"Me ajuda, Messias." Báu chama o colega para puxar as redes do Rainha das Águas, uma balsa de quatro metros com motor a gasóleo. Há três ou quatro dias que o mar não dá nada, nem para o consumo de casa os homens pescam. Báu, nome de baptismo António Jorge de Sousa, avisa logo: "Vem leve." E quando içam a rede confirma-se o pior: uma cavala e dois badejos pequenos, prontamente devolvidos ao Atlântico. Os homens abanam a cabeça e permanecem calados, olhos postos no monstro. O monstro está ali, do outro lado do canal. São duas chaminés encostadas ao mar do Nordeste, mesmo em frente à Ilha de Maré, uma reserva marinha a Norte de Salvador, na Baía. Desde que a refinaria do Acarajú começou a operar em plena força, há meia dúzia de anos, nove mil ilhéus passaram a afogar-se todos os dias em terra. A poluição e o tráfego marítimo assustaram os peixes, um derrame de petróleo em Abril do ano passado fê-los fugir para outras águas. "A vida aqui já não era fácil. Agora piorou", atesta Messias do Nascimento. A ilusão A Maré é uma das comunidades mais pobres do Nordeste, que por sua vez é a região mais pobre do Brasil. No entanto, quando se larga de barco de São Tomé de Paripe, no continente, e se ensaia a aproximação à ilha, não se adivinha nada menos que o paraíso. Palmeiras por toda a parte, um areal cândido, a água transparente. A ilusão quebra-se pouco depois: aqui também há um inferno. Saneamento não tem, polícia não há e médico só vem às quartas-feiras. Quando vem. O isolamento da Maré é tremendo, pela geografia e pela falta de infra-estruturas. Para pescadores como Báu, que nasceram e cresceram aqui, a questão não precisava de ser um drama, desde que o mar fosse dando qualquer coisa. " Emprego na ilha não há? "Nada." Messias, então, está farto. Passou quatro anos a trabalhar nas obras em Salvador para investir num barco. "Eu não bebia, não procurava mulher, comia barato e só saía no Carnaval. Juntei tudinho o que eu pude porque queria viver na minha ilha, viver do mar." As dívidas acumularam-se, não tarda nada vai ter de vender a Rainha das Águas. "O meu sonho virou desgraça. Antes eu era pobre, agora sou miserável." O que diz Joana Lima, que é assistente social e se instalou há seis meses na ilha? "Olha, me mandaram trabalhar com as famílias que estão em situação de vulnerabilidade. O problema é que todo mundo na Ilha de Maré está em situação de vulnerabilidade. Há oito mil habitantes auferindo do programa, numa população de nove mil. Como é que a gente faz?" O suspiro de José Esteves é profundo, preocupado. Pescador decano, não se conforma com um mar seco. "Quase a totalidade da população da Ilha vivia do peixe e do marisco. Depois veio o desenvolvimento industrial. Agora vive tudo da Bolsa Família. Isso é que é progresso? O Brasil tem uma mão que dá e outra que tira." Nem todos concordam com ele. Para muita gente, o rendimento mínimo criado nos governos Lula é a única tábua de salvação contra o desespero. Olha a Ieda Rufino, que tem um marido sem trabalho e dois filhos para criar. "Deram 90 reais por mês para a gente, aí eu pude botar os meus filhos na banca. É isso mesmo, estou apostando: eles agora podem ir na escola e um dia vão salvar a gente. Antes não podiam, não tinha jeito de eu pagar a merenda deles todo o santo dia." Maré sem água A embarcação que liga a ilha ao mundo circula três vezes ao dia, sem horário estabelecido. Sai do porto quando enche e vem sempre carregada de produtos frescos. Os vizinhos organizam-se, fazem as encomendas entre si, depois vai alguém a terra e traz mercadoria para todos. De pobreza também fala o papel que Rita Guimarães traz na mão. É uma fanzine escrita à mão pelos populares da ilha, o Maré Paraíso. Tem cinco artigos e três falam da falta de água. O trabalho dela é ensinar as pessoas a racionar, porque a Maré não tem que chegue para todos. "A meio do dia acaba a água e não volta. Além disso, as fossas vão directas para o mar e os esgotos correm a céu aberto para a praia. É uma fonte de doenças. Quem trata as doenças?" O médico, que vem uma vez por semana. "Pelo menos um décimo das crianças da ilha nasceram em barcas, a caminho do hospital." Ao meio-dia está marcado um plenário na sede da Comunidade de Pescadores de Ilha de Maré. A reunião devia ter começado há mais de meia hora, a sala está à pinha e faz um calor de derreter os ossos. Ainda assim o povo espera, sem queixume. Há homens que não podem estar presentes, andam ao mar mas não na pesca. Desde o derrame, os pescadores revezam-se a fazer vigílias. Saem duas barcas da Maré e estacionam em frente à refinaria do Aracajú. "Camaradas, a luta continua." Marizélia Lopes, presidente da comunidade, abre a sessão. Arranca um aplauso no momento em que fala do último protesto dos pescadores contra a refinaria. Saíram mais de 500 pessoas, estacionaram as barcas e deixaram-se ficar. As autoridades marítimas ordenaram retorno à ilha, eles não quebraram. A vitória chegou pouco depois: um cargueiro fartou-se da espera e teve mesmo de voltar atrás. Foram 150 mil reais de prejuízo para a petrolífera. "Essa gente só entende a linguagem do dinheiro", e Marizélia levanta-se outra vez da cadeira, empolgada. "Nós podemos até ser pobres, mas estamos vivos. Não vamos afundar sem dar luta." Minutos mais tarde, rouca de tanto gritar, vira-se para este jornalista e diz-lhe baixinho: "A gente não tem escapatória, não sabe mais o que fazer. Vai lá e fala de nós, porque ninguém fala nunca. Conta para o mundo como o Brasil esqueceu a gente".
ESTA É A REALIDADE DE PELO MENOS 70% DA POPULAÇÃO BRASILEIRA, E, NÃO SÓ DA ILHA DA MARÉ.
OS RICOS ESTÃO CADA VEZ MAIS RICOS E OS POBRES CADA VEZ AUMENTAM MAIS, MAS TUDO CAMUFLADO COM O FALSO CRESCIMENTO ECONÓMICO DESTE PAÍS. CRESCE À CUSTA DA DESGRAÇA DOS POBRES.... DO PRÉ-SAL... DAS RIQUEZAS NATURAIS SE SOBRAM APENAS PARA NÃO MAIS QUE 1% DA POPULAÇÃO. É TRISTE VER TANTA MISÉRIA NUM POVO TÃO ABNEGADO.... MAS TÃO INCULTO QUE NÃO ENTENDE A REALIDADE À FRENTE DOS OLHOS.
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