DONGUENA – UM CONTO ANTIGO - No Cunene lá para os lados do Cuanhama--- 1ª de 3 partes
Por
Dy - Dionísio de Sousa (Reis Vissapa) - Autor de “Ninguém é Santo” escrito para todos os Angolanos que amaram e amam a terra que os viu nascer ou crescer…
Adorava quando ela passava a língua áspera pelas minhas orelhas ou pelas faces fazendo-me cócegas e molhando-me a pele, os olhos dilatados de alegria e a cauda abanando a um ritmo alucinante. As patas possantes assentavam no meu peito fazendo-me recuar dois ou três passos naqueles momentos em que manifestava a sua ternura com maior fogosidade. Apoiada nas patas traseiras ficava mais alta que eu uns bons dez centímetros e só voltava à posição original quando a minha avó lhe dava um grito para se aquietar. O pelo, ralo e fulvo da cor das chanas que bordejavam o Cunene lá para os lados do Cuanhama, região que deixara ainda cachorra para vir para a casa do avô. Os olhos de um amarelo brilhante pareciam dois focos quando algo fora de comum prendia a sua atenção, formando-se simultaneamente um remoinho eriçado no pelo do dorso.
Aquela raça conhecida como Leões da Rodésia estava bem patente na possante cadela e era visível a razão por que eram conotados com o rei da floresta. A Leoa da Rodésia do meu avô era um exemplar digno do seu nome. Foi baptizada com o nome de Donguena pois nascera numa xitaca que o velhote possuía nessas terras situadas entre o Humbe e o Caluéque, vindo parar ao Lubango juntamente com uma manada de gado gentio destinado ao abate, e transportada a pé desde o longínquo Cuanhama até ao planalto da Huíla durante três longos meses.
De manhã cedo após acompanhar o meu avô até à moagem do outro lado da rua imitando-lhe o andar e escoltando-o fielmente até à porta do escritório regressava ao pátio interior da casa onde vivíamos, aguardando a minha ordem para partirmos rua abaixo em direcção à serra que vigiava o ainda pequeno povoado do Lubango. Para lá do Mucufi começava o mato e raras eram as casas que por ali existiam. Calcorreava os carreiros abertos pelo contínuo e rotineiro caminhar das populações que vinham das faldas da serra trabalhar e que cruzavam connosco olhando temerosos a Donguena.
Não manifestava qualquer agressividade fora dos seus domínios, com excepção feita a qualquer rafeiro que se aproximasse demasiado, o que raramente acontecia. Quando o sol mais a pino me obrigava a regressar a casa e a hora do almoço assim o exigia, a Donguena depois de me deixar em segurança atravessava de novo a rua para acompanhar o meu avô de regresso, que fazia o seu intervalo para as sopas do meio-dia. Durante a noite a cadela patrulhava a casa e a moagem mantendo à distância com o seu aspecto feroz os amigos do alheio. Quando chegou a idade de ir para a primária, os passeios matinais pelos arredores acabaram e a Donguena começou a escoltar-me fielmente até ao portão da escola e à hora da saída lá estava ela aguardando o toque da sineta para me acompanhar alegremente até casa.
Um dia de manhã o meu avô deparou com um dos seus empregados com uma perna totalmente dilacerada contorcendo-se de dores à porta do escritório. Não teve dificuldade em se certificar que a Donguena tinha sido a autora da agressão. Dois meses mais tarde um novo incidente determinou o destino da cadela, o reenvio para a xitaca onde pela primeira vez vira a luz do dia. De nada valeram os meus soluços e súplicas, pois o avô quando tomava decisões nada nem ninguém o conseguia demover. Assim no princípio de Setembro de l950 a minha companheira amarrada na carroçaria de um camião lá partiu em direcção ao Cuanhama, perante o meu olhar nublado de lágrimas e um soluçar convulso.
(Continua…)
As opções de T´Chingange
MULOLA DA “AMIZADE” - Qualquer um, tem de ter a oportunidade de ter um rio só seu...
Mulola é um rio que só leva água quando chove
Por
Ando encafifado com uma máquina de fazer “alegria” para comemorar os amigos que fiz, tendo cada qual mais de 80 outros amigos comuns. Os artefactos que encontrei para elaborar esta, é um segredo de minha patente mas, posso adiantar que além de alegria, a máquina é capaz de produzir arco-íris pra deslumbrar suas vidas; ela, a máquina, tem a capacidade para produzir não apenas arco-íris normais mas também duplos e triplos, e até alguns invertidos ou enrolados nas pontas. Posso acrescentar que o último protótipo é parecido com uma foice!
Quando a amizade é mesmo encharcada de feitiço, até galgamos lonjuras para cheirar feno fresco, assim a ficar com os sentidos inebriados de dias com quatro estações. Até podemos sentir a primavera logo a seguir ao verão; falar por assobios ou mesmo estalidos e escrever por traços e pontos com zeros e uns, sem daí sair e, decerto seguindo um código de entendimento, nos relacionaremos perfeitamente; gesticulando ousadas gaifonas ou mesmo bufando desesperos transpirados.
Se a politica nos separa, não se fala mais nisso, passamos ao futebol ou falamos de Madre Tereza de Calcutá! Entre piadas e amuos revigoraremos os percursos no sentido ou ao contrário dos ponteiros do relógio sufragando os doces dum ano que finda e as passas dum ano bissexto que chega. É sempre emocionante ler as mokandas de amigos, mesmo que tenham nomes estranhos como LUSAKIDILU, falas genuínas dum kamba dum Rio Seco! Dum Rio que só o é na lembrança antiga, que se quer sem fungos nem cacos velhos. Rio que só leva água quando chove a montante.
Um amigo tem sempre missangas para enviar assim o queira, por apitos ou estalidos ou mesmo muxoxos com ou sem nevoeiro, cacimbo ou trovoada de chuva grossa! Gostaria agora, neste instante, de enviar apitos espaciais da Maianga para cada um dos meus amigos que por qualquer razão não têm a cor do meu, nem as mesmas notas, as setas invertidas, um punho fechado ou uma forma fálica a fingir de dedo, assim para cima ou ao centro, ou mesmo uma seitoura com uma planta ou orelha de burro. Isto pouco importa para venerar meu culto crente sem as coisas desatinadas de todos os dias.
O Soba T´Chingange
ANGOLA . NAS CICATRIZES DO TEMPO -VI
Não sei se em Angola se pode falar de racismo como tal, mas existe colorismo… “nunca vi nenhum branco ou mulato a varrer a rua e isso pode ser um motivo pelo qual o negro se sinta discriminado e sofra racismo”.
Por: ELIAS ISAAC - DIRECTOR DA ONG OSISA - Manter uma conversa sobre coisas relacionadas a Portugal ainda tem importância.” …
(…) Temos expressões como ‘bom ventre’ quando uma mulher dá à luz e as pessoas vão ver o bebé - o bom ventre é aquele que produz crianças que nascem com a pele mais clara. ‘Vida mulata’, por exemplo: entende-se como vida boa, das pessoas que nascem para viver bem - então usa-se essa expressão. Outra expressão é ‘adiantar a raça’- uma pessoa que se casa com uma pessoa com tez mais clara. São expressões que se usam que indicam privilégio de determinado grupo de pessoas em função da tonalidade. Em Luanda será preciso andar muito para encontrar duas pessoas a falar em umbundo ou quimbundo ou outra das seis línguas nacionais porque durante muito tempo se desincentivou esse hábito, nota.
A televisão nacional começou a transmitir uma parte das notícias em línguas nacionais e há músicos que cantam nelas, em umbundo e quimbundo. Mas continua-se, mesmo depois da independência, a ridicularizar aspectos importantes da cultura angolana como a forma de vestir, de comer ou a utilização de roupas com tecidos africanos, exemplifica. Faltam políticas para a promoção da “identidade angolana, africana, que não deixa de ser negra”, defende.
A grande questão é que é preciso fazer a ruptura com a mentalidade colonial “ainda muito presente” em situações como a forma de estar, por exemplo. “No outro dia perguntaram-me se eu tinha estudado em Portugal, e de que parte de Luanda era. ‘Sou do Huambo’, disse. ‘Ah… falas tão bem português!’ O falar bem português, com sotaque aportuguesado, saber usar os talheres, manter uma conversa sobre coisas relacionadas a Portugal ainda tem importância.”
Publicitário, copywriter e fotógrafo, Ngoi Salucombo defende que existe racismo em Angola, sim, e que ele se manifesta de diversas formas. Por um lado, é verdade que “nunca vi nenhum branco ou mulato a varrer a rua e isso pode ser um motivo pelo qual o negro se sinta discriminado e sofra racismo”. Há um discurso que entrou no colectivo nacional de que “os portugueses eram os maus”. “Saímos da colonização para o partido único e durante muito tempo esse discurso foi forte. Além de que já vemos a colónia portuguesa como negativa, em comparação com as colónias francesas e inglesas em África. A minha geração comenta muitas vezes: ‘Esses tugas...!’”
A Ngoi Salucombo, que viveu oito anos em Portugal, acontece muitas vezes ouvir “aquela expressão” de amigos portugueses: “‘Ah, mas tu és diferente’ dos angolanos. Isso para mim já é racismo,.. Não cai bem-estar a falar com um português das coisas negativas de Angola, e ele dizer: ‘Mas tu és diferente’, como quem diz, “tu és dos nossos, és como nós”. Por mais que a pessoa não queira magoar, vem do fundo. É uma forma de racismo porque essa pessoa está a dizer: ‘Tu és como eu, somos os melhores, o resto é uma cambada’.”
(Continua…)
As opções do Soba T´Chingange
TEMPO ALFA – Uma receita gourmet a 200 quilómetros por hora…
Malamba é a palavra
Por
No comboio Alfa a mais de duzentos quilómetros por hora, temperatura de vinte e dois graus com dezassete no exterior, o ecrã da televisão de bordo lá no alto, mostrava a feitura de vários pratos com jovens cozinheiros promissores e artistas da novela a única mulher. Com condimentos variados, saladas e molhos de salivar, condimentos com guloseimas que se pegam ao pensamento e, dos gourmets passam a comidas ligeiras, daquelas de se levar em lancheiras por albanis para as obras. Eu, que ando predisposto a comprar uns suspensórios por via do alargamento da cintura, vejo-me assediado a comer à fartazana e isto, não é o melhor para mim.
Neste permanente festival gastronómico exibido por tantas seguidas horas, dou-me conta que ainda não tenho o milongo certo para matar as cobras e lagartos da ansiedade. Fosse isto uma verruga e usaria nitrato de prata também usado para espantar os tais lagartos e cobras mas desta feita terei é de ser comedido, andar muito a pé. Mas nem tudo corre como a gente quer. Não é por acaso que os bancos nos emprestam guarda chuvas num dia de sol e os pedem de volta quando começa a chover.
Quase todos os dias experimento soltar as amarras, passeando-me na liberdade de minhas memórias a mostrar-me o verdadeiro sentido da vida e, até tento comer para viver e não o contrário disto; do mal, o menos, vou-me fazendo feliz bebendo emoções nos reencontros, esculturando com arte a minha miudinha vida, entrelaçando muxoxos com as realidades dos sonhos, colocando malambas no papel ginasticando o cérebro, que também necessita disso, ficar sempre livre para novas vibrações.
Justamente, num momento de instante passa-me pela cabeça fazer um prato gourmet para provar no verão próximo ou lá pelo Brasil sempre quente. Assim planeando o meu sucesso de quimbanda cozinheiro, vou reunir um bom molho de beldroegas, um molho previamente preparado de geleia de pitangas com um ligeiro traço de jindungo, umas costeletas de carneiro previamente postas em avinha de alhos, umas batatas, um limão e sal a gosto mais umas estrelas de carambola e azeite virgem de oliva.
Fritam-se as costeletas guardando o molho de lado bem quente, cosem-se as batatas e depois de esmurradas tal como os alhos, regando-se com azeite colocando-as no forno, Pronto! Junta-se tudo num prato, primeiro as batatas, depois as costeletas ao centro com parte do molho quente, enfeita-se o mesmo com um bom conjunto de beldroegas previamente lavadas, espreme-se um pouco de limão em cima destas. No final num tal toque de mestre, rega-se com um pouco de geleia de pitanga com desenhos de Dali, alindando-se o conjunto com duas ou três estrelas de carambola a dar comida aos olhos. É tudo! Bom apetite e digam-me qualquer coisa mais tarde, certo!
Do Soba T´Chingange
CAFÉ DA NOITE - Quem é capaz de definir a FAMILIA? . Família é afinidade…
As escolhas de Stella
Stella Pugliesi - Com seu trecho do livro "O Arroz de Palma" de Francisco Azevedo.
"Família é um prato difícil de preparar”.
São muitos ingredientes. Reunir todos é um problema... Os truques, os segredos, o imprevisível. Às vezes, dá até vontade de desistir, de não constituir família... Mas a vida sempre arruma um jeito de nos entusiasmar e abrir o apetite. O tempo põe a mesa, determina o número de cadeiras e os lugares. Súbito, feito milagre, a família está servida. Fulana sai a mais inteligente de todas. Beltrano veio no ponto é o mais brincalhão e comunicativo, unanimidade. Sicrano, quem diria? Endureceu, murchou antes do tempo. Este é o mais gordo, generoso, farto, abundante. Aquele, o que surpreendeu e foi morar longe.
Ela, a mais apaixonada. A outra, a mais consistente... Já estão aí? Todos? Óptimo. Agora, ponha o avental, pegue a tábua, a faca mais afiada e tome alguns cuidados. Logo, logo, você também estará cheirando a alho e cebola. Não se envergonhe de chorar. Família é um prato que emociona. E a gente chora mesmo. De alegria, de raiva ou de tristeza. Primeiro cuidado: temperos exóticos alteram o sabor do parentesco. Mas, se misturadas com delicadeza, estas especiarias, que vindas da África ou do Oriente nos parecem estranhas ao paladar tornando a família mais colorida, interessante e saborosa.
Atenção também com os pesos e as medidas. Uma pitada a mais disso ou daquilo e, pronto: é um verdadeiro desastre. Família é prato extremamente sensível. Tudo tem de ser muito bem pesado, muito bem medido. Outra coisa: é preciso ter boa mão, ser profissional. Principalmente na hora que se decide meter a colher. Saber meter a colher é verdadeira arte. As vezes o ídolo da família, o bonzinho, o bola cheia que sempre ajudou azedou a comida só porque meteu a colher. O pior é que ainda tem gente que acredita na receita da família perfeita. Bobagem. Tudo ilusão.
Família é afinidade, é à Moda da Casa. E cada casa gosta de preparar a família a seu jeito. Há famílias doces. Outras, meio amargas. Outras apimentadíssimas. Há também as que não têm gosto de nada, seria assim um tipo de Família Dieta Gourmet, que você suporta só para manter a linha. Seja como for, família é prato que deve ser servido sempre quente, quentíssimo. Uma família fria é insuportável, impossível de se engolir. Enfim, receita de família não se copia, inventa-se! A gente vai aprendendo aos poucos, improvisando e transmitindo o que sabe no dia-a-dia.
A gente cata um registro ali, de alguém que sabe e conta, e outro aqui, que ficou no pedaço de papel. Muita coisa se perde na lembrança. O que este veterano cozinheiro pode dizer é que, por mais sem graça, por pior que seja o paladar, família é prato que você tem que experimentar e comer. Se puder saborear, saboreie! Não ligue para etiquetas. Passe o pão naquele molhinho que ficou na porcelana, na louça, no alumínio ou no barro. Aproveite ao máximo. Família é prato que, quando se acaba, nunca mais se repete!
Família: Feliz de quem a tem!
As opções de T´Chingange
ANGOLA . NAS CICATRIZES DO TEMPO – V
Não sei se em Angola se pode falar de racismo como tal, mas existe colorismo…
Por: ELIAS ISAAC - DIRECTOR DA ONG OSISA - “O que Angola está a tentar fazer é a transformação social com uma minoria que vive nos condomínios…”
(…) O privilégio branco é visível em qualquer parte do mundo e aqui também. Expressa-se, por exemplo, na imagem da beleza - e no cabelo. Lúcia da Silveira usa o cabelo natural e uma vez, num encontro com um ministro, a secretária “teve a coragem” de lhe dizer: “‘Porque não arranja esse seu cabelo, você é mulata…?’ Eu respondi: ‘Vou fingir que não ouvi o que a senhora disse porque está a depreciar aquilo que é meu.’ Esse também é outro problema: ser discriminada por usar o cabelo natural.” A tendência para se seguirem os padrões ocidentais em Angola é bastante visível em todo o lado, diz Márcio Cabral, 30 anos, redactor da revista Caras Angola - nas festas, o mais comum é o uso das extensões e das aplicações, os alisamentos.
Nas paredes da redacção da revista, espalham-se fotos das capas da Caras com as figuras da elite angolana. Não há um padrão de quem ocupa a capa em termos de cor. A Caras fica num edifício perto da marginal, de onde se vêem os arranha-céus e as construções a crescer em Luanda. O jornalista acrescenta que, por outro lado, há “cada vez mais mulheres a assumir a sua essência africana” e isso é uma tendência que se tem vindo a desenhar de forma subtil. “Tem mudado bastante. A ascensão de Leila Lopes a Miss Universo 2011 que foi um grande acontecimento.”
Há uns anos que Sizaltina Cutaia, gestora de projectos sociais, aderiu ao grupo Angolanas naturais, criado no Facebook para valorizar o cabelo natural. Ainda hoje, mesmo em países africanos como Angola, “o belo é influenciado por uma visão eurocêntrica”, explica Sizaltina, que aparece com um turbante africano. O trânsito em Luanda é caótico e nem sempre é fácil encontrar as ruas, mesmo usando GPS
Tinham-nos avisado que era normal os angolanos chegarem atrasados aos encontros, mas não foi este o caso. Sizaltina Cutaia vem ter connosco à residencial pela qual pagamos cerca de 150 dólares por noite, um lugar onde em Portugal não pagaríamos mais de 15 euros. O custo de vida em Angola é muito alto, mesmo em lugares onde a electricidade e água faltam frequentemente. A dois passos da residencial havia um prédio sem luz há meses e meses.
Conta que quando deixou de alisar o cabelo ia a uma festa e as pessoas perguntavam: “‘Vais assim mesmo, o que se passa, entraste para alguma igreja?’ A pressão social sobre isso é muito grande e reflecte um problema que tem que ver com a questão da raça. Não sei se em Angola se pode falar de racismo como tal, mas existe colorismo que é o sistema onde se considera a tonalidade da pele para definir o tratamento que a sociedade dá a uma pessoa.
(Continua…)
As opções do Soba T´Chingange
NUM TEMPO COM CINSAS - Trocadilhos com chouriço…As verdades parecem estar sempre armadilhadas…
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Fui ao cinema com a minha neta ver o filme Star Wars. Muito se espantou de eu ser um admirador deste tipo de filmes e, de novo, pude ver as velhas figuras daqueles primeiros filmes vistos lá pela década de 1970 a 1980. Aquela Guerra das Estrelas de então era um épico; um filme que ganhou dez nomeações ao Óscar tendo ganhado seis. As indicações incluíram Alec Guinness como o melhor actor coadjuvante, melhor roteiro original e melhor Filme. O filme é classificado como um dos melhores filmes de ficção científica já feito, e um dos melhores da história cinematográfica.
Foi em verdade um marco, início da "Era dos Blockbusters”, êxitos de bilheteira levando o cinema hollywoodesco a usar cada vez mais os efeitos visuais e, fazendo grandes campanhas de marketing. Neste mundo de variantes tão carregado de ilusórias fraudes e, feitas sem que possamos ser intervenientes, leva-nos a ter como conforto a imagem de sonhos belos para além dos nossos contentamentos terrenos.
Nós até percebemos que as coisas não encaixam mas preferimos reservarmo-nos. Involuntariamente isto é uma fuga para a frente, a frustração da realidade na qual estamos envolvidos sem podermos geri-los. Mas voltando ao filme Star Wars - O Despertar da Força, o sétimo filme da série traz-nos 30 anos depois o Retorno de Jedi tendo no elenco principal John Boyega, Daisy Ridley, Adam Driver, Oscar Isaac, Andy Serkis, Domhnall Gleeson, e Max von Sydow, com Harrison Ford, Carrie Fisher, Mark Hamill, Anthony Daniels, Peter Mayhew e Kenny Baker reprisando seus papéis dos filmes anteriores.
Este filme surge após a venda da LucasFilm por George Lucas para a Walt Disney Pictures. Será também o primeiro da nova trilogia de Star Wars tendo George Lucas, como consultor criativo do filme. O filme fala sobre a luta da Resistência (antiga Aliança Rebelde) contra a Primeira Ordem (antigo Império Galáctico) e é protagonizado por Daisy Ridley, John Boyega e Oscar Isaac, que interpretam, respectivamente, Rey, Finn e Poe. Neste mundo de mentira, é bem melhor fantasiar-me de Jedi.
O Soba T´Chingange
NAS FRINCHAS DO TEMPO . Em vésperas de Natal - apalpando as medidas da história, saro na natureza as feridas do corpo …
Mokanda : É uma carta
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E, eis que decido hoje vésperas de Natal, recolher legados de tempos idos nesta cidade chamada de Coimbra, debruçada sobre um rio manso de nome Mondego. Com música de muitos sinos e coros fazendo eco nas esquinas, no bulício citadino, pregões de castanha assada e luzes dirigidas a presépios e árvores cheias de neve a fingir com bolas reluzentes mais fitas coloridas, subo o empedrado até à velha catedral. Em 1139, após a decisiva Batalha de Ourique, Afonso Henriques decide financiar a construção de uma nova catedral, devido à anterior estar muito deteriorada. As obras devem ter começado em tempos do bispo Bernardo no ano de 1146, mas o impulso definitivo foi dado em 1162 com o bispo D. Miguel Salomão, que ajudou a financiar a sua construção.
Atribui-se o projecto da Sé românica ao mestre Roberto, de possível origem francesa, que dirigia a construção da Sé de Lisboa na mesma época. A direcção das obras ficou a cargo de mestre Bernardo, também possivelmente francês, substituído por mestre Soeiro, um arquitecto que trabalhou depois em outras igrejas na diocese do Porto.
Vista do exterior, a Sé Velha lembra um pequeno castelo, com muros altos coroados de ameias e com poucas e estreitas janelas. A aparência de fortaleza é comum às catedrais da época e explica-se pelo clima bélico da Reconquista. A fachada principal tem uma espécie de torre central avançada com um portal de múltiplas arquivoltas e um janelão parecido ao portal.
Os capitéis, arquivoltas e jambas do portal e do janelão são abundantemente decorados com motivos românicos com influências árabes e pré-românicas. O claustro, construído durante o reinado de Afonso II situa-se na transição para o gótico, encontrando-se no lado sul do templo. Cada face do claustro possui cinco arcos quebrados, envolvendo cada qual um par de arcos geminados de volta perfeita, rasgando-se em cada bandeira uma pequena rosácea decorada com traceria muito simples.
Os tramos são quadrados, com as naves abobadadas, sendo só arcos torais ogivais muito apontados e os cruzeiros de volta inteiros. Os capitéis dos arcos são de cesto delgado, maioritariamente com decoração vegetalista. O feito mais interessante de toda a obra são os cantos da quadra: aí dá-se o encontro de duas arcadas góticas que mutuamente se interrompem a meia altura, criando um efeito original.
Um símbolo de tolerância entre povos pode ser lida na parte exterior; uma expressão em árabe que significa: “Um dia a minha mão perecerá mas fica a marca da minha amargura”, uma característica única desta Sé-Velha e que a distingue de outras catedrais medievais. Esta arte de minúcia, leva-nos a meditar na cultura que nos está entranhada e o belo surpreende-nos, mesmo sem sermos especialistas de coisa alguma …
Nota: Bibliografia da NET Sapo
O Soba T´Chingange
TEMPO NATALÍCIO – Uma conversa pequena medieval com uns pedaços de hoje e ontem …
Malamba é a palavra
Por
Indo para o Centro histórico de Coimbra, a conversa resvalou para o porquê de eu ainda não ter ido ver o túmulo de D. Afonso Henriques na Igreja de Santa Cruz. Pois será desta vez, disse eu. Aconteceu passar por ali tantas vezes e nunca me dei ao cuidado de visitar o primeiro Rei do M´Puto. Fiquei a saber que D. Manuel ao visitar as sepulturas originais de D. Afonso Henriques e de seu filho D. Sancho I. Este, não as achou dignas e mandou fazer novas. Estando estas concluídas, o monarca quis assistir à trasladação dos restos mortais. É a partir destas descrições que eu me interrogo na forma avantajada de se verem as coisas; esse ego de se enaltecerem heróis e heroicidades; senão vejamos.
Há um relato da época que diz o seguinte: No Anno seguinte d'esta eleição, 1520 em os 16 dias do mês de Julho, estando o sereníssimo Rey Dom Manuel nesta cidade de Coimbra, veio a este seu real mosteiro à tarde e mandou abrir as sepulturas antigas dos primeiros dois Reys deste Reyno seus predecessores: Achou o corpo do devoto Rey Dom Affonso Henriques inteiro, incorrupto, a carne seca, e a cor pálida, e macilenta, mas de aspecto severo que parecia estar vivo, do qual sentia cheiro suavíssimo (...) Era el-rei de gigantesca estatura, de des palmos (2,20m) em comprido e de quatro de largo pellos peitos, e a perna que quebrou nas portas de Badajos era mais curta que a outra três dedos.
A 23 de Outubro de 1832, o túmulo terá sido aberto na presença de D. Miguel que, passando por Coimbra, quis ver os restos venerados do primeiro rei. A Gazeta de Lisboa transcreveu o acontecido do seguinte modo: A sua caveira estava inteira, e mostrava ainda todos os dentes no seu logar menos um; as dimensões do craneo, e mais partes da cabeça eram grandes, e proporcionados os ossos dos braços e pernas, os quaes comparando-se com os da figura superior do tumulo se achou perfeitamente coincidirem com as dimensões respectivas, tendo 10 palmos (2,20m) de comprimento, como refere a História haver tido de altura o herói.
Enfim, é difícil de dizer se devemos acreditar nestas descrições. Não estou a acusar os seus autores de má-fé, mas é verdade que, antigamente, havia muita relutância em quebrar com tradições e mitos, pelo que não se hesitava em "modelar" a realidade, como nos diz o Prof. Mattoso: «Não me admira que, depois da morte, o considerassem um grande homem, no sentido moral, e que essa qualificação tivesse passado para uma ideia física. O fundador da nacionalidade tinha de ser um homem grande. Devia ser um homem de grande vitalidade, pelas crónicas. Dirigia os combates em pessoa».
Pode até dar-se o caso de o palmo do medidor não ter o dedo mindinho ou ter sido um anão mas, história é história. D Afonso Henriques tinha 2,20 metros de altura e até usava uma espada que pesava vinte quilos; diga-se em verdade que daqui não vem mal ao mundo! Pior seria saber-se haver por aí um outro banco a ficar mocho, assim com caruncho medieval a roer-nos os cascos…
Nota: Bibliografia com dados de Andanças Medievais
O Soba T´Chingange
ANGOLA A PRETO E BRANCO. Quasequase uma estória de Natal…
Por
Luís Magalhães - Tem uma antiga caneta Parker 21, espacial. Dessas que levam o homem a gatafunhar coisas lindas da Luua, numa Angola que jamais esqueceu e das suas sequelas …
QUANDO ESTIVE EM MASSAU
Quando chegavam as férias Escolares do Natal, a primeira coisa que fazia era ir ter com o meu Pai estivesse ele onde estivesse. Naquele ano ele estava em Massau, uma localidade perto da Fronteira. Lembro-me que saí de Carmona, fui até Sanza Pombo, Macocola, Santa Cruz, Macolo (penso que era assim) e finalmente cheguei a Massau. Era uma localidade em terra de nenhures, onde só havia a casa do Chefe de Posto e um mastro muito alto com a Bandeira Portuguesa bem visível a tremular ao sabor do vento.
Meu Pai contou que, quando chegou a Massau, tudo era capim e selva; ele sempre gostou de ver o que o circundava por uma questão de segurança, falou com os militares que depois de o ouvirem, limparam uma área de mil metros quadrados e fizeram um tanque para assim os miúdos irem dar uns mergulhos, pois ali tudo era bastante tórrido. Para finalizar este cenário o meu Pai resolveu plantar diversas árvores de fruto em volta da casa. Tudo para elI se sentir bem. Meu pai deliciava-se em ver os miúdos (em principio desconfiados) darem mergulhos no tanque; mais tarde apareceram os Homens e mais para o final do dia apareciam as mulheres para tomarem banho.
Não demorou muito, já levavam as bacias para lavar sua roupa, coisa que o meu Pai teve que impedir falando primeiro com os sobas; a água ficava cheia de sabão e com isso já ninguém se podia banhar. O assunto ficou resolvido mas, a partir daí meu Pai reparou que a água desaparecia a olhos vistos. Resolveu analisar o assunto onde se apercebeu que a água desaparecia porque os animais vinham ao nascer do dia ali beber. Também neste caso, meu Pai resolveu aproveitar um fio de água que havia á superfície da terra ali por perto e, com ele o tanque passou a ter sempre água corrente.
Esta casa de Massau tinha uma varanda onde o meu Pai se deliciava ao cair da noite, sentar-se a ver a paisagem. Ora certo dia, estando ele neste olhar, reparou que as árvores que ele tinha mandado plantar estavam ratadas até uma altura de dois metros?! As árvores estavam a ficar carecas de folhagem. Intrigado perguntou ao cipaio se as árvores não se davam bem ali ao que o cipaio respondeu que devia ser mandinga das árvores?! Meu Pai, assim ficou mas, nessa noite resolveu ficar de plantão às árvores. Esteve toda a noite de olhos abertos e eis que ao alvorecer do dia vê um menino acompanhado por uma Palanca a virem em direcção às árvores.
Assim quieto, vê a Palanca comer as folhas sempre acompanhado pelo menino. Perante isto, meu Pai levantou-se devagar para não assustar os visitantes mas a Palanca apercebendo-se e depois de olhar para o meu Pai, retirou-se com as maiores calmas do Mundo. Quanto ao menino, ele olhou muito sério para o meu Pai e com a mãozita disse adeus desaparecendo no capim. Ao outro dia, falando disto ao cipaio ele falou assim: -Sô Chefe, aqui não há Palancas nem candengues! O Sô Chefe por acaso dum catravês não estava com o catolotolo?
As escolhas de T´Chingange
NATAL E A “AMIZADE” - Qualquer um tem de ter a oportunidade de ser caminho...
Por
Dê cor aos seus sonhos, impulsione seus passos e acima de tudo respeite o seu tempo. Não se obrigue a andar em linha recta o tempo todo; há curvas necessárias para que a vida seja melhor aproveitada. Não espere que as coisas simplesmente aconteçam. Desafie-se sempre que a preguiça se acomodar a si e, incomode-se sempre que seu banho-maria começar a esquentar. Dispense o morno e aproveite para ser feliz em seu tempo integral. Não é preciso muito quando se sabe reconhecer e valorizar o pouco que já nos transforma.
Hoje um amigo do peito telefonou-me a desejar Boas Festas e, eu que estava sem notícias suas, fiquei agradado em o rever, saber que afinal tinha esperanças por via de atentas atenções de amigos como eu e, só acrescentei que ele teria de criar uma filosofia só sua, a começar por gostar de si próprio não rejeitando o seu eu, visto ao espelho.
Natal… É o mês de confraternização, agradecimento pela vida, bênçãos ao filho de Deus, união, amor, reflexão. Que o bom senso traga um saco cheio de paz, harmonia, fraternidade. Ao longo da vida surgem-nos manchas indesejáveis, a pele envelhece, os músculos ficam mais tensos ou secos, mas a mente tem de se manter sempre incólume, mais sábia até! Que o gesto de ternura se estenda de várias mãos; que o amor expluda em todas as direcções com fé, paz, saúde e realizações.
Meu presente de Natal é tão diferente, que jamais se encontrará em lojas que vendem presentes. Ele é fácil de fazer e não precisa dinheiro, é uma estrela que brilha mais do que ouro, é a estrela da AMIZADE. Um fenómeno todo enfeitado de sentimentos, que tendem a transformar nossas vidas em belos momentos. Um toque de suavidade aos sonhos de cada um de nós com os inerentes anseios da própria humanidade! A gente não pode perder as oportunidades de interferir de maneira positiva na vida do nosso próximo, nosso amigo. Qualquer um tem de ter a oportunidade de ser caminho...
O Soba T´Chingange
ANGOLA . NUM TEMPO CINZENTO - Ongweva é saudade… Os camionistas eram o traço de união das gentes que viviam no interior…
Por
Eduardo Torres – Um Xicoronho de 3ª geração - "Se alguém lhe fechar a porta, não gaste energia com o confronto, procure as janelas.” - Gandhi
Normalmente junto-me ao meu amigo e vizinho Sousa, que tem uma vivenda frente ao bloco de apartamentos onde vivo, somos quase da mesma idade, ambos funcionários da Câmara, ele topógrafo na de Luanda e eu desenhador na de Sã da Bandeira. Conversamos sobre qualquer tema actual, mas a conversa acaba sempre por recordar os nossos bons tempos de Angola. Quando, muito antes de aparecer a Penicilina, se morria mais das infecções do que propriamente das operações, da Beladona, pomada para determinados tratamentos, do permanganato milagroso no tratamento de feridas e algumas infecções.
Das ventosas para serem tratadas as pneumonias, nas papas de linhaça, no famoso Vick para as constipações, no óleo de fígado de bacalhau tomado no tempo do frio, o aparecimento do leite em pó, das sulfamidas que tratavam tudo, e sobretudo, da vida difícil desses tempos, em que na época das chuvas para se fazer uma viagem tínhamos de estar precavidos, porque tanto podia durar um dia como perto de uma semana.
A África, e neste caso especial Angola, vivia muito da solidariedade das pessoas, e os camionistas, eram uma classe muito especial nesse aspecto, pelas enormes dificuldades encontradas nas viagens que faziam, chegando a juntarem-se em grupo, por ter surgido um obstáculo que os impedia de continuar a jornada, e todos juntos, conhecidos ou não, utilizavam em conjunto os meios de que dispunham para resolverem o problema, tornavam-se amigos e essa amizade nascida de uma causa que fora comum a todos, simbolizava a força da união na estrada.
Os comerciantes no mato eram sempre ponto de paragem obrigatório, para se beber uma cerveja, saber das novidades, estar a par dos acontecimentos. Todos se conheciam, e cada um, à sua maneira, procurava ser solidário na resolução de qualquer problema. Eles, os camionistas, eram o traço de união das gentes que viviam no interior e das outras, que viviam em aglomerados populacionais. Eram o sangue vigoroso que lhes circulava nas veias difíceis, as estradas, e que fazia bater forte o coração forte dessa imensa e grandiosa terra, inóspita, difícil, mas singularmente terna e amante.
São recordações que só desaparecerão quando o tempo determinar no nosso fim de ciclo de vida. Enquanto isso não suceder, procurarei deixar bem explícito que Africa não era a terra das patacas, como muitos pensavam, porque viam os verdadeiros colonialistas bem instalados aqui no Continente, a viverem do trabalho de quem mantinha a produção das sua roças de café, do algodão, do sisal, dos administradores da Diamang e de todas as outras imensas riquezas que contribuíam para o enriquecimento do tesouro nacional.
As opções do Soba T´Chingange
ANGOA . A MÃO DE DEUS no rio dos elefantes . Não há palavras para vos descrever o que senti ali acocorado entre os dedos Dele - 3ª de 3 partes
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Dy - Dionísio de Sousa (Reis Vissapa) - Autor de “Ninguém é Santo” escrito para todos os Angolanos que amaram e amam a terra que os viu nascer ou crescer…
(…) NA FOZ DO RIO QUATIR - Ninguém me ligou peva e só quando cacei o almoço e o jantar com dois tiros de caçadeira é que a vizinhança debandou alvoraçada. O trabalho não era nenhum. Medir diariamente numa vara hidrométrica as oscilações de caudal o que me ocupava pouco mais de dois minutos, sobrando-me tempo para explorar aquele paraíso que jamais se apagará da minha memória. Dei com a mão de Deus quase um mês depois de ali estar. Já calcorreara a pé os quinze quilómetros que me separavam de umas das mais formosas quedas de Angola, as quedas de Montenegro e banhara-me em piscinas naturais únicas no mundo com o fragor da água caindo em anfiteatro sobre o meu corpo.
Decidi um dia explorar um rio de aluvião apelidado de Rio dos Elefantes, palmilhando a areia do seu leito seco para montante uns largos quilómetros. Alcateias de babuínos (Macaco Cão) tentando amedrontar-me com os seus latidos, as fêmeas correndo com os seus rebentos à cacunda e os mais excitados fazendo-me caretas. Manadas de impalas pulando com uma elegância ímpar e Olongos de cornos altivos fugindo ao retardador. Foi quando deparei com ela, a mão de Deus. Enormes monólitos naturais de granito, dispostos de forma circular bem em frente aos meus olhos fazendo lembrar a mão do Senhor. Mais de dez metros de altura que eu marinhei com sofreguidão para do alto poder deslumbrar-me com a paisagem.
Foi quando os vi e precisaria mais que uma crónica para vos descrever a beleza e o encantamento daquele momento. No interior daquela construção ciclópica uma manada de elefantes com as suas crias banhava-se numa lagoa circular, largos metros abaixo da minha posição estratégica. Não há palavras para vos descrever o que senti ali acocorado entre os dedos de Deus. Há uns meses atrás vi em casa um filme classe B em que uma menina viera para a Namíbia para ver o pai que se separara da mãe oito anos antes, tendo vivido todo esse tempo na Europa.
Uma história mal contada de um desastre de avião em que a menina se aventura pelo deserto dentro com um negro que lhe ensina os segredos da natureza e da região, à procura do pai desaparecido que se envolve numa luta com terroristas, não sei onde. A Mão de Deus é a única coisa decente do filme, embora erradamente situada em território Namibiano. Os elefantes que eu vi há cinquenta anos atrás ainda por lá andavam. A minha mulher ficou transtornada quando me ouviu a soluçar baixinho com a comoção. – Mas o que se passa homem. – Não se passa nada, foi só a Mão de Deus que me acenou de novo.
Reis Vissapa
As escolhas de T´Chingange
NATAL E A “LEI DA RELATIVIDADE” - Com sorte, escapas!
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Traçando cruzes na boca para afugentar bocejos em vésperas de consoada de Natal, leio através de letras falantes muitos milhares de mensagens puras de honestidade sabendo que entre estas existem também algumas malambas da hipocrisia. Vem isto a propósito do POEMA AO NOSSO DEUS enviado por um amigo que diz: NESTA DATA FESTIVA, EM QUE O MUNDO PROCLAMA, UNS O NASCIMENTO DE JESUS, OUTROS, NEM SABEM BEM O QUÊ, APENAS VÂO NA ONDA, NAÇÕES INTEIRAS FESTEJAM O NATAL. ATÉ AQUELAS QUE NEM ACREDITAM NEM PROFEÇAM O NOME DE JESUS USAM TRENÓS DE PIRILAMPOS E PAIS NATAIS DE BARBAS BRANCAS PROMOVENDO PRODUTOS DUMA QUALQUER CATEDRAL DE CONSUMO. É NEGÓCIO, HIPÓCRISIA – TUDO É LICITO!...
Entretanto, alegrando as rugas da preocupação entre tantos e tantos projectos de felicidade comum, minha respeitosa mulher prega rendas numas fronhas de almofadas para amolecer carinhos natalícios algumas das mais próximas amigas. Ibib, minha mulher de há quarenta e cinco anos, julga ser melhor oferecer coisas feitas por nós mesmos.
De contentamento cansa os dias na labuta, agulha que vai e que vem, esquecendo assim as tremuras que lhe mordiscam a alma e a saudade, essa coisa vaga e longínqua de imensurável melancólica visão distribuída por três continentes. Enquanto isso, sorvendo a vida em largos nadas, eu engomo a preguiça granulada de louvores e bondades alheias desprendidas pelo fenómeno natalício através do Facebook.
Enquanto isso, preparo os apetrechos de escritos fugidos das sombras fátuas, águas passadas que não movem moinhos. De qualquer modo não é esta a melhor altura de rogar pragas - Isto mesmo! Não é em vésperas de consoada que vou acordar essas violentas e duvidosas misérias, desvanecendo o bonito nome chamado amor.
Tenham um Bom Natal…
O Soba T´Chingange
NAS FRINCHAS DO TEMPO - Por vezes o mundo fica com um cheiro anti-séptico…
Malamba é a palavra
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Por vezes o mundo fica com um cheiro anti-séptico e, sem estarmos mortos, afundamo-nos num medo de noite sem tempo, misturando a respiração com o silêncio e, este com a indiferença. Por vezes o destino reserva-nos risadas moles, dessas que nos encantam com uma tristeza feliz, um sentimento construído no cimo das nuvens. Sim! Nas nuvens aonde o futuro nos espera depois de uma vida cheia de chega e vai; assim com uma intensidade esdrúxula, garimpando estórias nunca contadas.
Revendo-me por debaixo de um alpendre, vendo a chuva miúda e fria, cansado destes dias de pouco sol de cheiro mediterrânico, a fazer-se inverno às cinco e pouco da tarde, viro a página. Mas, eis que passaram dois dias e o calor volta a mais de vinte graus com os ponteiros do relógio andando entre as onze e as quinze da tarde e, as moscas que saem do nada, vindas sei lá, de Marrocos com o velho vento Sião empoleiradas nesses pedaços de nuvens à mistura com areia do Saará.
Na rádio falam da crise de mais um banco que desce nos gráficos das gorduras, das incertezas de continuar sem ter de abafar as contas dos depositantes, esse caminho fraudulento de roubar as economias dos outros. Tinha aqui mais uma notícia para ser contada aos poucochinhos para doer menos. As certezas eram tão miúdas que nem davam para serem catadas na pontinha dos dedos. Deste modo só podia mesmo esfregar meus refegos mais agasalhados ignorando as profundas repercussões de mais uma falhada engenharia financeira, com os cães a ladrar, virando-se contra seus donos.
E, foi o BPN, o BES e agora o Banif mais o Banco Novo a desconsolar-nos com um véu descolorido sobre nossos olhos, nossas vontades, nossos sonhos de pão-de-ló sem os joaquinzinhos fritos. Enfim! De novo aqui ficamos entalados entre migas e entrecosto e sopas de couve troncha. E a merda dos reforços e rácios com os fundos de resolução e edecéteras que nos saem do bolso para reforço de capital que nos vai ser fanado dos nossos bolsos de contribuinte. Um ruim presente de Natal… Diga-se!
O Soba T´Chingange
ANGOLA . NAS CICATRIZES DO TEMPO – IV
Embora não considere que exista racismo em Angola, fala da desigualdade de oportunidades.
Por
ELIAS ISAAC - DIRECTOR DA ONG OSISA - “O que Angola está a tentar fazer é a transformação social com uma minoria que vive nos condomínios…”
(…) Encontramo-nos com Katila Pinto de Andrade, 40 anos, em Luanda, no dia do julgamento do jornalista e activista pelos direitos humanos Rafael Marques. Katila sugere-nos para encontro um dos restaurantes da ilha de Luanda. Os restaurantes e bares desta zona da cidade conhecidos por serem caros são maioritariamente frequentados por brancos, dizem-nos muitas vezes. São hora de almoço e não há muitos clientes, mas a decoração não é muito diferente de qualquer bar de praia mais cool na zona de Lisboa. A diferença é que é preciso ganhar um bom salário para frequentar estes espaços, dirigidos sobretudo à elite e à comunidade internacional que vive em Luanda.
Katila completa algumas das ideias de Elias Isaac sobre a questão da pobreza. “A nossa sociedade é multirracial” e existe “em alguns estratos uma convivência harmoniosa e pacífica”. Mas “nota-se que a maioria da população negra é a população pobre, carenciada, é a população que se encontra numa situação de vulnerabilidade”. Afirma com convicção: “Em Angola a pobreza tem cor, a pobreza tem rosto e temos de começar a olhar para isso e tentar arranjar mecanismos de integrar na sociedade aqueles que são excluídos, porque corremos o risco de criar problemas raciais que não se justificam. A pobreza em Angola é maioritariamente negra.”
Embora não considere que exista racismo em Angola, fala da desigualdade de oportunidades que é preciso corrigir. Conta a história de uma funcionária de um banco que lhe disse que os trabalhadores eram maioritariamente mestiços e que ela tinha orientações de, no processo de recrutamento, “dar prevalência ao pessoal de raça negra porque fica mal ter maioritariamente mestiços”. Comenta: “Há pessoas que provavelmente vão repugnar-se e dizer que isso é um critério rácico. Mas é preciso criar equilíbrios. Penso que é algo que deve ser discutido, avaliado, para se evitar essas distorções.”
Exemplo comum dado por muita gente é a representação na publicidade: os rostos escolhidos são tendencialmente mais claros do que da maioria da população. E que o atendimento nos balcões das lojas e dos bancos era feito por empregados com a tez mais clara. Em Angola, se um negro e um branco chegarem ao mesmo tempo a um restaurante, é muito possível que a pessoa que está a atender vá primeiro ter com o branco, exemplifica Lúcia da Silveira. “Mas isso é uma construção. E é muito difícil tirar isso da cabeça das pessoas. O privilégio branco é visível em qualquer parte do mundo e aqui também.”
(Continua…)
As opções do Soba T´Chingange
ANGOLA – CICATRIZES DO TEMPO - UMA CONSPIRAÇÃO ANTIGA …
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Depois do golpe do estado em Portugal a 25 de Abril, Portugal anunciou descolonizar as suas colónias. No seio do MPLA no leste de Angola levantou-se um tumulto iniciado pelo kathua Mithue também conhecido pelo comandante Jibóia, um Tchokwé da região. Ele disse que, Agostinho Neto estava a lutar contra os seus sogros, e se chegarmos ao poder, Agostinho Neto vai lá por os seus sogros e seus cunhados, por isso ele já não deve ser presidente do MPLA; na altura o vice-presidente era o Daniel Chipenda, e os dois concorreram à presidência do Partido.
O Daniel Chipenda saiu vencedor mas, como o Neto não quis deixar a presidência do partido, o MPLA desintegrou-se em duas facções. Os Portugueses em Angola queriam uma independência do tipo rodesiana, e o Presidente Português António Spínola não aceitou isso. Em 1974 apareceram em Angola mais de 40 partidos, só de brancos! (..?..) Spínola, como queria a mesma transição que estava a acontecer em Portugal não quis que algum partido branco participasse; disse que só concorreriam nessas eleições a FLNA, UNITA e o MPLA de Daniel Chipenda, isto porque ele sabia que Agostinho Neto tinha perdido as eleições e estava no momento a usurpar o lugar de Chipenda.
Mas neste destino, Agostinho Neto tinha a vantagem de ter o apoio do seu amigo intimo, o governador de Angola Rosa Coutinho do MFA, do PCP e daqueles brancos radicais que queriam uma independência tipo rodesiana. Estes brancos viram-se traídos e decidiram que: - Já que o General Spínola não nos deixa ter uma independência do tipo rodesiana então vamos tomar o poder com ajuda dos nossos amigos pretos. Depois meteremos um presidente preto e continuaremos a governar.
Esta, foi a razão da violação dos acordos de alvor, e foi a razão por que o MPLA odiava António Spínola. Isto, nesse então, até inspirou o cantor Santocas a dedicar uma música, que referia Spínola como o mandante de matar Amílcar Cabral. A canção empolgava na chama, a tocha do MPLA, nanhe wajiba Cabral kifumbie, oh kifumbi kia mauana a muichana Spinola. Grande mambo, noé!
As escolhas de T´Chingange
ANGOLA . A MÃO DE DEUS no rio dos elefantes. Não há palavras para vos descrever o que senti ali acocorado entre os dedos Dele - 2ª de 3 partes
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Dy - Dionísio de Sousa (Reis Vissapa) - Autor de “Ninguém é Santo” escrito para todos os Angolanos que amaram e amam a terra que os viu nascer ou crescer…
(…) Menos de um ano depois uma sólida amizade desenvolveu-se entre todos nós. Eu era mais novo do grupo e talvez o mais irreverente o que deu em vários desterros compulsivos para lugares de beleza inimaginável, acabando esses castigos por se tornarem uma bênção de Deus. Evito escrever crónicas verdadeiras sobre essa época por que deixam sempre a impressão de autobiografias exageradas. Não resisto a falar-vos da Mão de Deus.
O Nissan azul dos serviços veio a derrapar nos barros negros até à Oncócua conduzido por Luís Negrão grande amigo cuja história interessante e trágica contarei numa outra crónica mais lá para a frente. Depois de bebermos umas Cucas na loja de mato do Serafim partimos em direcção ao Cunene onde o meu colega me deixou sozinho a largos quilómetros de distância da civilização. Fiquei instalado numa construção inacabada sem portas nem janelas e apenas com telhado.
Um luxo sem luz ou água. Mobília o meu burro de campanha e a mala do rancho, vizinhos meia dúzia de osgas empanturradas de moscas e mosquitos, aranhas com um bojo amarelo enorme e cerca de seis centímetros de largo que corriam a uma velocidade estonteante, uma cobra rateira que fugiu pela janela a sete pés e uns rilhetes semelhantes aos dos cães que vim mais tarde a constatar que o meu alojamento era usado como W.C. pelas hienas.
Depois de ter passado três meses numa tenda na foz do rio Quatir, afluente do Cubango, encontrava-me finalmente num hotel de alto de luxo. Dormi que nem um justo e de madrugada com o sol a raiar olhei pela suposta janela e dei de caras com uma das paisagens mais belas da margem do Cunene. Bandos de capotas e perdizes debicavam sementes e insectos num frenesi perante os meu olhar sonolento. Uma manada de impalas pastava pachorrentamente junto ao arvoredo que sombreava o rio e dezenas de “chicos-laricos “ pulavam numa chinfrineira pegada de árvore para árvore.
As opções do Soba T´Chingange
CINZAS DO TEMPO – Tento aprender a viver com o vazio das coisas … Fui para longe, no tempo, para ver bem os recantos que não podem ser vistos de perto… III
Hoje era suposto descrever sucintamente as estórias de Monangamba do Zeca Kafundanga, meu irmão preto saído de Cassoalála, mas ainda não encontrei as mentiras certas para contornar verdades e, sem meter resíduos de pólvora; os tempos eram muito de periclitantes com mona-caxitos saídos do paralém de Kassoneca e Kifangondo, coisas de kwata-kwata de gwetas para o M´puto. Todos nós em dado momento de nossas vidas fomos no mínimo, donos de um instante; já fomos loucos o suficiente para sentirmos as rugas das estradas e falarmos em liberdade na forma de discutir carburadores, pistões e velas de ignição.
Nessas antigas conversas uma corrente dentada era um pedaço de ilusão terminada nas cremalheiras de elos em forma de futuros sonhos. Foram tempos desafiadores em conhecimentos de escapes com espírito motorizado de humilhar motores; tempos de ciências com centímetros cúbicos de cilindrada de filosofias de Famel XF-19, de zundappes, nsus e kavasakis, tempos de muito n´guzu.
Na falta de tino, riamos às gargalhadas dos perigos inaceitáveis vindos de polícias agigantados com calças nazis de balão lateral montando Harley Davidson. Falando todos ao mesmo tempo especulávamos sem teimas esclarecidas, comentando mujimbos decapitados no diz-que-diz. O mundo era nosso, enfim! Estes fedelhos candengues cresceram, cada qual para seu lado estudaram e casaram, tiveram filhos, emigraram, fugiram e num ir e vir por aí fiaram na diáspora sentados em sofás de napa, cabedal ou veludo.
Mais velhos, reconsideraram quando lhes passou a tal irritação de orgulho quando já era tarde demais, que afinal não se conheciam as esperanças que tinham; que talvez estivessem convencidos que estariam melhor por lá naquele fim de mundo, a tasca, a fazenda, a picada. Que afinal só reconsiderou quando lhe passou a irritação do orgulho tardio. Aquela fotografia pertencia a outra idade; era impossível regressar lá.
Nos pensamentos longínquos cheiram-se as cismas fechadas, as sombras das cenas, os retractos de família amarelecidos e até pintalgados pelas moscas, as cuecas dobradas sobre a roupa na cadeira, as calças ao calhas, enrodilhadas com flanelas e lãs da serra, camisolas de lá, um indistinto lugar no meio da floresta ou para lá do fim do mundo, lugares inóspitos.
O Soba T´Chingange
ANGOLA . NAS CICATRIZES DO TEMPO – III
Interrogação ou exclamação? - A pobreza tem cor?!.... É negra!?...
:::::As escolhas do Kimbo
As escolhas do Kimbo
Por
ELIAS ISAAC - DIRECTOR DA ONG OSISA - “O que Angola está a tentar fazer é a transformação social com uma minoria que vive nos condomínios, tem acesso ao crédito bancário, a bons empregos, enquanto a grande maioria que já no passado viveu excluída continua excluída nos musseques.”
(…) Ao mesmo tempo, lamenta, por seu lado, o fotógrafo Ngoi Salucombo, 33 anos: - Há muita coisa que é responsabilidade dos angolanos! A questão do emprego tem muito que ver com a falta de investimento nos quadros nacionais; é preciso investir na base, e de forma acertada, para deixar de ser preciso recorrer a tantos expatriados. Isto é uma questão política. “O angolano, à partida sente-se numa posição que está a sofrer de racismo, e estou a falar do angolano privilegiado que esteve fora, se formou, muitos em universidades que estão acima do ranking da universidade onde o português estudou. Só que como o expatriado vai para zona de risco (e tem de ter determinadas condições). O angolano não tem como não se sentir discriminado.”
Por isso, Katila Pinto de Andrade, responsável pelo programa de democracia e governação da OSISA, defende a angolanização, ou seja, a tentativa de ter o maior número de angolanos possíveis nas empresas/instituições, algo por vezes interpretado como discriminação. Acredita que é importante criar o conhecimento, transmiti-lo aos angolanos para não se manter o sistema em que as chefias são ocupadas por estrangeiros e os angolanos ficam com postos subalternos. “Se queremos que os angolanos sejam mais competitivos, temos de estar dispostos a ajudá-los a crescer.”
O jovem cientista político Sérgio Dundão lembra que há um desconhecimento grande sobre Angola da parte de alguns portugueses que emigram - e isso gera equívocos. Não tem dúvidas de que “a relação entre Angola e Portugal nunca poderá ser perfeita” porque há uma questão de violência entre colonizador e colonizado.
O Professor conta que nas suas aulas ouve queixas de diferenças de tratamento nos restaurantes, de existirem zonas onde só circulam portugueses e de ser raro ver portugueses a circular em táxis colectivos, como se houvesse medo da sociedade angolana. “Existe violência em Luanda, mas isso afecta primeiro o negro.” Ou seja, a percepção é a de que os portugueses não se misturam com o resto da população!
Lúcia da Silveira, presidente da Associação Justiça, Paz e Democracia, 40 anos, sente que há muitas questões que deveriam ser aprofundadas neste debate, uma delas é a dos postos de trabalho, por isso “devia haver maior transparência nessas contratações para evitar este tipo de conversas paralelas”.
(Continua…)
As opções do Soba T´Chingange
TEMPOS MORNOS – Na crença de ocultadas nuances, tenho-me forçado a encontrar um herói perfeito, um que mostre a face vil e cruel do ser humano…
Malamba é a palavra
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Tenho andado ao sabor das notícias televisivas, os comentadores baralhando as cartas segundo seus critérios de análise e suas tendências politicas; até no desporto levam horas a fio descosendo como novelos, as jogadas ao milímetro, vendo sempre mais que o próprio árbitro. Claro que há jogadas na política que em mim, não se vislumbram do mesmo modo que seus arbítrios, sem conseguir deslindar-me qualquer luz no fundo do túnel. Para captar votos à direita ou esquerda, dão palpites, enganando-se ou enganando-nos por querer; contam a história de coisas que parecem nunca sair do meio, dessas de sem fim à vista.
Claro que o céu está sempre lá em cima mas, quando se perde confiança na sua flutuação, também o medo passa a ser permanente! Eu, e muitos mais que imaginamos oliveiras a partir de goiabeiras, ficamos com os rostos mais velhos tornando-nos até donos de mágoas soterradas, submersas ou submarinas.
Descendo por elas, as mágoas, apegam-se-nos como lágrimas silenciosas na forma de varizes e carrapitos negros, manchas de pele e ainda outras mazelas internas invisíveis. Respirando a idade tento cheirar as notícias e, não sinto em sua composição a frescura da cal viva, daquela que dá cor a toda a brancura.
Tenho-me forçado a encontrar um herói perfeito, um que mostre a face vil e cruel do ser humano, que me possa servir como presidente, que me defenda! Um, que desimpedido pelas barreiras, investigue os antagónicos traços de nosso governo. Um herói que tenha as sobrancelhas no rosto e que faça lembrar respeitosos estadistas.
Tão abarrotado de civilização e informação, espreito os meses farejando raças sob o abrigo de suas telhas vãs em calor da lareira, panela atestada de couves tronchas, frigideiras com unto branco de porco, uns chouriços de pendão, panelas tisnadas, trempes de ferro sempre aquecidas entre troncos de oliveira, azinho e borralho esparramado.
O Soba T´Chingange
ANGOLA . A MÃO DE DEUS no rio dos elefantes. Não há palavras para vos descrever o que senti ali acocorado entre os dedos Dele - 1ª de 3 partes
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Dy - Dionísio de Sousa (Reis Vissapa) - Autor de “Ninguém é Santo” escrito para todos os Angolanos que amaram e amam a terra que os viu nascer ou crescer…
Alguém muito especial disse-me que eu tenho um coração mestiço. Para esse alguém este conto e naturalmente para todos os que gostam de ler os meus contos. Ao chumbar pela segunda vez no exame do sétimo ano a minha saudosa mãe colocou um ponto final na minha vida de cabulice e vadiagem. - Acabou a rebaldaria não queres estudar vais trabalhar que isto não é a casa da Joana. Cocei a moleirinha perante aquele ultimato e não tive outro remédio desatei à procura de emprego. Depois de duas tentativas falhadas por atrasos consecutivos à hora de vergar a mola entrei para a Brigada dos Rios.
Acho que além do facto de me ter posto neste vale de lágrimas a coisa que mais agradeço à minha progenitora foi por via daquela sua decisão ter passado os melhores anos da minha vida nesses serviços. Conheci o sul de Angola desde a foz do Cunene até ao Luiana, aquela pontinha do território angolano onde o Cuando e o Cubango atravessam para o território Namibiano em direcção ao famoso delta hoje patrimônio mundial.
A instituição hidrográfica iniciou a sua actividade sob o comando de um oficial da marinha. Homem duro, militarista que desde o princípio dirigiu o grupo de trabalho civil à boa maneira militar. Com ele vieram de Portugal, motoristas, mecânicos, desenhadores, hidrometristas sem curso e de natos em Angola entrei eu e o caçador guia Monteiro Ferreira natural do Cuchi, grande amigo que muito me ensinou sobre o mato africano o seu fascínio, os seus perigos e segredos imemoriais.
Era impossível deixar de sentir a forma quase discriminatória como fui tratado inicialmente, quase como um parolo ou uma criatura de condição inferior. Com andar do tempo toda aquela gente acabou por se aperceber que em Angola havia bons topógrafos, magníficos mecânicos capazes de resolver uma situação complicada com um bocado de arame, sabão para tapar buracos no radiador ou duas malas de peixe a servirem de macaco, e que não éramos propriamente macacos.
(Coninua...)
As opções do Soba T´Chingange
ANGOLA . NAS CICATRIZES DO TEMPO – II
40 Anos depois, “Não se pode fugir à história e pensar que um dia pegamos numa borracha e apagamos tudo”
As escolhas do Kimbo
Por:
ELIAS ISAAC - DIRECTOR DA ONG OSISA - “O que Angola está a tentar fazer é a transformação social com uma minoria que vive nos condomínios, tem acesso ao crédito bancário, a bons empregos, enquanto a grande maioria que já no passado viveu excluída continua excluída nos musseques.”
(…) Em Angola, um padrão comum é ver um português ou brasileiro branco a chefiar uma equipa de negros. Dá o exemplo de uma empresa de auditoria com quem trabalha há muito tempo: -todos os anos, a funcionária angolana chega com um novo chefe português. “A angolana nunca será chefe”, acredita. “Há instituições que têm esta cultura. Não é de forma expressiva que as pessoas tratam os outros de forma racista, mas institucionalmente aceitam um valor cultural que está a ser aplicado.” Por isso afirma: existe racismo institucionalizado em Angola.
Num percurso pelos cafés e restaurantes de Luanda é fácil notar que o menu é sobretudo composto por pratos portugueses. Cervejas, refrigerantes e vinhos também são portugueses. As televisões estão muitas vezes sintonizadas em canais portugueses. Muitos torcem pelo Sporting ou Benfica e consomem produtos portugueses, como as cervejas ou sumos. Nas ruas de Luanda sente-se, de forma maciça, a presença da nova vaga de emigrantes portugueses. Há uma marca portuguesa que continua activa 40 anos depois da independência. Mas a presença de portugueses nem sempre é pacífica, sobretudo nos casos em que há relações de poder em jogo.
Hoje, em Angola, não existe o confronto racial entre um angolano negro e um português branco, acredita Elias Isaac, mas por vezes há uma tensão. Daí tantos angolanos darem este exemplo dos postos de trabalho. “Não podemos fugir à história e pensar que um dia pegamos numa borracha e apagamos tudo”, diz Elias Isaac. “Angola precisa muito de Portugal, não só em termos económicos e financeiros mas em termos de espaço de afirmação.
Ainda existem em Portugal certos segmentos que pensam que Angola é uma colónia e isto reflecte-se na própria convivência entre as pessoas. Angola é um país soberano, tem de decidir o seu rumo; as relações são entre dois países soberanos, mas existe uma geração que não acredita que o processo da descolonização aconteceu em 1975. Então tanto lá como aqui vão existindo práticas muito subtis que vão incentivando esse conceito.”
(Continua…)
As opções do Soba T´Chingange
PARA REFLECTIR ... Fábula europeia... Isto está acontecendo no Brasil !!!
Presidente Emilio G. Medici - 13Nov 1969 - "Não uso critérios políticos ou regionalistas, não pago dívidas eleitorais que não precisei contrair, não tenho a vocação do favoritismo e da cortesia no exercício de meu dever e me declaro incompetente na mecânica da composição, do conchavo, da barganha. Compromisso, só os tenho com a minha consciência e com o futuro de meu país".
Eu diria que já é uma fábula Brasileira. É só converter imigrantes para usuários das Bolsas Família, e outras que tais… Da narrativa de um cidadão europeu:
Comprei uma casinha, destas de alimentar pássaros... Pendurei-a na varanda e a supri com ração. Ficou uma beleza, carinhosamente não deixei faltar as sementinhas. Dentro de uma semana, tivemos centenas de aves que se deleitavam com o fluxo contínuo de comida livre e facilmente acessível. Mas, então, os pássaros começaram a construir ninhos nas beiras do pátio, acima da mesa e ao lado da churrasqueira. Depois veio o cocô. Estava em toda parte: nas cadeiras, na mesa… em tudo! Algumas aves mudaram até de ideia. Tentavam-me bombardear em voo de mergulho e me bicar, apesar de eu ser seu benfeitor.
Outras aves faziam tumulto e eram barulhentas. Elas se sentaram no alimentador e a qualquer hora exigiam ruidosamente mais comida quando esta ameaçava acabar. Chegou uma hora que eu não conseguia mais sentar na minha própria varanda. Então, eu desmontei o alimentador de pássaros e em três dias acabaram indo embora. Eu limpei a bagunça e acabei com os ninhos que fizeram por todos os lados.
Assim tudo voltava ao que costumava ser … calmo, sereno… e ninguém exigindo direitos a refeições grátis. Agora vamos ver… E o remetente da história conclui: -Nosso governo dá a comida de graça a quem precisa, habitação subsidiada, assistência médica e educação gratuita; permite que qualquer pessoa nascida aqui receba automaticamente a cidadania. Aí os ilegais chegaram às dezenas de milhares. De repente, os nossos impostos subiram para pagar os serviços gratuitos; pequenos apartamentos estão abrigando cinco famílias; você tem que esperar 6 horas para ser atendido numa emergência médica; seu filho, cursando o segundo grau, está a procura de outra escola, porque mais da metade da sua classe não fala a nossa língua.
As caixas de cereais matinais agora vêm com rótulos bilíngues. Sou obrigado a usar teclas especiais para poder falar com o meu banco no nosso idioma e a ver pessoas estranhas acenando bandeiras, que não são a nossa, e as ouvir berrando e gritando pelas ruas, exigindo mais direitos e liberdades gratuitas. É apenas a minha opinião, mas talvez seja hora de o governo desmontar o alimentador de pássaros. Se você concordar, passe adiante; se não, simplesmente continue limpando o cocô! Bom, foi ele que escreveu...
O Soba T´Chingange
TEMPOS CINZENTOS - Como um risco feito no chão, nem sempre se escolhe o dedo ou arado…
XICULULU : - Olhar de esguelha, mau-olhado, olho gordo, cobiça
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T´CHINGANGE - Nasceu em águas internacionais num vapor chamado Niassa. É cidadão do mundo - Mazombo por condição; anda pelo Mundo à procura de si mesmo! Sente-se e respira Angolano, tem cédula de Brasileiro, B. Identidade do M´Puto - Anda às arrecuas para fugir à regra, um paradigma novo, só dele.
Sem interromper um longo resmungo, a cabeça armou-me a carroça. Ainda estamos no Outono e o frio de noite racha-me como se já fosse inverno! Com sopas de nabiça e açordas de poejo, sem filhos escurecendo-me as mágoas, estas dum fundo tal, nem precisam de ecos extras. Fazem assim pum-pum nas frontes e nos ouvidos, latejando dia e noite com um apito, às vezes agudo e, é nesse preciso momento que tomo aquele pedaço de comprimido para a tensão, a tal de pressão.
Os ecos às escuras permitem-me analisar os pensamentos ao pormenor e, sem gritarias. Escolhendo os caminhos de tempos incertos ainda me passa pela ideia semear ervilhas e favas quadradas, conforme reza o almanaque borda de água mas, entretanto, lá terei de estender a batatas e curá-las com uma mistura de cinza e cal viva de modo a não apanharem o bicho.
Mas, agora não é tempo de escolher caminhos de risco incerto, porque quando Nosso Senhor ajuda, o governo vem, e tira, cobra taxas e sobretaxas. Mesmo com a idade avançada, não queria tolher-me de preguiça mas, ser patrão está por demais complicado; sendo administrador de qualquer provento financeiro, é uma dor de cabeça, uma roleta russa de ganho incerto.
Os mecanismos de engenharia financeira são maquiavélicos; qualquer descuido leva um coitado para a penumbra do crescimento económico desmultiplicando-lhe a vontade, quando a isso adiciona os pagamentos por conta, os juros de mora, e um monte de pontapés no traseiro antes mesmo de se escapar a ganir como um cachorro. Com tanta confusão, tantas leis, se alcançar a consciência de uma pausa, mesmo pequena, talvez seja capaz de não mudar a palavra do meio e, assim torna-la por fim, indecente: mas, que merda!
O Soba T´Chingange
TEMPOS MORNOS – Com chá, na crença de ocultadas caricias, benzo-me num dia igual a tantos outros…
Malamba é a palavra
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Não sei porque chamaram àquele bairro de Ché-Lagoense mas, posso lembrar-me de quando a figura de Ché o tal de Guevara andava no pensamento de toda a sociedade pois era nesse então a figura ícone da justiça, o zelador dos pobres e carenciados de todo o mundo; o defensor e libertador de povos oprimidos pela colonização ou pela casta dominante de endinheirados num mundo desequilibrado em questões sociais. Mas, veio mais tarde a verificar-se que tudo neste guerrilheiro não passava de uma farsa fabricada no meio da chamada guerra fria entre o Leste e o Ocidente.
Essa ideologia que se pensava ser transformadora sempre bulhando nossas cabeças, foram em seu tempo, ávidas em inventações. Uma utopia em forma de crença para mobilizar ideologias, derrubar estados ou estadistas. Mas, estando eu sentado no café deste bairro económico, ouvia mesmo sem o querer a gente que por ali e todos os dias faz salão, tomam sua bica e, por ali vão ficando a falar de coisas triviais ou tagarelando as coisas do dia-a-dia; gente maioritariamente de idade.
Foi quando surgiu um outro velho vizinho do bairro inspirando com lume nos olhos, uma abobora menina, assim num ar de meio espantado, sem boina, com três ou quatro madeixas de cabelos fracos, carregando-a com dificuldade. Pediu uma faca de cozinha ao Domingos, o dono do café, misto de salão com esplanada e matraquilhos. Colocando a mesma em cima da mesa das senhoras calhandreiras, distribuiu nacos por todas elas dizendo-lhes o quanto aquilo fazia bem ao nosso organismo, nossa saúde.
- Se querem ficar sem colesterol comam disto todos os dias! E, entre outras várias considerações, afirmou peremptório que aquilo era sua oferta de Natal! Que fizessem filhoses ou as metessem num um-dois-três, liquefazendo os pedaços com nozes, mel e outras frutas se o desejassem. Que isso seria bom para afastar gripes e desarranjos intestinais. E, lá foram dissertando outras guloseimas para o Natal.
Depois, esgotado este assunto, rumaram para as globalidades dadas pela televisão, dos muitos ataques terroristas, uma guerra sem frentes de combate, ora aqui, ora ali. E as modas, os novos costumes, surgiram no desfrisar de gostos: - Eu cá não acho piada a estes novos enfeites de Natal; agora são árvores com bolas reluzentes, é o pai natal, os trenós voando, as renas, os sapatinhos de feltro e coelhinhos de peluche.
Substituíram o presépio, dizia a dona que me pareceu ser a mais idosa. Acabaram com a tradição do menino Jesus nas palhinhas da manjedoura, do burro e da vaquinha dando-lhe bafo de calor e o Dom José mais Maria e uma estrela no topo da gruta a iluminar o caminho aos Reis Magos. Já nada é como antigamente! E, neste entretanto tudo ficou por aqui. O tempo é mesmo volátil! Nós também…
O Soba T´Chingange
ANGOLA - Conversa da Luua - Quando se perde património, já não se recupera – VII
Maianga é um bairro de Luanda - Luua
Por: Eleutério Freire
(…) Fala-se muito do lixo de Luanda. Isto é só o espelho da avalanche de gente que não era urbanizada, ou é mesmo a incapacidade de se lidar com uma realidade urbana? As duas coisas. O africano comum tradicional é uma pessoa limpa. Basta ver as casas dos camponeses. A passagem para a cidade fez quebras, perde-se o quintal e, às vezes, até os hábitos de limpeza. Na cidade cada pessoa produz X quilos de lixo por dia, isso acumula-se rapidamente. Tem de haver mecanismos de fazer desaparecer o lixo, por causa das doenças.
Por outro lado, na nossa época, o lógico é montar sistemas de recolha de lixo em paralelo com a sua rentabilização, para até diminuir as despesas, porque as despesas da recolha do lixo são cada vez maiores, aumentam com o crescimento da população. Recolher o lixo custa dinheiro, o que temos é pura perda, estamos a acumular toneladas de lixo sem buscar soluções para ganhar dinheiro com o lixo. Pode usar-se o lixo até para a produção de energia, recolhendo o gás que o lixo produz e utilizar para a iluminação, para cozinhar etc. Temos desperdiçado os benefícios do lixo. Há experiências universais que devemos aproveitar.
Quando colabora com o Núcleo de Arquitectura da Universidade Lusíada e com a Associação Kalu é porque sente que a palavra poderá ajudar Luanda? São iniciativas importantes. Acho que a Kalu deveria ter maior interacção com as organizações nos bairros, é um exemplo que se deve reproduzir até noutras cidades. A Kalu é uma associação de elite, de vanguarda, com informação e deve interagir com as outras associações de amigos de cidades e bairros pelo país.
O Núcleo de Estudos da Lusíada traz um aspecto técnico e investigativo que casa bem com os propósitos da Kalu e acho que se deve multiplicar também pelo país. O pouco que sei vou partilhando com eles. Andava há tempos para fazer uma visita pela cidade com a arquitecta Ângela Mingas, acho que esta relação dos arquitectos com as cidades, que não havia nem no tempo colonial … O futuro de Luanda está na palavra? Sim. É importante divulgar e levar as pessoas a lidar melhor com os seus espaços. Mas isso tem de passar pela escola, etc., até pelas escolas de condução, tanta é a falta de educação no trânsito.
FIM
José Kaliengue assim lembrou
O Soba T´Chingange
ANGOLA . DA LUUA -– "Fiz um acordo de coexistência pacífica com o tempo: nem ele me persegue, nem eu fujo dele, um dia a gente se encontra"
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Um qualquer de nós diria isto…. Solange, T´Chingange, Vumby, Mucanda…
Somos o povo especial escolhido do Sr. engenheiro. E como povo especial escolhido por ele, não temos água nem luz na cidade. Temos asfalto cada dia mais esburacado. Os que, de entre nós, vivem na periferia, não têm nada. Nem asfalto. Só miséria, lixo, mosquitos, águas paradas. Hospitais?!!! Nem pensar. O povo especial não precisa. Não adoece. Morre apenas sem saber porquê. E quando se inaugura um hospital bonito e ficamos com a esperança de que as coisas vão mudar minimamente, descobre-se que as máquinas são chinesas, com manuais chineses sem tradução e que ninguém sabe operá-las... Estas são opções especiais para um povo especial.
Educação?!! O povo especial não precisa. Cospe-se na rua (e agora com os chineses, temos que ter cuidado para não caminharmos sobre escombros escarrados de fresco...), vandalizam-se costumes, ignoram-se tradições. Escolas para quê e para ensinar o quê?!! Que o sr. engenheiro é um herói porque fugiu ali algures da marginal acompanhado de outros tantos magníficos?!!! Que a Deolinda Rodrigues morreu num dia fictício que ninguém sabe qual, mas nada os impediu de transformar um dia qualquer em feriado nacional?!!!! O embuste da história recente de Angola é tão completo e manipulado que até mesmo eles parecem acreditar nas mentiras que inventaram...
Se incomodarmos o sr. engenheiro de qualquer forma, sai a guarda pretoriana dele e nós ficamos quietos a vê-los barrar ruas anarquicamente sem nos deixar alternativas para chegarmos a casa ou aos empregos. O povo especial nem precisa ir trabalhar se resolvem fechar as ruas. Se sairmos para almoçar e eles bloqueiam as ruas sem qualquer explicação, só temos uma hipótese: como povo especial não precisa de comer, dá-se meia volta de barriga vazia e volta-se para o emprego. E isto quando não ficamos horas parados à espera que o sr. engenheiro e sua comitiva recolham aos seus lares e nos deixem, finalmente circular. Entramos em casa às escuras e saímos às escuras. Tomamos banho de caneca. Sim, bem à moda do velho e antigo regime do MPLA-PT do século passado.
Luanda, que ainda resiste a tantos maus-tratos e insiste em conservar os vestígios da sua antiga beleza, agora é violentada pelos chineses. Sodomizada. Sistematicamente. Dia e noite. Está exaurida; de rastos, de cócoras diante dos novos "amigos" do sr. engenheiro. Eles dão-se, inclusive, ao luxo de erguerem dois a três restaurantes chineses numa mesma rua. A ilha do Cabo tem mais restaurantes chineses que qualquer outra rua de qualquer outra cidade ocidental ou africana: CINCO!!!! A China Town instalada em Luanda. As inscrições que colocam nos tapumes das obras em construção, admirem-se, estão escritas na língua deles. Eles são os novos senhores. Os amigos do sr. engenheiro.
A par do Sr. Falcone... A este foi-lhe oferecido um cargo e passaporte diplomático. Aos outros, que andam aos bandos, é-lhes oferecido a carne fresca das nossas meninas. Impunemente. Alegremente. Com o olhar benevolente dos canalhas de fato e gravata. Lá fora, no mundo civilizado sem povos especiais, caçam os pedófilos. Aqui, criam e estimulam pedófilos. Acham graça. Qualidade de vida é coisa que o povo especial nem sabe o que é. Nem quantidade de vida, uma vez que morremos cedo, assim que fazemos 40 anos. Se vivermos mais um pouco, ficamos a dever anos à cova, pois não nos é permitida essa rebeldia. E quem dura mais tempo, é castigado: ou tem parentes que cuidem ou vai para a rua pedir esmola! Importam-se carros.E mais carros. De luxo.
Esta é a imagem de marca deles: carros de luxo em estradas descartáveis, esburacadas. Ah... E telemóveis!!!! Qualquer Prado ou Hummer tem que levar ao volante um elemento com telemóvel. Lá fora, no mundo civilizado sem povos especiais, é proibido o uso do telemóvel enquanto se conduz. Aqui é sinal de status, de vaidade balofa!!!!!!!!!! Pobre povo especial. Sem transportes, sem escolas, sem hospitais. À mercê dos candongueiros, dos "dirigentes" e dos remédios que não existem. Sem perspectivas de futuro. Os nossos "amanhãs" já amanhecem a gemer: de fome, de miséria, de subnutrição, de ignorância, de analfabetismo, de corrupção, de incompetência, de doenças antes erradicadas, de ira contida, de revolta recalcada. O grito está latente. Deixem-no sair: BASTA!!!!!!
As opções do soba T´Chingange
TEMPO COM FRINCHAS – Se bem que nunca me tivessem dito nada eu era "persona non grata"… Tudo devido ao fuinha do delegado sindical…
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Luís Magalhães - Tem uma antiga caneta Parker 21, espacial. Dessas que levam o homem a gatafunhar coisas lindas da Luua, numa Angola que jamais esqueceu e das sequelas …
Quando cheguei a Portugal, o primeiro emprego que arranjei foi numa Fábrica metalúrgica no Porto, Bairro da Pasteleira porque tinha o curso Industrial se bem que a minha arte eram as Artes Gráficas. Aquilo era uma Fábrica com duzentos empregados (…) e, foi num tempo em que havia plenários para tudo e para nada e, era rara a semana em que a gente trabalhava certinho com o horário. Eu, era o único retornado que andava no meio dos "trabalhadores" e como tal era considerado "persona non grata" se bem que nunca me tivessem dito nada porque eu sabia muito bem arreganhar os dentes!
Ora sucede que eu não percebia nada daquilo e deram-me o lugar de condutor do empilhador, um trabalho muito duro porque era pegar na roda e andar todo o dia nas cargas e descargas e se não houvesse trabalho os ditos " trabalhadores" arranjavam-me sempre uma tarefa qualquer e, qual delas a pior. Para mim estava a marimbar-me naquilo uma vez que só estava m compasso de espera até arranjar um emprego para a minha área, o que veio a suceder mais tarde!
Ora, sucede que a Administração da Empresa abriu concurso para Controladores de Qualidade e Fabrico, coisa a que eu concorri só para contrariar; entendi que tinha Habilitações para aquilo e, assim foi! Lá andei no curso (foram dois meses) e, uma vez feitos os testes, deram-me como chumbado para meu espanto diga-se! Pois eu sabia que a malta que andava comigo não conhecia uma letra do tamanho de um burro, nem muito menos o que era uma raiz quadrada.
Fui falar com o delegado Sindical onde mostrei o meu espanto (sem lhe dizer tudo) por ter chumbado ao que ele, com cara de fuinha me respondeu que não se podia ganhar sempre, para não fazer muitas ondas (…)? Disse que queria falar com o Engª responsável e indo até este expus a minha questão. Em resposta foi-me dito que o máximo que me podia fazer (era notório o receio dos ditos "trabalhadores") era dar-me uma relação de quem tinha chumbado e de quem tinha passado. E, Espanto!
Não é que eu estava em primeiro lugar dos aprovados!? Indignado, fui falar com a administração que ao ouvir-me chamou o delegado sindical, esse tal de fuinha que mesmo perante as provas apresentadas olhou para mim e para o Administrador e disse, assim peremtóriamente todo a destilar ódio: Enquanto eu trabalhar nesta Fábrica, não há filho da Puta de retornado algum que mande nos meus Camaradas! A Administração nada disse e, eu ao outro dia apresentei a minha carta de demissão! Estes foram tempos que nos ficaram cravados na carne e que por mais que se seja tolerante a gente desculpa, mas não esquece.
As escolhas do Soba T´Chingange
TEMPOS MORNOS – Com chá, benzo-me na crença de ocultadas caricias num dia igual a tantos outros…
Malamba é a palavra
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Com os bicos de papagaio à solta
Para ocupar o tempo escrevo estas linhas enquanto a Dona Ibib minha mulher de muitos anos, trata dos seus bicos de papagaio no centro de recuperação Ché Lagoense com o credenciado curador de malazengas Ganchinho Rosário, homem de muitas virtudes na prática de torcer as dores. Um curador, que por vezes faz milagres com pedras e barros, água quente da fonte santa e vapores de aromas inebriantes. Com tecnologia de ponta usa aparelhos que dão pica, rosnam e até pulam em corrente alternada mostrando no visor as sinusóides, curvas ou quebradas até chegarem ao cume, apitando ou zunindo o encavalitar das correntes modeladas com as alternadas.
Os raios ultra violetas penetram na derme e epiderme e até mais fundo mordendo ou cicatrizando coisas internas para sei lá, dissolver excrescências, ossos desencaminhados, esses tais de bicos de papagaio ou osteoporose, apêndices que o tempo acumula para desequilibrar a velhice. E vêm as variantes de massagem geotermal, desportiva com reflexologia mais a reabilitação física e a limpeza das veias ferruginosas ou venosas através da linfoterapia e, ou hidrolinfa. Tudo isto homologado por mais de quinze diplomas e medalhas descriminando as muitas estirpes conhecidas que afectam a nossa anatomia.
Para enganar a velhice é-nos sugerido sapatos folgados ou elásticos e ortopédicos, camisas anatómicas, coisas que usamos para encobrir gorduras extras, bochechas engravidadas na forma de celulite, pneu lateral e rugas macilentas. Vem a propósito recordar as muitas coisas que meu tio-avô fazia com chás de carvão de azinho, espargos, rosmaninhos e alecrim, mais as estevas e as flores destas com cardos. Este meu tio Guerra de nome tinha fama em todo o norte das terras lusas, porque tratava com eficácia a dor da ciática.
No adro da igreja vizinha a ele, apinhavam-se magotes de gente idas em carreiras e por ali ficavam até serem atendidos e, depois disso, cavaqueavam dores e falas de seu porvir. Só sei que ele cicatrizava um nervo por detrás da orelha, o mesmo que levava a dor ao cérebro ou cerebelo. De recordar neste procedimento, os truques de acupunctura de nos espetarem uma agulha no dedo grande do pé para fazer passar a dor do ombro, a pontada no pescoço ou desfazer o caroço do sovaco ou até a dor de cotovelo.
São mistérios que só se entendem porque nos fazem bem como os caldos de poejo, os chás de carqueja, as defumações de arruda ou lavagens com malva ou com água esquentada na pequena planta conhecida por calafito. Desses antigos tempos de nenhures, das rodas enjeitadas dos conventos, tudo mudou para coisas mais sofisticadas, avanços necessários com novas leis a subsidiar a morte ou a vida para substituir as papas de milho quente, das compensas da linhaça, do farelo e das ventosas no alívio das dores nas cruzes e das pontadas lombares. Avanço para uns, retrocesso para outros; mas o tempo não se compadece com essas teorias e segue, segue com alegrias, tristezas, angustias num molho de brócolos.
Ilustrações de Costa Araújo
O Soba T´Chingange
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