Sexta-feira, 13 de Janeiro de 2012
T’XIPALA . II

{#emotions_dlg.xa}FÁBRICA DE LETRAS DO KIMBO

        “Mussendo de T´Chingange”   

  Secretária (Popular)

Desconseguindo acompanhar pensamentos alambazados deste mundo, medito por debaixo de uma grande amendoeira no paraíso de Benoni, lugar distante das cacimbadas lembranças dos idos tempos. Nesses tempos de kaparandanda era candengue; descalço pé ante pé, de bitacaia, espreitava os rabos-de-junco que num se calhar iriam poisar no meu pau de bisgo preso ao pé de maboque, nas margens da lagoa. Essa barrente, t´ximpaka de Belas ficava por detrás do aeroporto Craveiro Lopes. Zorba, meu amigo de fedelhice pivete, fintava a sorte no catravés das sombras barulhadas ao som de cigarras calorentas. Ao fim da tarde, já mesmo quase noite, chegávamos a casa lambuzados de liberdade, cheios de caju na mesma gaiola aonde aprisionávamos as celestes, viuvinhas, rabos-de-junco, januários, e mais uma catrefa de pássaros cantadores; aquelas alegrias aprisionadas eram irmãmente divididas entre nós.

 Piriquitos

As nossas gaiolas de quintal, eram um espanto de ver e ouvir; os rabos-de-junco de tanto mamão que comiam, borravam de esguicho, dando-nos trabalho, de mais que chegue p´ra manter tudo vistoso. Nesses tempos idos de candengue-reguila da Maianga as fotografias eram coloridas à mão e, vistas hoje, parecem que saíram dum porão de barco, pintalgadas de cagadelas de moscas e cazumbis de pretos-velhos; escravos escurecidos nos soluços roucos do calabouço. Mais tarde, em pensamentos sombrios, ouvi apitos de navios balouçados no azul do horizonte, botando entrecortado fumo negro com apitos graves e longínquos. Por força das circunstâncias e leis da natureza, cresci camundongo, coisa que me transcendia na condição de mazombo. As estórias do meu pai iam-se dissipando nas águas longínquas do Lucala, um rio que teimosamente foi correndo por debaixo da ponte, numa terra de mesmo nome; recordo de quando ele, meu pai, teve de subir a uma árvore fugido de uma pacassa ferida e enfurecida; e, ele só tinha uma catana para se defender. De chateada a dita cuja, pacassa, acabou por desandar do sítio e ele, meu pai, deu às de vila-diogo até chegar ao acampamento.  

Cardeal

Desconformado na alegria, misturei nos tempos silêncios de guerra mal parida, um misto de valentia lambuzada por vezes a medo e, por direito de cacimbo, paludismo, bitacaia, filaria e demais mazelas, tornei-me T´Chingange. Um feiticeiro do kimbo, pulando projecções na mente com agoiros de olho gordo, chocalhando guizos nas kinambas e coçando grosseiramente as matubas carregadas de flor-do-kongo. Por feitiçaria, desviava influências e provocava chuvas, fazendo me respeitar por feitos temerosos. Desde esse tempo de monangamba, camundongo, mazombo, hoje só recordo do quanto fui alegre nos intervalos das tristezas nessa terra da gozosa. Lutando com a herança natural, removi bloqueios à consciência num perdão e, sem ter lavrado qualquer escritura, estabeleci curriculum virtual; neste livre arbítrio ainda estou muito longe de atingir a plenitude, de alcançar a paz interior. Faço um esforço para ver “Que nada real pode ser ameaçado” e “Que nada real existe”. Busco em realidade os sinais naturais do perdão; dos milagres ou pensamentos dum caminho, para ganhar a libertação do medo.  O ego de cada qual é por demais trabalhoso.

Glossário:

 T’chingange - um misto de feiticeiro, justiceiro, advogado do diabo (de quem se tem medo); kinambas - pernas; candengue - moço, rapaz; Camundongo- natural de Luanda, rato; rabo-de-junco -  pássaro; T’xipala - fotografia (de rosto);gíria de Angola; monangamba - trabalhadores sem classificação especial (perjurativo), moço de rua ); Kimbo – sanzala (planalto central de Angola), povoado; Bisgo: seiva de mulemba que faz de cola forte; Mazombo: filho de colonos; identificado no meio; mussequeiro; Bitacaia: pulga de pé, matacanha; Cazumbi: feitiço; T´ximpaka: lagoa do mato feita para o gado beber; Catrefa: quantidade, conjunto de tarecos ou coisas indistintas; Pacassa: género de búfalo, boi do mato; Catana: facão, faca grande; dar ás de vila-diogo: dar o fora, bazar, fugir por medo; Matubas: testículos; Flor-do-kongo: fungo de pele de dar coceira; Mussendo: estória curta na forma de conto (Angola). Kaparandanda: - Filho de soba feito bandido por rebelião entre 1974 e 1886, tempo de rebeldia.

O Soba T´Chingange     



PUBLICADO POR kimbolagoa às 05:19
LINK DO POST | COMENTAR | ADICIONAR AOS FAVORITOS

Junho 2025
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3
4
5
6
7

8
9
11
12
13
14

15
16
17
18
19
20
21

22
23
24
25
26
27
28

29
30


MAIS SOBRE NÓS
QUEM SOMOS
Temos um Hino, uma Bandeira, uma moeda, temos constituição, temos nobres e plebeus, um soba, um cipaio-mor, um kimbanda e um comendador. Somos uma Instituição independente. As nossas fronteiras são a Globália. Procuramos alcançar as terras do nunca um conjunto de pessoas pertencentes a um reino de fantasia procurando corrrigir realidades do mundo que os rodeia. Neste reino de Manikongo há uma torre. È nesta torre do Zombo que arquivamos os sonhos e aspirações. Neste reino todos são distintos e distinguidos. Todos dão vivas á vida como verdadeiros escuteiros pois, todos se escutam. Se N´Zambi quiser vamos viver 333 anos. O Soba T'chingange
Facebook
Kimbolagoa Lagoa

Criar seu atalho
ARQUIVOS

Junho 2025

Maio 2025

Abril 2025

Março 2025

Fevereiro 2025

Janeiro 2025

Dezembro 2024

Novembro 2024

Outubro 2024

Setembro 2024

Agosto 2024

Julho 2024

Junho 2024

Maio 2024

Abril 2024

Março 2024

Fevereiro 2024

Janeiro 2024

Dezembro 2023

Novembro 2023

Outubro 2023

Setembro 2023

Agosto 2023

Julho 2023

Junho 2023

Maio 2023

Abril 2023

Março 2023

Fevereiro 2023

Janeiro 2023

Dezembro 2022

Novembro 2022

Outubro 2022

Setembro 2022

Agosto 2022

Julho 2022

Junho 2022

Novembro 2021

Outubro 2021

Setembro 2021

Agosto 2021

Julho 2021

Junho 2021

Maio 2021

Abril 2021

Março 2021

Fevereiro 2021

Janeiro 2021

Dezembro 2020

Novembro 2020

Outubro 2020

Setembro 2020

Agosto 2020

Julho 2020

Junho 2020

Maio 2020

Abril 2020

Março 2020

Fevereiro 2020

Janeiro 2020

Dezembro 2019

Novembro 2019

Outubro 2019

Setembro 2019

Agosto 2019

Julho 2019

Junho 2019

Maio 2019

Abril 2019

Março 2019

Fevereiro 2019

Janeiro 2019

Dezembro 2018

Novembro 2018

Outubro 2018

Setembro 2018

Agosto 2018

Julho 2018

Junho 2018

Maio 2018

Abril 2018

Março 2018

Fevereiro 2018

Janeiro 2018

Dezembro 2017

Novembro 2017

Outubro 2017

Agosto 2017

Julho 2017

Junho 2017

Maio 2017

Abril 2017

Março 2017

Fevereiro 2017

Janeiro 2017

Dezembro 2016

Novembro 2016

Outubro 2016

Setembro 2016

Agosto 2016

Julho 2016

Junho 2016

Maio 2016

Abril 2016

Março 2016

Fevereiro 2016

Janeiro 2016

Dezembro 2015

Novembro 2015

Outubro 2015

Setembro 2015

Agosto 2015

Julho 2015

Junho 2015

Maio 2015

Abril 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Fevereiro 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Setembro 2013

Agosto 2013

Julho 2013

Junho 2013

Maio 2013

Abril 2013

Março 2013

Fevereiro 2013

Janeiro 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Julho 2012

Junho 2012

Maio 2012

Abril 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Janeiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

Abril 2009

Março 2009

Fevereiro 2009

Janeiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

Outubro 2008

Setembro 2008

Agosto 2008

Julho 2008

Junho 2008

Maio 2008

TAGS

todas as tags

LINKS
PESQUISE NESTE BLOG
 
blogs SAPO
subscrever feeds
Em destaque no SAPO Blogs
pub