FÁBRICA DE LETRAS DO KIMBO
“Gente de bitacaia”
Em meus pensamentos acocorados na memória vesti a minha dignidade de sofer porradas nos tempos de candengue; amarguras entrelaçadas com saudade dos meus mais velhos que terminaram sua batalha de vida, essa quietude de sono feito morte; já lá vai algum tempo.
Tenho aí uma foto sarapintada a preto e branco, amarelecida do tempo e das caganitas de moscas mostrando um homem vestido de terno com colete, camisa branca, olhos vivaços com nariz e perfil de beirão e um impressionante bigode retorcido em curva ascendente.
O tempo legou-me a foto de meu avô que só conheci de falas, de quando embarcou para o Brasil para fazer fortuna mas que na volta só trouxe tuberculose; como diziam então minha avó Topeta e restante família “veio tísico” e teso como um carapau (referiam-se a dinheiro).
Nas chicotadas de um destino injusto, meu avô gozou enquanto pode; por lá se amilongou com uma mulata da qual teve duas filhas e, se forem vivas terão para aí uns 75 a 80 anos. Até aqui calei, não deixei falar meu coração emboscando palavras fervidas em minha garganta.
Candengues do Cassequele
Meu pai, trabalhador de pedra lascada, aparada e polida agarrou-se a antigas linhagens de fio de prumo e, seguindo as pisadas de tantos outros entrou num vapor de nome Mouzinho e embarcou para Angola. No Lucala quando da construção da ponte para o caminho de ferro de Luanda um dia internou-se no mato e teve a dada altura de subir para uma acácia perseguido por uma pacassa ferida a que e, se bem me lembro, ele deu o nome de solitário. Tinha consigo uma catana que de nada valia para se defender daquele búfalo e por lá permaneceu umas horas. Muitos anos depois voltou de lá com uma bala no joelho, carregado de porradas pintadas em nódoas negras. Os mwangolés do Nito Alves armados até ao tutano, gente de bitacaia, ensaiaram com ele uma guerra de cassequele e, botaram-no atráz do aeroporto de Belas que nesse tempo se chamava de Craveiro Lopes. O senhor Manel, meu pai, acabou por ficar nas Beiras e lá morreu naturalmente entre os pinheiros e capinzais de silvas no lugar de Barbeita.
FLOR DE MARACUJÁ . HORTA DO SOBA
Nestes tempos do Puto recordo conversas entre ele e com um amigo fubeiro, seboso de ranços e suor de caligrafia analfabeta, óleo de palma da venda do mato, sardinha e peixe podre, tudo escrito numa caderneta de linhas quadradas; falava à preto no livro da vida dele.
Levavam horas basculhando dixitas da “sua” Angola, “sua” Luanda com gente ajudando gatos e cães na sobrevivência urbana. Falar p´ra quê e, não dianta procurarmos mwangolés, generalistas, capitãnistas; não dianta procurar o que o destino já escolheu para lhes dar. Esses oficiais mais que tenentistas, muitos mesmo, nunca que foram na frente de combate, muitos numerosos confirmam não confirmar.
Muitos mwangolés agarraram-se às suas antigas e gloriosas famílias dos reinos colonos, mafulos e mazombos feitos fidalgos; gente de escassa memória p´ra tanta dignidade e previlégio. Muitos que vão exigir de ser chamados de excelência e excelêntissimos com camaradas na segurança de suas riquezas, carros esfumados, importados e descapotados.
As lições da vida têm de ser sempre passadas a limpo, só nossa morte é quem pode ficar em rascunho.
Glossário: N´guzo: - força, destreza (quimbundo); candengue: - rapaz, jovem; amilongou: - amigou, emancebou (união de facto); pacassa: - búfalo,; mwangolé: senhor de angola, que se diz angolano, ter pinta ou banga de cazucuta, desenrrascado com vidas paralelas; cassequele: – um bairro de revolução, bairro da Zita comuna; dixitas: - lixeiras, sugeira das barrocas; bitacaia: - bicho de pé, matacanha.
(continua…)
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