta-feira, 1 de Julho de 2011
DO BRASIL AO NAMIBE . III

{#emotions_dlg.xa}FÁBRICA DE LETRAS DO KIMBO

  " D.PEDRO I , BRASIL - 153 nos depois "

 

 

 

  Saida de Angola

Leonel Cardoso com a bandeira Tuga e uns saquinhos de muamba 

Cento e cinquenta e três anos depois, assisto ao desenrolar daquele mesmo lema de Independência ou Morte do Brasil, substituido por "Victória ou Morte" a 11 de Novembro de 1975 na então Provincia de Angola. O som de rajadas, era um prenúncio de guerra, perseguições e debandada do último Alto Comissário para Angola Leonel Cardoso com a bandeira do Puto amarrotada nas mãos de um oficial subalterno. Cento e cinquenta e três anos atrás, a 12 de Outubro de 1822, Dom Pedro é aclamado Imperador e Defensor Perpétuo do Brasil. Após uma constituinte ofuscada pelo texto avançado e imposto por D. Pedro, decide-se fazer uma nova constituição que incluía para a época direitos pouco comuns como a liberdade de crença religiosa não cristã, mantendo-se D. pedro como o poder moderador entre os demais poderes e, usando mão de ferro com a força de poder dissolver o Congresso quando assim o quizesse. A Confederação do Equador de Pernambuco não aceitou tal "nova constituição" revoltando-se,resultando daqui uma repressão implacável, nunca antes vista, levando à execução de vários chefes rebeldes entre os quais Fei Caneco. A Cisplatina, no Sul (actual Uruguai) anexada ao Brasil por D. João VI rebelou-se com a ajuda da Argentina entrando numa guerra que só acabou em 1828; neste ano assinou-se a paz com o reconhecimento do Uruguai como um país independente.

Com a morte de D. João VI em território europeu, o Imperador seu filho D. Pedro I, viu-se envolvido na sucessão do trono português. No Brasil, e após a independência, já no ano de 1828, as hostilidades entre os portugueses lusos e brasileiros por nascimento, foram subindo num crescendo de desconforto levando a irracional raiva na sociedade a niveis incomportáveis de intolerância; o que hoje designamos de preconceito assoberbado. Isto levou a que o Imperador D. Pedro I, o defensor perene do Brasil e pai da pátria se visse na condição de abdicar a favor de seu filho, um pivete de cinco anos de idade, pelo facto de ser brasileiro por nascimento. Para que se acalmassem os ãnimos, D. Pedro I exila-se em França juntando-se às festanças da corte de Napoleão seu cunhado; a história tem destas coisas, mudanças bruscas a que os humildes servidores ficam sugeitos e subjugados. Entretanto os brasileiros não mazombos retaliados à mordacidade picara e agressiva dos nativos mestiços com perseguição e menosprezo, organizam-se para debandar a outras latitudes ainda em poder do dominio de Portugal. Angola era o seu destino.

 A 1ª bandeira de Mossâmedes, hoje Namibe

Após o grito do Ipiranga, Portugal levou mais de cem anos a encontrar-se consigo mesmo. Angola nesse mesmo tempo, estava entregue a uns quantos funantes e negreiros que vendiam gente para as roças do Brasil e os muitos engenhos de açúcar ao longo de todo o Nordeste. Foi entre os rios Giraúl e Bero que chegaram os primeiros habitantes de Moçamedes idos do Recife em Pernambuco. Na ânsia de alcançar as riquezas do Oriente, a coroa, sómente espalhou uns quantos padrões sem fazerem assentamentos de gente com os usuais entrepostos; desprezaram a então Damaralândia, afastando-se da costa dos esqueletos, pois apanhar escravos, era o alvo maior dos novos territorios. Aquele deserto despovoado não despertava então grande interesse. Aqueles primeiros habitantes chegados ao Namibe, começaram por viver quase como indígenas, em toscas cabanas de pau a pique e varas do mangue cobertas a capim.

(Continua...)

O Soba T´Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 06:49
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Terça-feira, 18 de Janeiro de 2011
DESERTO . I

FÁBRICA DE LETRAS DO KIMBO

“MEMÓRIAS PETREFICADAS”

Naukluft . Soussuvlei

Na memória dos dias felizes vem-me à lembrança os dias passados nos desertos da terra do nada a que chamam de Namibia. Com medo de estragar as recordações dum mar de areia fina, movo finas camadas de nostalgia adormecidas na memória, de forma aleatória. Lembro-me de muita coisa dum cada olhar de duna ondeando a própria sombra como rugas conformadas com o tempo que não pára. Oiço também, às vezes, numa estranha pérgola, as estrelas e, a areia escorregando na ampulheta das nossas vidas; passeando a paisagem dos silêncios no “Naukluft”, sigo e até persigo as ilusões. Fora dali, nem tudo é justo e nem tudo é falso mas o que em mim perdura além das rugas, é o deserto. Numa sociedade em que já ninguém tem tempo a perder no deserto, foi e, é ali que eu me preencho longe dos atropelos, mensagens, redes Net e Faceboock onde se oferecem amigos a granel; paletes, como dizem esses amigos que nunca vi.


NAUKLUFT PARK

Ali o silêncio fala sem cessar, sem exageros expostos na forma das fotos deles, dos filhos, sobrinhos, do cachorro e do tareco. Quero lá saber das férias deles na Serra Nevada ou Cuba, das suas biografias, dos amores antigas e actuais. “Esses jovens softs” que julgam ter o mundo a seus pés, que não suportam uma hora de solidão, arranjam drogas para correr rápido no mundo. Nenhum quer atravessar o deserto e descortinar as manhãs límpidas do seu próprio ser; adoram ser bombardeados de mensagens, e-mails e coisas supérfluas do mundo cósmico.

Já o Sol ia alto quando do jipe retirei a minha espada de tuaregue, qual aço de Toledo enferrujada, e acenei ao Marco meu filho, que subia a duna da milha 45 do Naukluft no Soussuvlei, rumo ao topo; Demorou umas três horas no subir e descer e é curioso: já se passaram uns onze anos, e nunca cheguei a perguntar-lhe se, se encontrou.  Tenho vontade de voltar e ver aquele ondulado de areia silencioso num balão.

(...Continua...)

O Soba T´Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 00:08
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Quarta-feira, 6 de Outubro de 2010
KALUKEMBE . I

FÁBRICA DE LETRAS DO KIMBO

“Angra dos Negros – Moçâmedes”

ANGRA DOS NEGROS . NAMIBE

Nas chicotadas de um destino injusto, amilogado com a vida em terras madrastas destemperei o tempo emboscando palavras fervidas em minha mente. Agora que sou um mais velho kota, vou recordar coisas da minha terra de Angola só de sonho porque quiseram os fazedores da estória que eu passasse a ser um mazombo do mundo como um matumbola das dixitas do puto, salvo seja. Vou tentar deixar meu coração falar sem retenção nas válvulas porque, a vida não é medida pela quantidade de vezes que respiramos, mas pelos momentos que nos tiram a respiração.

E, porque uma mente inactiva é como uma oficina do diabo, vou pular a cerca do agora e regressar à minha África cheia de cazumbis, kiandas com magia de cheiros e sabores temperados em cacimbos antigos.

Uma pessoa não ama necessariamente a terra aonde nasce mas, aonde a sua alma se encontra com ela própria, da qual recordamos percalços de soberania. Em 1968 fui a Moçâmedes passar as festas do mar, andei no picadeiro, algo parecido com o calçadão brasileiro e comprei ao Turra, fiscal da reserva do Iona, uma pele de onça e três de Zebra; posso agora, dizê-lo porque já passou demasiado tempo para o segredo continuar guardado, seja como for, tudo se descolonizou. Moçâmedes,confinada entre o mar e o deserto, era uma  porta de entrada para o sertão angolano.

PEÇAS DE PANO . LIBONGOS

Foi entre os rios Giraúl e Bero que chegaram os primeiros habitantes colonos de Moçâmedes. Após ser dada independência ao Brasil a 7 de Setembro de 1822 pelo príncipe regente do Brasil D. Pedro, uns quantos Portuguêses de Pernambuco, descontentes, atravessaram o Atlântico em naus e,  seguindo a latitude de 10 º, deram início à colonização do sul de Angola, mais própriamente o deserto do Namibe. Eram 171 almas desejando encontrar sossego e fazer vida pois que, do outro lado do Atlântico viam-se perseguidos por arruaceiros nacionalistas eufóricos com a sua emancipação à semelhanço do que veio a suceder em Angola no pós 11 de Novembro de 1975.

A 23 de Maio de 1849  aqueles 171 Luso-brasileiros embarcam na “Tentativa Feliz” e no bridge “Douro” da Marinha Portuguesa chefiados por Bernardino Freire de Figueiredo Castro e, decorridos dois mêses de viagem aportam a 4 de Agosto de 1849 naquela Angra dos Negros, um lugar de n´tumbo.

Após o grito do Ipiranga, Portugal levou mais de cem anos a recompor-se e disciplinar o encontro consigo mesmo. Angola nesse mesmo tempo, estava entregue a uns quantos funantes e negreiros que, praticamente, só vendiam gente para os grandes engenhos de açúcar ao longo de todo o Nordeste Brasileiro. Por assim dizer era uma colónia penal de degredados que zelavam do território com rédea solta.

N´TUMBO . WELWITSCHIA

A partir do rio Giraúl era só deserto, não havia gente, uns quantos Cuanhamas e Cuvales que não eram significativos e, a sul do Cunene não se via alma, daqui o chamar-se “Namíbia” que, em língua Ovambo, quer dizer terra do nada; esta é a verdadeira razão da possessão Portuguesa não se estender até à Cidade do Cabo.

O navegadore Diogo Cão, em fins do século XV e a partir da foz do rio Congo espalhou padrões, mas no decorrer das viagens com Bartolomeu Dias e Vasco da Gama, concluiram  que a aridez da costa não permitia então, a fixação de gente.

A coroa, cometeu o grande erro de, na ânsia de alcançar as riquezas do Oriente, sómente espalharem uns quantos padrões sem fazerem assentamentos de gente ou os usuais entrepostos; desprezaram a então Damaralândia, afastando-se da costa dos esqueletos com medo de ali ficarem aprisionados nos baixios de areia e, mesmo a sul de Orange River até ao Cabo, não obstante o terreno ser fértil não lhe deram o devido interesse. Os homens escravos, comprados com conchas ou libongos eram o alvo dos novos achados.

Aqueles primeiros habitantes idos de Pernambuco, chegados a Angra dos Negros, começaram por viver quase como indígenas, em toscas cabanas de pau a pique e varas do mangue cobertas a capim junto à foz do rio Bero; ali viviam homens, mulheres e crianças em promiscuidade, comendo quase exclusivamente peixe temperado a óleo de palma, sendo o pão de mandioca fornecido pelos escravos serviçais que tinham as suas lavras nas margens do Giraúl. Decorria  então, o ano de 1849.


Glossário: amilongado: - amigado, emancebado, amantizado; mazombo: - filho de colonos, branco de 2ª linha;  matumbola: - um vivo morto, drogado, passado dos carretos; cacimbos: - orvalhos; kianda:-feiticeiras, fantasmas, assombrações; dixitas: - lixeiras, sugeira das barrocas, entre trastes; n´tumbo : - planta do deserto, tombua, welwitschia; Ovambo: - povo das marges do Cunene,  da Ovobolândia; libongos: - panos usados como pagamento de serviços, substituto de dinheiro.


(…Continua)

O Soba T`Chingange



PUBLICADO POR kimbolagoa às 14:36
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