ANGOLA DOS MWENE-PUTO
MAIANGA - Tempos de FANTASMA - Crónica 3384 – 06.05.2023
Por:T´Chingange (Otchingandji) – Na Pajuçara de Maceió - Brasil
Marianita e Pombinha - Com um jeito de riso mole, Pombinha, com sua preguiçosa lealdade, pedia a Marianita algo que despertou em mim uma total curiosidade. Quero que você me dê um feitiço para prender meu homem! Disse ela. Com um saco de sisal cheio de capim seco fazendo de travesseiro que, esperava a quitandeira que sabia ir passar por ali a vender maças-da-índia enquanto lia achaparrado nos refolhos dos loandos, mesmo ao lado da venda do Senhor Cruz as comiquitas de Mandrake e seu auxiliar gigante, o negro Lohtar.
Ali estava eu, dissimulado e despercebido ouvindo com curiosidade as falas das duas amigas. Aquelas mulatas sacudidas em assanhamento, fumegavam num cheiro de suas roupas, prazer de fogo fervente refogado de mocotó fresco. Pelas frestas das aduelas, podia ver seus torneados pés morenos enfiados em chinelos coloridos que quase iguais, só diferiam nas flores; uma era nitidamente uma hortense e a outra quase jurava ser uma flor-de-lis.
Espevitado na curiosidade, espreitando mais acima nas frestas das aduelas de barril do vinho do m´puto, pude ver melhor o perfil de Pombinha. Tinha um farto cabelo, tipo juba de leoa, crespo com um molho de manjericão seguro de lado por um gancho a imitar uma joaninha; aquilo deu-me uma sensação e odor sensual de trevos verdes e caxinde com outras plantas aromáticas.
Pela conversa entendi que Marianita não queria cativeiro prolongado com homem nenhum porque a dada altura protestou! Casar, eu? Para quê? Um marido é pior que o diabo! Pensa logo em escravizar a gente! Deu para entender que a cafuza Marianita no delírio de enriquecer, adornou-se de todo à labutação de amigar com homem; homem que dispusesse de algum pecúlio ou patrimónios de baús de couros trabalhados com tachas de ouro ou até prata.
Pombinha, babada de amores anotou como fazer um chá de pulgas saltitantes à mistura com brututo e urtigas apanhadas na kúkia do sol nascente num dia de intenso cacimbo e, após uma noite com lua de quarto crescente. Comprometido pelos ouvidos, eu, que por ali estava lendo um livro de bolso de cowboyadas no remanso da solidão, como sombra, esgueirei-me quase rastejando para o capinzal dos fundos da venda. Por algum tempo, ali me mantive dissimulado em um tufo de bananeiras e, foi quando um meu vizinho de nome Alex, o travesti do choupal, amaneirando-se, dirigiu um bom dia àquelas damas e, lá foi botando cheiro de madressilvas na direcção da paragem do maximbombo número três, na rua da Maianga.
As duas, pelo adiantado da hora, ficaram comentando o tardio cumprimento, do porte de bichinha, louro e esbelto homem. Um desperdício! Remata a assanhada Marianita. Era normal encontrar-me ali com Rente, filho do senhor Cruz, Braga, Chiquito, Zorba, Guerra, Necas e o Almeida, mulato do cortiço das Vacas bem perto da oficina de tornos do Paulino Branco, um futura meu cunhado.
Era ali que desfolhávamos avidamente os livros de quadradinhos do homem de borracha, do Fantasma, do Tarzam e Lampião mas, nem eles nem a quitandeira das maças-da-índia surgiram naquela biblioteca de aduelas, ao ar-livre do Rente Cruz. É sempre emocionante ler as mokandas de amigos mesmo que tenham nomes estranhos como N`dapandúla, nas falas genuínas dum kamba dum Rio Seco! Dum Rio que só o é na lembrança antiga que até tinha areia sem cacos velhos.
E, um amigo sempre tem missangas para enviar, por apitos ou estalidos ou mesmo muxoxos com uma máquina de fazer “alegria” para comemorar os kambas que cada qual tem; essa máquina é capaz de produzir arco-íris pra deslumbrar cazumbis mas, também duplos e triplos, e até alguns invertidos ou enrolados nas pontas para animar banga ninita. Até posso desvendar que o último protótipo é parecido com uma foice! Quero sim venerar meu culto crente, sem coisas desatinadas dos dias comuns do Malhoas antigo pois, sempre haverá um amigo que me vai tentar convencer que sushi é a melhor comida do mundo!
O Soba T´Chingange
CONHECER MELHOR O BRASIL – ALFORRIA
2ª Parte - Crónica 3381 - N´Guzu é força (Kimbundo) – 03.05.2023
Por T´Chingange (Otchingandji) – Na Pajuçara de Maceió
Pois então, havia as alforrias concedidas pela Coroa a seus próprios escravos, sobretudo pela lei de 11 de Agosto de 1837 que tornou mais fácil a compra da liberdade e da emancipação dos escravos das fazendas, que ocorreu em 1866. Os escravos que tinham mais hipótese de conseguir alforria, viviam nas cidades ou exerciam funções domésticas com relações estreitas com a família de seus senhores ou socialmente, com outos escravos libertos.
Sobrepunha-se a isto, a constituição de vínculos familiares dentro ou fora do cativeiro, que muitas vezes, resultava na libertação de mulheres e crianças, por conta do pagamento de seus valores por cônjuges e pais. Era por isso, muito maior a dádiva de libertação a mulheres. De facto, mulatos e pardos (termo oficial para definir uma pessoa multirracial no Brasil), tinham mais possibilidades de libertação do que os escravos negros e as mulheres, sempre tinham mais possibilidades de consegui-la do que os homens.
E, principalmente porque em cidades como o Rio de Janeiro e São Salvador, perfazendo 60% do conjunto de libertos, embora só 40% fossem escravos. Muitos desses libertos eram Africanos habituados ao trabalho braçal, em mercados e nas profissões urbanas, portanto mais aptos a acumular pecúlio para poder comprar sua liberdade ou negociar uma alforria condicional. Embora as alforrias tenham ocorrido em todo o território nacional e ao longo de todo o século XIX, a forma de como era conseguida e a maior ou menos possibilidade de obtê-la, variou muito conforme a época e o local…
Na Corte, por exemplo, cerca de 20% da população era composta de libertos em 1799; em 1834, a proporção era já de 6%, chegando a cair em 1849 para 5%; isto deve-se a que ao longo do século, as possibilidades para a obtenção de alforrias mais comuns, como a compra da liberdade e a prestação de serviços, tornaram-se mais restritas na medida em que eram tomadas providências para restringir o tráfico atlântico de cativos, abolido em 1850.
Uma das principais consequências da política de restrição ao tráfico foi o aumento do preço dos escravos que triplicou entre 1840 e 1860, dificultando a estes, acumularem seu próprio valor, especialmente se fossem homens adultos, os mais valorizados. Por essa razão, somente até cerca de 1850, predominaram as alforrias compradas, desde esse então e, cada vez mais raras seguidas pelas condicionantes e pelas gratuitas, concedidas sobretudo a crianças mas, também a idosos.
Porem, depois de 1850, o número absoluto de libertos, começou a aumentar no Brasil tanto por causa da intervenção do governo na abolição do tráfico e na promulgação de leis emancipacionistas, quanto por conta da própria acção dos escravos que começaram a questionar do poder moral de seu senhores. Até então, embora fosse de interesse fundamental dos escravos, a alforria também exercia uma função importante para os senhores que por meio dela, controlavam seus cativos obrigando-os a anos de serviço obediente, em troca da concessão da futura liberdade.
A alforria exercia papel central na ideologia senhorial, representando segundo Hebe Martos “o principal recurso moral dos senhores na efectivação da denominação esclavagista” por via de erros cometidos na história. Na descrição destes muitos pormenores tão cheios de amarguras, tanto descaminho e desgraça relembro que quando o almirante holandês da Companhia das Índias Ocidentais tomou Luanda de N´Gola aos Tugas, estes fugiram para Massangano, e por ali permaneceram durante a ocupação, até à chegada do luso-brasileiro Salvador Correia de Sá e Benevides, que reconquistou a Fortaleza de S. Miguel, na baía de Luanda em 1648.
Nesta onda do tempo e do outro lado do Atlântico, vim a saber que a construção daquele forte de Massangano tinha para além da natural defesa das redes comerciais de mercadorias tais como cera, peles, dentes de marfim, pedras preciosas, mas, e especialmente da venda de escravos às Américas, aos engenhos de açúcar do Brasil para além de também o ser, lugar de prisão para criminosos saídos da metrópole, o M´Puto e do Brasil; os chamados degradados. José Alvares Maciel era um dos nomes de entre aqueles degredados que veio mais tarde a ser solto para divagar como pombeiro (vendedor ambulante) nos matos da Matamba de N´Gola e, acabando por morrer lá para os lados de N´Dalatando, deixando uma prole de filhos com o nome de Alvares.
Ilustrações de Pombinho da EIL da Luua
(Continua…)
O Soba T´Chingange
FÁBRICA DE LETRAS DA KIZOMBA – “SONHAJANDO A VIDA”
Metáforas com ALGORITMOS - Crónica 3380 – 01.05.2023
PAJUÇARA - Em Maceió como Zelador-Mor do Zumbi de N´Gola…
Por: T´Chingange (Otchingandji)
As metáforas, ajudam a expressar conceitos abstractos de maneira que se entendam com mais facilidade. Só que, por vezes são tão poderosas que nos levam a algo desconhecido como o buraco negro do qual ainda temos bastante para conhecer e entender. O mundo das plataformas de comunicação digital está cheio disso, dos algoritmos, porque funcionam frente a temas tecnológicos difíceis.
Um exemplo, que pode ser menos agressivo que uma nuvem de algodão em uma nuvem útil. Aí é onde as plataformas nos pedem que guardemos copias do que fazemos, um lugar acolhedor, mas, obviamente, o que nos estão dizendo, é em verdade um conjunto de aplicações que essas entidades estão criando para que todos os nossos arquivos fiquem alojados em suas gigantescas gavetas de servidores, de modo a que possam fazer actuar os algoritmos desenhados ou formatados por essas mesmas empresas.
O objectivo real é obter milhares de milhões de dados para uso comercial ou para fins políticos em campanhas ou até eleições, forçando os instrumentos a seguir suas mecânicas previamente balizadas em suas directivas; uma nítida adulteração a regras de transparência a que, democraticamente são chamadas de fraude. Não transijam, os responsáveis das plataformas são magníficos criadores de metáforas que deturpam o nosso rumo e nossa mente sem deixar rasto…
Pude ser informado por uma recente literatura que a constituição do algoritmo, supostamente, adverte-nos sobre a necessidade de se actuar no mundo digital, para que haja compatibilidade de nossos direitos de cidadania nos sistemas constitucionais. A instrumentalização dos algoritmos que desenham ou esboçam problemas constitucionais por um modo de viés, tanto em sua utilização como em seu próprio desenho originam uma plena incidência sobre direitos fundamentais dos cidadãos.
O problema também é bem polémico quando se formaliza o uso desses algoritmos na administração pública. Dir-se-á ser óbvio seu uso porque facilita enormemente o trabalho o que parece acentuar a objectividade de se tomarem decisões e, porque sempre se abrirá uma interrogação sobre se o serão, uma fonte de direito. Em qualquer caso exigiria decidir se matematicamente realizam as funções assertivas.
O Facebook, por exemplo, fez frente às queixas dos usuários que pediam uma certa moderação em seus conteúdos criando para o efeito uma Junta de Supervisão que se encarregará de analisar essas queixas mas?!… Como se conhece popularmente a essa Junta!?... Como uma “Corte Suprema” do Facebook! Que é que pode despertar mais respeito do que um Tribunal Supremo?! La empresa ficará até encantada, noé!?. Mas o Facebook, ainda que pareça, não é um Estado, felizmente.
Levamos anos falando de uma prodigiosa, utilíssima e revolucionaria Inteligência artificial (IA), máquinas com capacidade de aprender e de elaborar processos inteligentes por si, próprias. Inteligência artificial é também uma metáfora maravilhosa: não dá a entender em nenhum momento que esteja exigindo que centenas de milhões de pessoas se dediquem horas y horas a fio, em países pobres, ao aborrecido trabalho de colocar as etiquetas que essas máquinas possam reconhecer.
Depois do dito supra, segue-se sem haver consciência clara da necessidade de proteger directamente os direitos fundamentais, tal como se configura na Constituição. E, isto é válido para todos os países do Mundo. Durante anos observamos com alegria o como alguns jovens empreendedores davam, uma bola, vendendo por quantidades superbilionárias suas inovadoras empresas a essas grandes corporações. Era pois, a metáfora perfeita do êxito, mas essas brilhantes aquisições.
Francisco Balaguer, Catedrático de Direito Constitucional na Universidade de Granada, afirmou que as Constituições, deveriam ser submetidos por modo a dar garantias ao cidadão. Então, que se pode fazer às Constituições Nacionais para evitar lesões graves em direitos básicos? A esta pergunta o professor afirmou: Até agora tem-se feito bem pouco; entre outras coisas, pela natureza contractual da relação entre as companhias que oferecem seus serviços e seus usuários. A tendência será por agora, intervir em essas questões, não em defesa de direitos constitucionais, mas sim dos direitos do consumidor com a protecção de dados. Esse será o caminho que marcará a inovadora e interessante normativa europeia sobre o tema…
Nota: Há alguns detalhes extraídos de uma crónica de “El Pais” – Espanha.
O Soba T´Chingange
CONHECER MELHOR O BRASIL – ALFORRIA
1ª Parte - Crónica 3379 - N´Guzu é força (Kimbundo) – 29.04.2023
Por T´Chingange (Otchingandji) – Na Pajuçara de Maceió
Ao longo do século XIX, no Brasil, várias foram as diligências buscadas pelos escravos para conseguir sua liberdade. Muitos tentaram a fuga refugiando-se em quilombos. O sonho da liberdade não se desvanecia, contudo a fuga do engenho, seu normal lugar de trabalho, só era possível em direcção ao agreste e depois sertão. Quase sempre os escravos fujões, voltavam ao engenho, normalmente ao fim de alguns dias, debilitados e até feridos pelas dentadas dos cães de fila que acompanhavam o guardas nas buscas. Vinham carregados de ferros!
Regressados ao engenho, eram submetidos a castigos no tronco. Eram chicoteados e por vezes ou quase sempre era-lhes aplicado um ferro em brasa na cara gravando-lhes um “F” de fugitivo. Os que não regressavam eram possivelmente capturados pelos índios selvagens e, nalguns casos, certamente comidos. Todos eles se interrogavam por muitas vezes sobre qual seria a situação do seu reino do outro lado da kalunga. Sempre que chegavam novos escravos ao engenho, procuravam saber por eles, notícias da Matamba, do seu Kongo de N´Dongo.
Mas, nem sempre obtinham os resultados desejados, pois que ou eram de Minas, gente do Zaire, Benim ou Muçulmanos e, muito raramente da sua etnia. Assim, metidos num atoleiro aparecia o capataz, um encorpado mulato mazombo que por via deste empate e quebra no rendimento, logo o ameaçava levar ao pelourinho, o tal tronco das calamidades. Alguns até obtinham sucesso, escondendo-se nas cidades; outros participavam em rebeliões e alguns optavam por saídas mais drásticas assassinando senhores, feitores ou cometendo seu suicídio.
Mas, um grande número obteve a liberdade pela via institucional, por meio de formas de libertação previstas em lei legitimadas pela sociedade que geria as alforrias. Assim como no período Colonial, antes de 1822, ano do início do Brasil Imperial, os veículos legais de alforria eram a “carta de liberdade ou alforria”, registada em cartório, o registo de baptismo em que o senhor libertava a criança, a denominada “alforria na pia”, a disposição testamentária do senhor ou de um seu representante legal ou por procuração.
A alforria poderia ser de dois tipos: a gratuita ou a incondicional. Nesta última, quando o senhor dono dava a seu escravo carta de liberdade que doravante, como se dizia então e, que passava a dispor de si e do seu tempo como bem entendesse; também da compra da alforria, quando escravos ou terceiros interessados em sua liberdade, pagavam determinada quantia aos senhores pela troca; da restrição em que se condiciona ao escravo um tempo determinado para trabalhar por sua conta e assim, perfazer o valor previamente estipulado.
A alforria condicional, pressupunha a prestação de serviço ao senhor por tempo alternado ou até à morte deste. Um dos problemas causados pela concessão desses dois últimos tipos de alforria, era a definição jurídica dos filhos das mulheres libertadas condicionalmente ou, pela coarctação, pois havia os que entendiam que elas ficavam livres, desde que se estabelecessem condições para a liberdade, enquanto outros, defendiam que as mulheres só ficariam libertas de facto e, com elas o seu ventre ao receber sua carta de alforria.
Teoricamente, todas as alforrias podiam ser revogadas caso houvesse ingratidão, por parte dos escravos, possibilidade que se foi tornando remota ao longo do tempo e, não mais admitida a partir do ano de 1860. Para além dessas alforrias concedidas de comum acordo entre o senhor e o escravo, havia outra cuja libertação era concedida contra a vontade do senhor.
Em primeiro lugar, a liberdade obtida por meio de acções judiciais quando os escravos procuravam a justiça reclamando escravidões ilegais, ou argumentar que seus senhores haviam descumprido acordos previamente estabelecidos. Em segundo lugar, as alforrias mediante serviços militares, nas quais escravos fujões, procuravam o exército A fim de servir como soldados e, assim conseguir a tão almejada carta de alforria ou pelo simples recrutamento para as fileiras por via de guerras em curso. Esta prática da instituição militar foi exercida na Guerra do Paraguai.
(Continua…)
O Soba T´Chingange
FÁBRICA DE LETRAS DA KIZOMBA – “SONHAJANDO A VIDA”
Crónica 3378 – 29.04.2023 - PAJUÇARA - Em Maceió como Zelador-Mor do Zumbi de N´Gola…
Por T´Chingange (Otchingandji) – Na da Ponta Verde de Maceió
O boi, está entre os animais mais infelizes do planeta terra. Contemporaneamente, um vitelo em uma exploração industrial de carne, logo depois do nascimento, é separado da mãe e trancado numa jaula minúscula, pouco maior do que seu próprio corpo. Passará ali toda a sua vida, em média, cerca de quatro meses.
Nunca deixa a jaula nem lhe é permitido brincar com outros vitelos ou mesmo andar. E, para que os músculos não se tornem demasiado fortes – músculos fracos, significará que a carne fica mais macia e suculenta. A primeira vez que o vitelo tem uma hipótese de andar, esticar os músculos e tocar noutros vitelos é a caminho do matadouro.
Em termos evolutivos, o gado bovino representa uma das espécies animais mais bem-sucedidas no respeitante à sua evolução. Deveria ser assim mas, está entre os animais mais infelizes do globo. Tudo o aqui descrito, provem de uma forma de dizer, uma linguagem que nem sempre o é eficientemente comedida por obedecer a uma fórmula baseada em factos demonstráveis.
Depois, com as metáforas damos arranjo à justificação para tudo. E, se nós de repente fossemos vistos e tratados como bois, no criar normas de como acabar os dias, regularizar a morte pela eutanásia, a vida pelo uso do desagravo ao aborto, fazer conferências de conhecimento usando palavras mais carregadas de sentido por supostos especialistas ou científicos.
Obrigarem-nos a substituir a lei natural, a que nos foi legada pela natureza com Deus no topo da pirâmide ou hierarquia do entendimento. Tudo se torna muito complicado com derivações no culto da mentira e, sabendo de antemão que não sabemos tudo acerca de nós próprios. Este mundo de celebridades, da futilidade da bisbilhotice, romances e falta de justiça com negócio de assinaturas…
Também um estado cada vez mais estado, cuidando das regras, ajustando e regulando as leis a seu contento e dando origem a prescrições a contento de suas vontades ou pancadas ideológicas. Como todos podem verificar, andam a retirar-nos a capacidade de sobrevivência de grupo, deturpando e dividindo-nos na via normal de raciocínio.
Se os deuses da tradição grega da antiguidade estivessem a observar-nos, olhariam decerto para o erro humano, do mesmo modo que o fizeram em relação às comédias e às tragédias. Sim! Que diriam esses nossos antepassados ao observar nossas fraquezas, nossas muitas falhais que nos deixam constrangidos.
Do como somos orientados por governantes de alto coturno, do topo da hierarquia, a tomar atitudes que fazem de nós gatinhos, sempre jovens, a balouçar, correndo e saltando atrás de um novelo de fio que se arrasta pelo chão. Bem! Nesta crónica sempre é melhor ser gato que boi! Não é boiada!?
O Soba T´Chingange
CONHECER MELHOR O BRASIL – QUEM FOI BAQUAQUA
1ª Parte - Crónica 3375 - N´Guzu é força (Kimbundo) – 25.04.2023
Por T´Chingange (Otchingandji) – Na Pajuçara de Maceió
Hoje irei contar em primeiro episódio o que foi a vida de um escravo entre muitos mais, muçulmano de nascimento, que se libertou do esquecimento por via de ter escrito sua biografia. Sendo assim começo pelo princípio. Seu nome era de Mahommah Gardo Baquaqua que porque se autobiografou, podemos hoje reconstruir sua trajectória, com detalhes desde sua captura em África até à sua ida para Inglaterra.
Baquaqua, passando pelo cativeiro no Brasil descreve diversos aspectos de sua captura em sua terra natal, a cidade de Djougou no interior de Benim. Convém recordar que Benim é um pequeno país situado no Golfo da Guiné encravado entre a Nigéria, o Gana e Burkina Faso. A economia mundial de então, facilitou que se estabelecessem, na costa denominada de Costa dos Escravos, entrepostos comerciais de ingleses, dinamarqueses, portugueses e franceses.
Aquele interposto comercial ficava situado entre Asante e o Califado de Sokoto. Baquaqua, deu-nos a conhecer a forma de governo, da religião, dos costumes, sistemas de alambamento (casamento), procedimentos fúnebres e até economia. Não virá mal ao mundo dar a conhecer os rascunhos dele, membro de uma família muçulmana de comerciante, cursou a escola corãnica e participou de caravanas comerciais sendo capturado pelo exército Ashanta; foi resgatado por seu irmão mas, caiu de novo prisioneiro, sendo enviado a Ouidah no início de 1845; exactamente cem anos antes do meu nascimento.
Foi aí vendido ao Brasil para um engenho de Pernambuco. E, estando já na recta final do tráfico negreiro, então muito combatido por Ingleses e um crescendo de abolicionistas. Nesse mesmo ano seria decretada a Bill Aberdeen, a mais expressiva das leis anti tráfico. Sua vida de escravo no Brasil, que durou três anos e após a travessia do Atlântico nas insalubres condições no porão do navio negreiro, foi comprado por um traficante que o levou até o interior de Pernambuco, vendendo-o depois a um padeiro.
Padeiro que era um “patife com feições humanas”, segundo sua descrição. Recebeu nesse porém o nome de José da Costa (só faltou o Lopes para ser meu irmão de verdade…). O aprendizado em fazer pão, amassador de farinha, deu-se na base de surras de porrada e chicotadas, resultando em uma constante insubordinação como é evidente.
Fugiu por várias vezes e até pensou em matar o seu senhor; em dado momento embriagou-se e tentou o suicídio, que lhe valeu ser vendido a um traficante que o revendeu em seguida a um comandante de navio mercantil. E, do porto de Rio de Janeiro, fez viagens para o sul do Brasil sempre sujeito a surras de pancada com chibatadas.
Na autobiografia, descreve esse período em linguagem muito próxima à do discurso abolicionista, de que só posteriormente tomaria consciência. Em 1847, o navio partiu para os Estados Unidos com carregamento de café. Baquaqua, relatou a alegria que sentiu quando soube que ia para uma terra aonde não havia escravidão! Sabe-se da história que nos Estados Unidos não havia assim essa total liberdade. Lembrar a Ku Klux Klan, da roupa macabra, uma organização terrorista que surgiu nos Estados Unidos, no século XIX, e ficou marcada por ser a maior organização do tipo na história desse país.
No contexto em que foi criada, essa organização perseguia negros libertos e pessoas que apoiavam a concessão de maiores direitos aos negros no sul dos Estados Unidos e, que chegou a contar com quatro milhões de membros em meados da década de 1920. Quando Baquaqua descreveu aquela terra como libre, referia-se a NewYork, mas não foi assim tão simples. Membros da Vigilante Society, consideraram que havia escravos ilegais a bordo do navio pelo que iniciaram uma quezília judicial…
(Continua…)
O Soba T´Chingange
A NUDEZ DA VIDA – MULOLAS DO TEMPO 34
- O MUNDO ESTÁ ENGRAVIDADO DE PROMESSAS...
Crónica 3374 - 24.04.2023 na Pajuçara de Maceió
Por T'Chingange – (Otchingandji)
Eufemismo, é a maneira de falar pouco clara para confundir a realidade de um facto, adulterando a realidade - ideia de não falar claro e simples para ver se as pessoas não entendem. Talqualmente, uma expressão que suaviza também o sentido reduzindo sua carga negativa como o dizer-se que alguém está já vivendo no reino da glória em vez de dizer que aquela tal pessoa morreu. Por isso digo para alguém que complica: Diga logo quem morreu! Deixe-se de trololós …
A inconfidência, por outras nuances é a falta de lealdade para com alguém indo mais além do eufemismo por ser ou parecer uma mentira camuflada. Pode bem ser uma forma de expressão para com alguém mas que normalmente é o estado ou o representante de uma soberania. Tudo são sofismas na forma de falácia e, associei aqui uma coisa com a outra complicando-me o lado racional e porque uma grande parte dos líderes mundiais actuais, usam esta forma para baralhar-nos…
Pensando nas quenturas da vida com ou sem atrito escorregado, sentado sobre meu silêncio num corrido banco de ripas, volvidos uns bons quinze minutos e, olhando o pisca-pisca do farol da Ponta dos Corais bem no meio do recife, desperto a um chamamento de um já homem simplório nos procedimentos e sem feição dum aparente mal, dirige-me a palavra sem um mais nem um porquê: O senhor está bem? Sim! Respondi que estou! E, de novo perguntou: O senhor está com Deus?
E de novo respondi que sim, até no intuito de evitar delongas em desconformidades. Ao invés de me fazer uma nova pergunta, estendeu-me a mão e, dei-lhe a minha em cumprimento integral, com os cinco dedos. Assim e do nada o silêncio voltou em pensamento calado, qual seria o mal deste já senhor. Deduzi que o casal próximo seriam ou seus pais ou seus avós pois que insistiam ser já horas de tomar os remédios e para tal teriam de voltar para casa. Pacientemente insistiam perante a teimosa vontade de ver a maré secar e poder ii até o farol bem no meio dos recifes , já noite feita…
E, perante tanta teimosia e azedume num vamos que vamos, um rapaz feito homem ou o inverso disto – quero ir ao farol! Por ali ficaram nesta periclitante diversão Saí para regressar pensando cá para mim que aquele mal seria uma anomalia do género do cromossomo 21 que causa um progressivo atrofiamento intelectual ou outra qualquer anomalia no desenvolvimento citogenético, o que conhecemos por síndroma de Dawn ou então uma já adiantada esquizofrenia.
E, porque já sofri uns bons sessenta dias andando com alguém com esta suposta doença invisível, atravessando áfrica, cenas de “Paracuca”, posso apreciar a calma necessária, que eu não tive, para suportar um destino de amizade que acabou em Johannesburg, graças a Deus. Pois assim é, assim foi! A escassos quilómetros de Nelspruit de Mpumalanga havia em tempos, gente refugiada nas grutas que tinham um kazumbi tão forte que até guardavam a morte no sovaco. O último senão foi com a recusa peremptória de irmos até às grutas de Sudwala Caves. A negativa foi peremptoriamente muxoxada em edecéteras – ali não havia bichos! Ponto final.
Mas e porque já lá tinha ido posso lembrar. Bem! Quando lá entrei, uns anos antes desta peripécia havia realmente um forte cheiro a catinga. Catinga que já cheirava a cadáver mas aquilo eram estromatólitos colados ao tecto, um pouco diferente das estalactites ou estalagmites. Mas o certo é que havia sim, uma imagem em um grande salão com o nome de Nossa Senhora da Muxima. Para uns já era de Lourdes e para outros de Nossa Senhora de Fátima. Bem! Descrevo isto porque fui lá. Ele, o “melhor condutor de áfrica” não me quis como cicerone… Foi o ponto final…
Esta crónica seria a ultima da série “Paracuca” mas, desta feita vai ficar assim em moamba que é o nome de uma comida típica angolana mas, e aqui no Brasil é termo conhecido como algo feito à margem da lei, coisa duvidosa própria de um candongueiro. Bom! Para dar término ao tema esquizofrenia direi que as causas exactas da esquizofrenia não são conhecidas, mas uma combinação de factores, como genética, ambiente, estrutura e químicas cerebrais alteradas, que podem influenciar neste mal. Ela, a esquizofrenia é caracterizada por pensamentos ou experiências que parecem não ter contacto com a realidade, fala ou comportamento desorganizado e participação reduzida nas actividades cotidianas. O tratamento costuma ser necessário por toda a vida e geralmente envolve uma combinação de medicamentos, psicoterapia e serviços de cuidados especializados. (Esta, seria em verdade a última PARACUCA . LXIII, das MULOLAS DO TEMPO 34 . Cinco anos depois do caso…)
O Soba T´Chingange
TEMPO DE FRINCHAS – Pajuçara
Crónica 3373 - 20.04.2023 – Havia carros de churros, camelós vendendo nuvens de açúcar e cozinhas volantes de acarajé …
CAZUMBI: É feitiço…
Por Soba T´Chingange (Otchingandji) - Na Pajuçara de Maceió
No último domingo percorri a pé o espaço de calçadão entre os Sete Coqueiros e a Ponta dos Corais da Ponta Verde, lugar conhecido antigamente como o Gogo da Ema, lugar aonde gerações de gente iam fazer camping no espigão de areia com muitos coqueiros sendo um deles retorcido e, que deu origem a este nome. O Coqueiro, morreu faz tempo mas, naquele seu lugar fiou um monumento moderno a recordar o seu retorcido desenho.
A Ponta dos Corais está assente em uma já existente estrutura aonde funcionava um clube náutico, ficando bem ao lado do farol que avisa a navegação dos perigos de ali arribar; Farol que assenta no início do recife que forma a piscina natural da Pajuçara indo até ao Poto do Jaraguá. Este percurso estava apinhado de gente que por ali foi acampando entre a água e o asfalta da via da orla impedida ao trânsito. Havia carros de churros, de gente ambulante vendendo desde farrapos de nuvens de açúcar, o acarajé de cheiro forte a óleo de palpa, dendém.
E havia caixas térmicas de isopor carregadas de cerveja frias levadas por cada qual, carros a vender espigas cozidas de milho e pasteis vários e espetadas de corações de galináceo ou muelas. Uma feira sem o ser aonde uns andavam de patinetes, havia bicicletas, carrinhos com bebes, gente ouvindo musica ou dançando e outros só sentados a receber o vento fresco do mar, vendo os outros ou a maré com cheiro de algas. Os camelós eram muitos e até usavam luvas no manuseio dos paus e guardanapos. Também havia sorvetes e açaí entre outros que se borrifavam de skol cerveja nas bordas das pistas verdes ou vermelhas para peões e bicicletas.
Uma azáfama barulhada em conversas, gritos de ais e uis e, com rádios vomitando musica a gosto. No regresso e já noite passei pelo quiosque da Pedra Virada com música ao vivo, pela barraca do Pirata com animação dum grupo forro, no quiosque da Lopana com música de aguçar vontades e também na barraca quiosque Kanoa com a animação ao rubro. Não houve tempo para me sentar a apreciar os jogadores de FutVolei e, ali permanecer meus minutos de silêncio. Era por assim dizer tudo junto um forro pé de maré; isto é Brasil, gente!
Agora que passo estes memorandos a limpo, cheguei à quarta-feira; o tempo correu aproximando-me do feriado de vinte e um a recordar que de novo vai haver esta azáfama, uma cortição permanente bem ao jeito brasileiro porque um feriado à sexta-feira é pela certa um fim-de-semana alargado. Pois é, dia 21 é dia de “Tiradentes” – feriado que faz alusão à morte do mineiro mais conhecido na história por Joaquim José da Silva Xavier.
As vidas são assim, intemporais e fui ao ano de 1790 chamado desde a vila de São Vicente observar revoltosos capitaneados por Joaquim José da Silva Xavier, conhecido pela alcunha de Tiradentes. Reclamavam contra o pesado pagamento de um tributo em ouro cobrado aos mineiros brasileiros pela coroa portuguesa e, vai daí e para exemplo, enforcaram o Alferes por liderar aquela insurreição. Em verdade era um militar às ordens régias; verdadeiramente era um funcionário do reino de Portugal.
O curioso disto são os contornos que dão às conjuras para aproveitamento político e, vai daí o pobre alferes viu-se metido em alhadas pelos ideólogos políticos que conjugaram o facto, tal como sendo uma revolta a favor da independência do Estado de Minas Gerais. A tal revolta, quase uma inventação a que chamaram de Inconfidência Mineira. Reinava então a rainha D. Maria I e, ainda estou para saber por que carga de água, me escolhi como nomeado para lembrar isto, quando um sargento ou cabo-de-guerra o poderia fazer sem algum transtorno para a administração.
Construindo história na fantasia e utopia, a nação Brasil, aparece ao mundo como justa, fraterna com um futuro a trote, senhores duma cultura diversificada; o Brasil está condenado a ser uma civilização original e rica até aos carnavais do terceiro milénio. A terra “em que se plantando, tudo dá”, uma quase profecia do cronista Vaz de Caminha, que se tornou na graça de Deus, um povo mestiço na carne e no espírito, sua maior valia. Brasil de românticos escritores como Machado de Assis e Jorge Amado e a gente de veredas de Graciliano, do vasto sertão tendo como modo de justiça e vida a vingança açoitada com as próprias mãos na lei do cangaço; do Lampião fazendo poeira nas cavalgadas e, suas rezas nas preces do padre Cícero de Juazeiro seu “paínho” com os bailes ferfumados, com as histórias de dizer: -“Deus mesmo, se vier, que venha armado!”.
O Soba T´Chingange
MULOLAS DO TEMPO – NA PAJUÇARA DO BRASI. Milagres da vida com talassoterapia …
Crónica 3369 de 16.04.2023 - Com farrapos de imagens de *candengue na *LUUA
PorT´Chingange (Otchingandji) em Maceió das Alagoas
Estando hoje longe no tempo, uns setenta anos atrás, com 7anos de idade pude assistir a um milagre lento. Um amigo chamado Álvaro, paralítico, pouco a pouco começou a andar como se fosse um robot nos primeiros anos mas, depois, já sem apoio e com as pernas esticadas, começou a andar; com algumas dificuldades mas, andando. De uma cadeira de rodas passou a ser quase auto-suficiente e, por este motivo, acho que o banho de mar nas primeiras horas da manhã faz acontecer maravilhas a nossos ossos. Para sobreviver à vida depois da guerra de 39 a 45 meu pai Manel resolveu sair daquela terra de frios do M´Puto, tendo chegado à Luua de N´Gola levado pelo velho vapor Mouzinho de Albuquerque.
A Dona Arminda minha mãe, algum tempo depois e, após ter recebido carta de chamada, saiu do M´Puto vertendo choros no cais de Alcântara. Da amurada daquele vapor com o nome de Uíge, pouco a pouco via Lisboa e o Tejo ficarem lá longe tapados pela neblina. Dito e feito! Ele, meu pai, estava cansado de explorar volfrâmio para enrijar os canhões de Hitler, de cavar as terras dum sítio chamado Cornelho, duma Pereira e um Vinagre, lugares vistosos de verde que no correr do tempo ficaram silvas e tojos pelo abandono. Muito mais tarde apreciei a beleza que ele nunca teve tempo para apreciar; o vale profundo enevoado com o rio Dão a correr para Alcafaxe e, lá longe a brancura de persistentes manchas de neve dispersas.
Os tamancos de pinho não eram suficientemente quentes para animar o dia que se seguia naquela terrinha e, vai daí, meu pai tentou a Venezuela e o Uruguai mas as facilidades só lhe surgiram para a África, Terras Ultramarinas de Portugal. Deram-lhe passagem de colono após preenchimento de impressos timbrados com a esfera armilar. Através da Companhia Nacional de Navegação zarpou no tal vapor Mouzinho de Albuquerque por volta do ano de 1949 ou talvez 1950. Nós, família Monteiro, ficamos a morar no Rio Seco da Maianga, início do Catambor e Senhor Lázaro, um amigo, instalou-se em uma casa de madeira em um bairro chamado de Bungo que mais tarde chamaram de Boavista. Ficava mesmo à beira mar da baia de S. Pedro da Barra, uma faixa de terra entre a linha do Caminho-de-Ferro e o mar.
Estes barracos foram surgindo em áreas do domínio público e cada qual fazia seus puxadinhos até a areia e, bem no término das marés altas. Era assim que viviam os colonos pobres, paredes meias com cortiços, quase musseques tendo por vizinhos pretos e mulatos. Esta crónica foi pensada para falar do milagre a que assisti já em Angola; milagre que durou os anos de minha juventude, do que eu presenciei nas visitas que meu pai fazia a um antigo sócio do volfrâmio chamado Lázaro pai de Álvaro, um menino que comecei por ver paralítico e numa cadeira de rodas.
Enquanto meu pai foi trabalhar para as brigadas do caminho de Ferro de Luanda, antiga Ambaca, Lázaro foi colocado como capataz de estiva no porto de Luanda. Isto para dizer que da varanda que dava para o mar, Álvaro o moço paralítico rojava-se até às águas espelhadas da baia e ali ficava quase todo o santo dia. Sempre que meu pai visitava seu amigo Lázaro eu, também aproveitava ficar ali nas mornas águas sacolejando-nos em jogos variados. Por vezes, até dormia lá a pedido de Dona Micas mãe de Álvaro, a fim de ter companhia; embora tivesse mais irmãos, ele e eu dávamo-nos bem ou, de um outro jeito. Eu era bem tolerante com os esgares e caretas que Álvaro fazia no esforço de pronunciar falas; até nos entendíamos por gestos e vontades telepáticas.
Desta forma o Tonito da Dona Arminda (euzinho) por lá ficava uns dias com seu amigo Álvaro o paralítico, coitadinho. Sentíamo-nos peixes na água mergulhando como golfinhos ou boiando como bogas, roncadores e mariquitas. Por vezes e dentro de água fazíamos grandes pescarias daqueles peixes e até carapaus, agulhas ou garoupas. Bom! Agora vamos ao tal milagre. Álvaro começou gradativamente a andar, primeiro titubeante agarrado a bordões e mais tarde solto destes, andando como um boneco de circo, pernas esticadas e bamboleando, mas andando!
Estou a ver seu sorriso ao longo do tempo quando fazia uma qualquer outra avaria; um sorriso babado com descontrolo muscular mas sortido de alegria. Pouco a pouco foi deixando a cadeira de rodas e até já ia só, até o transporte que o levava à escola do Kipacas do Ferrovia! A razão por que falo disto é a de que se há qualquer coisa que reabilite nossos ossos, músculos e rijeza ao organismo é mesmo o iodo das manhãs nas águas quentes do mar; uma tal de vitamina D que nenhuma pilula nos pode dar. Como kota, sinto isto desde 2006 pela ida muita frequente à praia, aqui no nordeste Brasileiro. Entre as 6 horas da manhã e as nove horas, lá estou metido até o pescoço na água da Pajuçara. E, olhem que é bem notório o bem que me sinto.
Agora minha talassoterapia nas águas quase paradas e quentes da Pajuçara de Maceió é prioritária tal como o foi quando nadava no útero de minha mãe dona Arminda loureiro. Os resultados são lentos mas eficazes para quem persiste e, porque a natureza só por si dá-nos recursos. Recursos que a maioria das gentes desaproveita. É por isto que não me posso ver longe do mar tropical por muito tempo. Todos os dias faço movimentos os movimentos recomendados pelo meu próprio “personal treiner”… Eu, próprio. Agradeço assim sem protocolos à mãe natureza e seu dirigente chamado Deus sem outras felpudas falas e, porque os homens mais dignos de penas serão aqueles que transformam seus sonhos em prata e ouro. Faço os possíveis! Do Álvaro e depois do “setentaecinco” nada mais soube…
O Soba T´Chingange
Notas:* Candengue: rapaz, menino, jovem; Luua: Diminutivo de luanda;
FÁBRICA DE LETRAS DA KIZOMBA – “SONHAJANDO A VIDA”
Crónica 3367 – 14.04.2023 - PAJUÇARA - Em Maceió como Zelador-Mor do Zumbi de N´Gola…
Por:T´Chingange (Otchingandji) – No San Lorenzo da Ponta Verde.
Já sentado na cadeira emprestado pelo Conde do Grafanil, olho o buraco-casa do meu amigo cirí e, nada de ele aparecer. Só mesmo o buraco aberto, escancarado e virado ao céu com um montículo de areia mais avermelhada retirada bem do fundo da sua caverna e, disposta em volta do buraco como se o fosse uma cratera de vulcão.
Coloquei um bago de jinguba bem na entrada, fui fazer no mar a minha ginástica habitual e, quando regressei o bago de jinguba estava bem no sopé exterior da escarpa da cratera – rejeitou-o, simplesmente; sundiameno! De vez em quando olho o buraco bem do lado direito e tudo está igual. Neste entretanto e por acaso passa a mulher caranguejo, explico: na ginástica dela percorre alternadamente e repetidamente para trás; anda de marcha-a-ré para fazer recuar a velhice.
Assim, mesmo sentado vou lambendo a fantasia dela de afinal quando é que a velhice começa surgindo de dentro da mocidade. Descaminhando ginástica de para trás, ela que já é um pouco kota, agarra a juventude nesta prática exercitada. Eu sou o que sou mas ela, mesmo andando à ré, continua a ser ela… A mulher caranguejo já nem me via há dois anos mas, reconheceu-me; quis saber notícias das balelas que todos já sabem.
Quis saber da senhora Ibib, quedê ela? De novo aos olhos da minha vazante, a maré já começava a subir, falei que minha senhora ficou no M´puto disse, em tratamento de paludismo. Falei só assim por falar pois já quase eram horas de regressar ao meu mukifo, passar na farmácia e comprar um negócio de eliminar a flor-do-congo que já dava coceira nas partes de entre o saturno e plutão e também nos braços, minha herança de Angola; eu saí dela mas ela, não saiu de mim…
Acho que é uma filária que anda passeando férias no meu corpo como se estivesse em Acapulco e até por vezes desce às matubas do meu descontentamento perturbando o plim-plau do Kwanza. Ela, a mulher Caranguejo após minha intrincada explicação com edecéteras muito periclitantes acabou por dizer: A vida é mesmo assim…
As melhoras para ela, inté! Agradeci-lhe com a convicção de que nem sabia o que era isso de paludismo; isso pouco interessa pois que nem havia verdade na conversa de simpatia… Chegado ao mukifo do conde do Grafanil, tomei o meu café da manhã “santa clara” e provei a canjica de milho branco com umas sementes de girassol com erva-doce porque a memória que Deus me deu não foi para palavrear às arrecuas; andando assim como a mulher caranguejo.
Todos iremos morder o pó ou o fogo consoante a forma como desejarmos dispor do nosso bem-amado esqueleto. E falo isto agora, porque ainda me é permitido, porque eventualmente, em um futuro próximo já não me permitirão mais dizer o que penso. A vida anda muito perigosa; minha mente não rebuscou os estudos escatológicos da marca da besta que para mim é a mesma coisa.
Comecei esta crónica sem saber como ia acontecer e lendo um artigo de Majo Sacagami fiquei a saber que não é bom fazer amizade com um caranguejo e, assim matutando desconsegui concluir meu raciocínio perturbando até meus fios de cabelo já extintos do cocuruto da cuca. É bem verdade, o buraco negro está a cinquenta anos-luz, que se lixe… Pelo sim pelo não, o Sundiameno cirí, amanhã está prometido: vai ser tooparioba (com dois ós para se ler u) Como o mexilhão do mar, dentro duma concha dura, tenho de viver entre pedras, como a escolopendra (que deve ser caranguejo, lagartixa ou bicho com mil pés) entre as fendas da lava. Que até tem pedras a toda a volta, de lado e por cima. Fui!
O Soba T´Chingange
FÁBRICA DE LETRAS DA KIZOMBA – “SONHAJANDO A VIDA”
Crónica 3366 – 13.04.2023 - PAJUÇARA - Em Maceió como Zelador-Mor do Zumbi de N´Gola…
PorT´Chingange (Otchingandji) – No San Lorenzo da Ponta Verde.
Remexendo-me na água ligeiramente agitada da Pajuçara de Alagoas do Brasil, ia pensando em terras longínquas do Calahári da Namíbia que visitei por várias vezes e, aonde pude ver árvores mortas, petrificadas há 900 anos; muitas, ainda de pé. Foi a norte e em lugres chamados de Khoixas, Kamanjas e Otjo no Deadvlei. A Sul vi dunas gigantes no Park Naukluft de Sossusvlei. O clima ali é tão seco que aquelas árvores não puderam decompor-se normalmente, petrificando-se coisa difícil de entender. O contraste do céu azul com as dunas vermelhas renderam-me belas fotos - foi um registo de imagem para nunca mais esquecer. O curioso é o de que algumas árvores, continuam inteiras, como esqueletos retorcidos, sem folhas. O nome Deadvlei significa “pântano morto” e remete à época em que esta área, era um lugar fértil banhado pelo rio Tsauchab.
Uma mudança brusca de clima secou a área e, as dunas cresceram bloqueando a passagem do rio - um território de outro planeta. Deadvlei tem um solo composto de sal e argila branca e é rodeada por grandes dunas de cor avermelhada – tão altas que estão entre as maiores do mundo. Uma delas tem 325 metros de altura. Eu levei quase uma manhã para subir a duna da milha 45. A cor avermelhada vem da areia, que é composta de óxido de ferro e tem cerca de 5 milhões de anos, segundo estimativas. Mesmo no cacimbo (tempo frio), o clima é tão extremamente quente, que se recomenda aos turistas levarem no mínimo dois litros de água por pessoa, além de ter de usar protector solar, chapéu, óculos de sol e blusa com manga comprida. Aqui e agora, o vento surge no momento em que o pescador de nome Ambrósio lança as duas redes na água da piscina natural da Pajuçara.
Ambrósio espeta um pau na areia quando já está com a água pelo peito e depois vai dispondo a rede com as bóias brancas flutuando e assim dispõe-na por completo numa longitude de talvez uns vinte e cinco metros. Depois repete a mesma tarefa com a outra e em seguida bate a água agitando as duas mãos para assustar peixes que surjam por ali e, de modo a que fiquem presos na rede. O resultado para mim que observo é de defraudar vontades, pois nestes últimos dias só o vi apanhar uns poucos vermelhos, uns peixes parecidos com o cachucho.
Uma vez que recordei séculos lá para trás no tempo, recordo também que depois do homo sapiens e da morte de animais gigantes no tempo dos mamutes e dinossauros, das viagens dos vikings em barcos de papiro amarrado dum certo jeito e outros edecéteras, que foram os portugueses, os primeiros a chegar à Austrália. Segundo o historiador e filólogo Carl von Brandenstein, os portugueses teriam naufragado no noroeste da Austrália Ocidental, perto da ilha de Depuch, entre 1511 e 1520, tendo sido os primeiros europeus a tocar a Austrália, de onde não puderam sair.
A história refere como responsável oficial na descoberta da Austrália na visão da Coroa do Reino Unido, que no dia 21 de Agosto de 1770 o Capitão James Cook chegou a Nova Gales do Sul – nome que atribuiu àquele vasto território mas, novos achados vieram demonstrar que os portugueses já ali tinham chegado bem mais de duzentos anos antes. Porém, e sem contar com a colonização aborígene verificada há cerca de 40 000 anos, a viagem do Capitão Cook foi apenas o corolário de várias expedições exploratórias aos mares do Sul em busca do mítico continente do Sul.
Nestas viagens, a Austrália teria sido visitada, segundo alguns investigadores, por portugueses. Assim refere-se que no ano de 1522, Cristóvão de Mendonça e cinco anos depois, em 1525 Gomes de Sequeira ali aportaram deixando canhões que o tempo enterrou na areia – canhões que tinham as datas bem conservadas. Assim, o primeiro contacto europeu com o continente do Sul teria sido efectuado por navegadores portugueses, embora não haja referências a esta viagem ou viagens nos arquivos históricos de Portugal. É sabido que naquele tempo havia segredos e coisas de diplomacia que nem podiam ser referidas em documentos devido ao trato com o Reino de Castilha.
Sempre estava em causa o tal Tratado de Tordesilhas que definia latitudes a serem respeitadas. Foi nesse tempo que o mundo ficou dividido entre Espanhóis de Castilha e Portugal – Isto, quando tudo era reconhecido pelos vários Papas que definiam o que era deste ou daquele. Por isso o Tratado de Tordesilhas foi alterado por várias vezes! A principal evidência para aquelas visitas Tugas não declaradas, foi a descoberta de dois canhões portugueses afundados ao largo da baía de Broome na costa noroeste da Austrália. A tipologia dessas peças de artilharia indica serem de fabricação portuguesa, podendo ser datadas entre os anos de 1475 e 1525.
É o historiador australiano Peter Trickett que afirma que duas expedições portuguesas realizadas nos mares da Indonésia no primeiro quartel do século XVI teriam chegado ao território australiano: a expedição do referido Cristóvão de Mendonça a partir de Malaca para o sul em busca das "ilhas de ouro" (1522), mas e, sobretudo a de Gomes de Sequeira em 1525 que supostamente teria atingido a Península de York. Para reforçar esta tese evoca-se o estabelecimento pelos portugueses em 1516 de um entreposto comercial em Timor, que fica a cerca de 500 quilómetros da Austrália. Acredito que assim tenha sido…
Notas: *Sonhajando: Viajar com sonhos.
O Soba T´Chingange
FÁBRICA DE LETRAS DA KIZOMBA – *SONHAJANDO A VIDA*
Crónica 3363 – 08.04.2023 - PAJUÇARA - Em Maceió como Zelador-Mor do Zumbi de N´Gola, feito *Kalundu
PorT´Chingange (Otchingandji) – No San Lorenzo da ponta Verde.
Ontem, ouvi referir pela televisão que no território de Bielorrússia, um estado fantoche na dependência da Rússia, os militares estão recebendo instruções para poder lidar com engenhos de cariz nuclear. Por este motivo, recordei o desastre de Chernobil, um acidente nuclear catastrófico ocorrido entre 25 e 26 de abril de 1986 no reactor nuclear nº 4 da Usina, perto da cidade de Pripiat, a norte da Ucrânia Soviética, próximo da fronteira com a Bielorrússia Soviética.
Os ventos seguiram a direcção para ocidente, conduzindo as nuvens encharcadas de material tóxico. O reactor aberto e lançando grande quantidade de material radioactivo na atmosfera, espalhou-se em várias direcções. Parte deste material encapsulado nas nuvens e por via das chuvas, descarregaram parte desse material numa vasta zona da cidade de Viseu em Portugal. Aconteceu que a acidez de esses compostos atómicos, caíram com as águas nos vinhedos da região destruindo as colheitas e, eliminando ganhos a muitos e, em especial, a meu pai que tinha sua vida, não tão bem estabelecida.
Pois, meu pai que ainda era vivo, queixou-se desse desastre referindo os muitos inconvenientes pela perca de toda a colheita, sem qualquer tipo de ajuda das instituições estatais. Já se passaram 37 anos e, de novo surge no ar a estupidez de maluqueira saída do nada, por um dirigente terrorista chamado de Putin, sem parecer lhe pesar na consciência a infeliz situação para o mundo ocidental. E, até para eles próprios se desencadearem nessa ideia de autêntico holocausto.
Usar esses nefastos artefactos repetindo o que há milénios sucedeu com a destruição de Sodoma e Gomorra transformando a mulher de Ló em estátua de sal quando quis ver o clarão atómico. Ninguém até hoje disse ter sido essa explosão de natureza atómica mas o facto de termos um ciclo de vida curto, o tempo esmoreceu teorias ao ponto de hoje podermos comparar com o que sucedeu em Hiroxima ou Nagasáqui e acreditar que houve uma outra civilização avançada que cometeu os mesmos erros dos dias hodiernos.
E, se uma hecatombe dessa envergadura acontecer, os arqueólogos do futuro nada revelarão sobre alianças politicas forjadas à volta de um louco seguido por com muitos outros lideres descuidados e incompetentes ou sem caracter que na hora incerta, não souberam fazer determinar o fim de uma guerra parva. Os espíritos dos mortos que abençoaram alianças e políticas de torpitude, não oferecerão segredos de como foi o que aconteceu e de quantos curandeiros garantiram a bênção desses espíritos. Haverá cortinas de situação a cobrir milhares de anos de história.
Neste futuro de longos milénios será difícil descortinarem os testemunhos, dos movimentos, alianças ou revoluções nas palavras com teorias filosóficas nem sempre de virtude. Até compararão o Napoleão conquistador com Putin, e outros fabricantes de múltiplas malazengas referindo Cristo, Maomé ou Alá. Surgirão académicos feitos professores e gurus colocando questões com ou sem razoabilidade no trato da verdade.
E, o mais provável é o de que nunca se saberá pelas normais ferramentas de investigação todos os dramas experimentados. Se não somos donos deste capítulo actual, como irão então explicar se o mundo já teve há milhões de anos atrás, uma explosão atómica e, que tudo teve reinício a partir do mada. Não é de estranhar dizer-se que o verdadeiro Deus antes do David foram uns quantos ET´s e, que nós todos descendemos deles.
Nossa singularidade ainda anda a ser descoberta pelo que, ainda nos andamos a reconstruir. Por isto e aquilo, não será de estranhar andar a interceder amizade com um caranguejo cirí juntando montanhas de teorias sobre os muitos montículos de relíquias, pinturas rupestres com dentes cariados e intrusar tudo com investigação criminalista de como foi, que tal criatura morreu, que tipo de arma foi usada e até qual foi o motivo de facto.
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Notas: *Sonhajando: Viajar com sonhos; **kalundu – É uma divindade ou espirito justiceiro, presente na natureza
O Soba T´Chingange
CONHECER MELHOR O BRASIL – QUEM ERAM OS AFRICANOS
1ª Parte - Crónica 3362 - N´Guzu é força (Kimbundo) – 07.04.2023
PorT´Chingange (Otchingandji) – Na Pajuçara de Maceió
AFRICANOS. No Brasil, a escravidão foi sempre marcada por uma intensa dependência do tráfico atlântico caracterizando-se mais do que em qualquer outra sociedade esclavagista das américas, fundamentalmente africana. Não obstante, gente, homens e mulheres trazidos de África para o Brasil como escravos, possuírem varias origens linguísticas, étnicas ou religiosas e, não raro o eram inimigos no próprio lugar de onde foram desgarrados. Eles, nem sabiam ou se reconheciam como africanos por dali serem originários.
No período colonial, esses africanos eram identificados pela região ou porto aonde teriam embarcado. Surgem assim, africanos de Minas, do Congo, de N´Gola, da Matamba, de Benguela, Guiné ou Moçambique. A designação por procedência foi assumida por eles mesmos, enraizados num conceito de “guarda-chuva”; preservavam isso, para assim se identificarem, permitindo a novas levas de gente chegada, organizar-se de uma forma mais eficiente no relacionamento entre eles e, os outros.
Nesse comportamento, a história esclavagista, regista a existência de nítidas fronteiras entre os escravos no Brasil formando verdadeiras nações e, muitas vezes organizadas assim separadamente, mais por contexto de irmandades religiosas. Como exemplo os escravos de Luanda de N´Gola entendiam-se no dialecto kimbundo, alguns originários do N´Zaire, falavam em kioco, enquanto os de Benguela usavam o dialecto umbundo mas tinham por comum a base bantu, como por exemplo seu deus era designado por todos, de N´Zambi.
Nas primeiras décadas do Brasil monárquico eram nítidas as divisões entre os oriundos da Costa Ocidental de África chamados genericamente de Minas mas, também designados como Jejes, Bancás e Nagôs. As muitas nações provenientes da região do Congo, Guiné e N´Gola ou N´Zaire, Lândana e Matamba com gente Imbinda ou cabindas, de Rebolo Cassange ou Benguela reuniam-se sob a denominação genérica de “Os Angolas”. Aos nascidos no Brasil chamavam-nos de crioulos, não deixando de ser diferentes dos demais e, eram designados igualmente de “Africanos”. E, foi no contexto das lutas pela independência e afirmação monárquica brasileira que, pela primeira vez a tradicional oposição entre recém-chegados do tráfico e os crioulos se apresentaria de feição mais geral, nos assumidos conteúdos políticos.
Nesta descrição, o Brasil apresenta-se em três distintas épocas a saber: a da colonização brasileira; a da época do Brasil Monárquico e a Monarquia Imperial com sede na capital em Rio-de-Janeiro, reino alargado de Portugal, Algarves e terras Ultramarinas em África e Oriente com a Índia de Goa, Damão e Dio e Timor, na Indonésia. As primeiras décadas do Brasil Monárquico foram marcadas por um “boom” de produção agrícola por via do tráfico negreiro. Nesta data, na capital da Colonia de Angola, havia um edifício chamado de Palácio de Dona Ana, pertença de Joaquina dos Santos Silva, a negreira (mestiça), que teve a maior relevância na sociedade luandina ou camundonga.
Esta ilustre senhora de então, chegou a ter um quintalão em frente à escadaria do Palácio por onde passaram milhares de escravos endereçados para Porto de Galinhas em Recife. Os cálculos da Atlantic Slave Trade dizem que entre 1501 e 1866, aproximadamente 5,7 milhões de escravos saíram dos portos de áfrica para as américas. No Brasil, os pregoeiros iam às roças anunciar que tinham chegado galinhas ao porto. Era uma forma de enganar as autoridades do reino perpetuando a venda de gente depois de 1850 – ano final da proibição. E, é por este motivo que Porto Galinhas, um lugar de veraneio brasileiro é assim chamado. Dona Isabel sancionou a Lei Áurea, na sua terceira e última regência, estando o Imperador D. Pedro II em viagem ao exterior, às três horas da tarde do dia 13 de Maio de 1888.
No início do século XIX, delinearam-se duas grandes áreas de comércio negreiro para o Brasil destacando-se as rotas entre os traficantes baianas e, o reino de Daomé na Costa Ocidental da África, e as dos traficantes de Angola e do Rio-de-Janeiro e Recife com a África Central-Ocidental e a chamada contracosta de Moçambique. Nas áreas açucareiras do Recôncavo Baiano entre os fins do século XVIII e as primeiras décadas do XIX, a rasão de africanidade das populações dos engenhos era de dois para um, raramente somando menos de 60% do conjunto da escravaria. Nas primeiras décadas, já no período Imperial, com o tráfico ilegal, os falantes de língua banto alcançaram até os 90% da escravaria das fazendas de café da região, às vésperas da extinção definitiva ao tráfico atlântico, em 1888.
(Continua…)
O Soba T´Chingange
FÁBRICA DE LETRAS DA KIZOMBA – *SONHAJANDO A VIDA*
Crónica 3358 – 01.04.2023 - PAJUÇARA - Em Maceió curtindo férias de Zelador-Mor do Zumbi de N´Gola, FEITO KALUNDU
Por T´Chingange (Otchingandji) – No San Lorenzo
Enquanto espero a inspiração muito cheia de novidades desconhecidas, dou voltas ao miolo em como irei dar solução ao enredo da estória intrincada e, que no capítulo seguinte virá a ter o número de ordem 24º. Para o efeito tive de recordar o último Missosso do Kimbo elaborado a 03 de Dezembro de 2022 e, pois sucede que chegando ao fim da página, depois de ler: **Esta é uma estória inventada só no que concerne às mentiras, segue-se a explicação do que quer dizer a palavra kalundu no dialecto kimbundo de N´Gola. **kalundu – É uma divindade ou espirito justiceiro, presente na natureza (A entrevista com o Brigadeiro N´Dachala, continuará lá mais para a frente - depois das eleições previstas neste ano de 2022…). Até aqui tudo nos conformes mas, eis que se segue um comentário ainda não lido por mim, pelo que o vou transcrever talqualmente como está inserido no Blogue. Motivo mais que relevante para destravar a minha própria tranca letárgica e pegar de novo na estória de Fala Kalado
Comentário: De Patrícia C. Neto a 3 de Dezembro de 2022 às 23:46
Olá, sou Patrícia C. Neto, estou aqui para espalhar esta boa notícia para o mundo inteiro sobre como recuperei o amor do meu marido. Eu estava enlouquecendo quando meu amor me deixou por outra garota no mês passado, mas quando conheci um amigo que me apresentou ao Dr. WAVA o grande mensageiro (entenda-se feiticeiro kimbanda ou t´chingange)…
Narrei meu problema ao Dr. WAVA sobre como meu marido me deixou e também como eu precisava conseguir um emprego em uma empresa muito grande. Ele apenas me disse que vim ao lugar certo, aonde obteria meu desejo do coração e, sem nenhum efeito colateral.
Ele me disse o que eu precisava fazer; depois que foi feito, nos próximos (sequentes) 2 dias, meu amor me ligou e pediu desculpas por me matar antes de agora e também na próxima semana. Depois que meu amor me ligou para estar implorando por perdão, fui chamada para uma entrevista na empresa desejada, aonde precisava trabalhar como supervisora.
Estou tão feliz e emocionada que tenho que contar isso ao mundo inteiro sobre como o Dr. WAVA me ajudou a realizar o desejo do meu coração. Dr. WAVA é um especialista em todo tipo de feitiço e boa magia. Se precisar de qualquer tipo de ajuda, entre em contacto com Dr. WAVA no seguinte endereço de e-mail: drwava3@gmail.com, você também pode ligar ou whatsapp/Viber +66992602953 se precisar de sua ajuda. https://www.drwavaofspirituallovespells.com
RESPONDER A COMENTÁRIO:
Desta feita, verifico ser este “Kimbanda” muito superior ao Primeiro-Ministro de nome António Costa. Deveria ser seu assessor para acudir às mazelas do M´Puto pois que sua “propaganda” é bem oleada nas muitas difíceis engrenagens do optimismo… Suas entidades vibram nas matas, cemitérios e encruzilhadas, com o "Povo da Rua" abrangendo os mensageiros ou guardiões (é dos livros…). Estou a ver-me tirando uma senha a fim de ficar depenado nos trinques, talqualmente fazem os muitos políticos do “M´Puto” rectângulo. Mas, ele, há coisas…
Afinando as pestanas denota-se que o Dr. WAVA é para além de um bom candidato a politico, um homem de ética apurada, enfim, um bom republicano. Perante esta mokanda, acho que o espírito da gente é cavalo que relincha e até escolhe estrada. Que quando numa de para tristeza, e morte, vai não vendo o que é bonito e bom; seja!? Contando assim este episódio de quase resiliência, coloco até minha sobrada amizade, assim mesmo, um pouco para ele singrar, pois que surge do nada em criatura de simples coração que em verdade, me fez desacreditar que o inferno é mesmo possível! Ainda estou *sonhajando…
*Nota: Sonhajando: - Viajar com sonho…
O Soba T´Chingange
NAS FRINCHAS DA VIDA
Crónica 3356 de 28.03.2023Na Pajuçara do Brasil
Um homem sem a liberdade de ser e agir, por mais que conheça ou possua, não é nada…
Por T´Chingange (Otchingandji) - No Nordeste Brasileiro
O destino da humanidade repousa irremediavelmente e, cada vez mais que nunca, sobre as forças morais do homem. Se se quiser uma vida livre e feliz, forçosamente haverá necessidade de se restringir ao essencial e renunciar a muitas tentações; daqui dizer-se estar-se sempre na mesma - só que com outros nomes! As maneiras de estar no mundo mudaram, ou foram forçadas a mudar - seus hábitos, atitudes ficaram algo periclitantes por força de novas imposições sociais, maneirismos, vaidades ou futilidades.
Uma grande parte de nós mente a si mesmo por conveniência, laxismo ou “deixa andar” e, nem se dá conta disso. Em tempos idos (tenho quase 78 anos) havia criados, contínuos, serventes, ajudantes, acessoristas ou aprendizes de qualquer coisa. Hoje o destino da humanidade repousa sobre os valores morais que conseguem suscitar em si mesma por indução, por convicção, por instrumentalização ou por coisas ordeiras no ponto de vista sindicalista.
Nessa forma de estar com “Maria, vai com as outras”, no descaso da prática, nada mudou – só sofisticações para criar escalões de coturno ou por maluqueira dum qualquer visionário político que se ache, que “quer mudar o mundo” com as inaltecências e edecéteras bizarronas. Aos criados chama-se desde algum tempo, cuidadores com múltiplas variantes como apoio da terceira idade. Aos contínuos, auxiliares da acção escolar e, técnicos ecológicos aos antigos varredores ou qualquer outra função segundo uma escala de ascensão e parâmetros de carreira com exclusão da 3ª classe porque esta é altamente vexatória.
Ser-se assim duma tamanha desclassificação não pode! Assim, vem auxiliar de segunda classe que sobe para primeira, segue-se técnico de 2ª, depois 1ª, depois principal, especialista e edecéteras que por aí vai. Ora um ascensorista que só tem de saber carregar um botão com um único dedo, como então, vai seguir na subida da vida chegando a especialista funcionário! Isto traz-me muita confusão ao ponto que, até me tem fundido as lâmpadas do meu ego cerebral.
Todos, ou quase, percebemos que o livre jogo das forças económicas, governos e governistas com afins circunscritos, interesse da causa, o esforço desordenado e sem freios dos indivíduos para dominar e adquirir a qualquer custo um poleiro digno - problema que, simplesmente deveria ser de cacaracá. Um barbeiro sempre será um fulano que corta cabelos nué? Tanto roubo, tanta hipocrisia e corruptela têm de ser misturados nestes entretantos que ocupam montes de psicólogos, psicanalistas e desclassificados a fingir que o são: Competentes ou comentadores; também estes, especialistas; se for assuntos de guerra sempre vai aparecer um major general de nem sei quantas estrelas. O mundo está doidão!
Um apanhador de lixo não pode ser um técnico superior de ecologia nué? Ou Noé? O estado deverá ser permanentemente inovador nas áreas de educação na pesquisa séria e com substância. Será com novas áreas de modernidade e novos paradigmas que se alcançará o bem-estar social. Só que não basta mudar o nome da treta para mudar-se a atitude. Também se na vida económica de um povo, o egoísmo e corrupção persistirem - o “monstro”, inevitavelmente derrotará a democracia a papelocracia, a burocracia e coisas inúteis tal como a conhecemos e concebemos.
A política tornar-se-á tão nefasta que no dia-a-dia perigará a condição em se ser um cidadão honesto. Os estragos serão cada vez mais atrozes ao entendimento da gente que cada vez mais detestará a política e os políticos. Detestará também os sindicatos e sindicalistas manobradores. A menos que os homens descubram e bem depressa, os meios de se protegerem deste desequilíbrio ético, caminhando rapidamente para guerras internas…
E, a dúvida de todos ou de uma grande parte subsistirá porque, quando se trata de ser ou não ser, as regras e compromissos, nada valem. Sei-o por experiência própria em um tempo não tão distante: 1975 – Um tal de acordo de Alvor – lugar do M´Puto! Aonde então, se meteram os estadistas? Diriam como salvaguarda posterior serem medidas revolucionárias! A evolução dos últimos anos põe em foco o facto de termos muito poucas razões para confiar nos governos; em confiar na ética e responsabilidade desses tais de gente impoluta – 5 estrelas.
As dispersões de opinião serão cada vez mais vincadas, originando uma incerta forma de governo e, proporcionando, o aparecimento de associações do tipo geringonça. Estas terão pela certa jogos de sociedade respeitando escrupulosamente sua visão ideológica, suas regras, suas normas, seus interesses. A confiabilidade dissolver-se-á assim, em permanentes duvidas e, nisto de assim ser, não há objectores de consciência. Na verdade trata-se de uma prática desigual ou ilegal; um combate pelo direito real dos homens contra seus governos já que estes, exigem de seus cidadãos actos criminosos de demasiados e injustos impostos, demasiadas e desadequadas leis.
O Soba T´Chingange
TEMPO DE CINZAS. 12.03.2022 na Pajuçara – Republicação a 24.09.2022 em AlGharb do M´Puto
Crónica 3254 - Lendo a “TEORIA DA INCERTEZA” no 7º dia da guerra em Ucrânia
MALAMBA: É a palavra.
Por T´Chingange, na Pajuçara de Alagoas e Lagoa do M´Puto
Alain Delon, o donatário de dez paços de areia na praia Pajuçara chega por volta das sete horas da manhã fazendo um grande alarido em minha direcção, eleva as duas mãos, diz bom dia patrão e finca os dois polegares no ar abanados e virados ao céu para me desejar saúde. Estando eu a fazer movimentos de talassoterapia respondo do mesmo modo, com água até o pescoço, de óculos e chapéu quico branco do Palmeiras. Entrei na água pelas 5,45 horas, tépida, serena e espelhada como é normal na maré baixa. As calemas esbatem-se lá atrás nos recifes na forma de espuma branca; pode ouvir-se o barulho.
O Alain ganhou comigo o sobrenome de Delon em memória ao artista de cinema que me transmitiu alegrias na juventude Luandina, no antigo cine do bairro Maianga, meu clube, ou em uma outra qualquer das muitas salas ou esplanadas existentes na Luua de Angola tai como o Miramar, Império ou Avis. Aqui as sesmarias de posse d´areia são contadas em dez passos segundo uma direcção já estipulada e segundo duas referências como se fossem faróis ou bandeirolas, um poste alinhado com uma equina e, bem vertical à língua de praia.
Como chego muito cedo, a vastidão é só minha mas, porque conheço as balizas destes donatários sempre faço os possíveis para aqui ficar, sentar-me depois da hidroginástica, dizer umas larachas de soberania, comer uma peça de fruta à sombra do meu sombreiro com gravuras de peixe-agulha e flores, pegar no livro do dia para fazer a leitura hodierna; ainda ando mastigando o livro Veredas de Guimarães Rosa, triturando lentamente as falas intrincadas, parar e fazer-me entender envolto na riqueza de tantos vocábulos estranhos e, inusuais na literatura de hoje.
Sendo assim Alain deu paz à minha ideia congeminada entre o bracejar, rodar, remar e saltar abstraindo-me do olhar co contorno das cérceas que em curva se dispõem ao longo da marginal, calçadão, passeio e pista de ciclovia que ondula a marginal desta orla. Hotéis e edifícios residenciais que bordeiam esta grande piscina natural na forma de uma pequena baía. Estou bem em frente ao pavilhão de artesanato; posso vê-lo por entre os coqueiros e amendoeiras de um frondoso verde. É o lugar de Sete Coqueiros mas, em realidade são muitos mais.
Tenho agendado fazer compra de prendas neste artesanato, oiro de capim das chapadas de Tocantins; pequenas lembranças a levar para o M´puto. Por via da guerra da Ucrânia, embora longínqua, terrível, estupida e medonha, tudo me perfaz num quanto baste provocando-me desagasalhadas alegrias. O Alain passa e, mete-se comigo enquanto acaba de espetar seus grandes chapéus quadrados e vermelhos, num total de nove na sua sesmaria, dizendo:- Hoje é dia de escrita, patrão!? Sem esperar resposta, que nem era para isso, num entretanto acode a dois casais acomodando-os bem ao lado preenchendo assim a frontaria da maré…
Ver a praia desnuda e, do nada virar coisas, chapéus de múltiplas cores, cadeiras, mesas e arrepios de vida, se o quiserem resiliência também. Assim vi! Num repente veio um relance que também me arrepiou ideias. Minha rasa opinião sucumbe no braço d´armas da guerra que mata gente como quem mata coelhos. Putin, o dono da caça, ele tem olhos muito incertos e vesga-os sem sair qualquer suor pestanejado, cara de cera, sem lágrimas nas beiradas de sua testa, o filho da puta! Vou dizer mais o quê, apetece-me chamar-lhe nomes.
Cada um com a casa atrás da parede, tijolos desfeitos, atrás do nada, um zumbido, muitos mais, um estrondo e muitos mais, fragmentando mortes, o crepitar de labaredas, caibros que caem, muitos e mais muitos rebentamentos só átoa com cheiros, com fumos – ninguém tinha esperado – ninguém tinha pensado. E, depois, um silêncio tremido de medo com choro abafado e de novo, um segundo que vira século, aquele outro silêncio pior que um alarido, que dói…
No buraco escuro, escutando a rádio, opiniões, muitas até em que não me assopro, hipocrisia. Que crime? O homem veio guerrear com todo o mundo. Guerra! Crime que sei, de fazer traição; não cumprir a palavra, não a ter: Uma arte de intrujice, nunca vista, nunca sentida, nunca cheirada. E o resto do mundo? O resto do mundo ficando agachados, molengados, por nivelar sem diferir. Na ponta dos olhos da gente sai uma raiva, outra e mais outra, feitas lágrimas. Ideias que vão e vêm – a gente empurra para trás, mas a todo o momento elas voltam a rodear-nos nos lados. E o mundo, no mundo a gente que pode, tem muitos mais lados! E, não há lá no sítio da URSS, um filho da mãe que lhe ofereça um como de cicuta…
O Soba T´Chingange
SETE COQUEIROS DA PAJUÇARA - “A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso - a palavra foi feita para se dizer”- Crónica 3238 - 05.02.2022 – Republicada no KIMBO a 30.08.22 no AlGharb do M´Puto…
Por T´Chingange – (Na Pajuçara de Maceió no Nordeste brasileiro)
Hoje (05.02.2022) apreciei de dentro da água tépida de 28 graus o nascimento das capitânias d´areia – concessão aos empresários que vivem da venda de sombra aos turistas, uns cocos frios e pasteis feitos na hora e debaixo de uma amendoeira e também o açaí de Tocantins ou skol em lata. O empregado do capitão d´areia risca a areia segundo uma direcção já estipulada, depois conta dez passos para o lado concessionado e, com o pé risca na areia o término correspondente ao seu patrão, Seu Baldo.
Entretanto o moço vai cantando uma lengalenga e, intercalando a mesma, mete-se com o vizinho, também mocambo do Comprido, nome de seu patrão; imagino que seja alcunha pois que ele é mesmo alto. O dito-cujo chegou mais tarde botando ordem na algazarrada feita forró de pé-de-serra da dupla sertaneja Chitãozinho e Chororó… Pode assim imaginar-se a divisão do Brasil em capitânias medidas em léguas no tempo em que os prémios de marear mares por Portugal lá pelas Índias, eram ficar com lonjuras de terras desconhecidas até seu limite e segundo o Tratado de Tordesilhas, seguindo uma linha paralela aos paralelos ou equador.
Recordando a história, temos que as capitanias hereditárias eram uma forma de administração do território colonial português na América. Basicamente eram formadas por faixas de terra que partiam do litoral para o interior, comandadas por donatários e cuja posse era passada de forma hereditária. Por motivos de melhor aproveitamento para a administração da colónia, a Coroa Portuguesa delegava a exploração e a colonização aos interesses privados, principalmente por falta de recursos de Portugal em manter tais territórios.
As capitanias iam do litoral até o limite estipulado pelo Tratado de Tordesilhas, um modelo de colonização que tinha obtido sucesso na Ilha da Madeira e em Cabo Verde e África. A iniciativa de colonização utilizando este modelo respondia à necessidade de protecção contra invasores, sobretudo franceses que deixaram algum legado pois não me situo muito longe da Praia do Francês onde vivi por oito anos (de 2006 a 2014) . Os escolhidos eram membros da baixa nobreza portuguesa que a Coroa acreditava terem condições para a empreitada de colonização ou gente que se destacou na odisseia em descobrir o caminho marítimo para a índia.
Martim Afonso de Sousa
Esses nobres foram denominados donatários e representavam a autoridade máxima da capitania. O donatário não era dono, mas deveria desenvolver a capitania com recursos próprios, responsabilizando-se por seu controle, protecção e desenvolvimento. Juridicamente se estruturava o controlo da capitania através de dois documentos: Carta de Doação e Carta Foral. Tomemos por exemplo a capitânia de Paulo Afonso bem a meio do curso do Rio São Francisco que deu origem há agora grande cidade com seu nome, lugar que visitei na peugada de Lampião, um dos meus heróis da banda desenhada lá pelos anos de 1960 em Luanda (Angola), conjuntamente com o Mandrak, Homem de Borracha, Tarzan, Zorro ou O Fantasma… Minha cultura advém daqui e do cinema…
A Carta de doação dava a posse da terra ao donatário e a possibilidade de transmitir essa terra aos filhos, mas não a autorização de vendê-la. O documento dava também uma sesmaria de dez léguas (50 Km.) da costa onde se deveria fundar vilas, construir engenhos, garantir a segurança e colonização através do povoamento. Nela definia-se que o donatário era a autoridade máxima judicial e administrativa da capitania. As capitanias hereditárias existiram até 1821. À medida que iam fracassando, voltavam às mãos da Coroa Portuguesa e eram redimensionadas, gerando novas estruturas de administração. O acto de redimensionar as fronteiras das capitanias hereditárias moldou alguns estados litorâneos actuais.
Não obstante o sucesso administrativo, o sistema de capitanias sofreu com a falta de recursos, algumas foram abandonadas e em outras jamais seus donatários estiveram ali. Igualmente sofreram ataques indígenas, os quais lutavam contra a invasão de suas terras.
Desta maneira, o empreendimento das capitanias hereditárias fracassou. Somente duas foram bem-sucedidas a saber: A Capitania de Pernambuco, comandada por Duarte Coelho, responsável por introduzir o cultivo da cana-de-açúcar e a Capitania de São Vicente, comandada por Martim Afonso de Sousa, graças ao tráfico de indígenas que realizavam naquelas terras.
O foco da Coroa portuguesa na sua colónia da América Portuguesa era a extracção dos recursos da terra, como o pau-brasil. Isso devia-se ao facto de não terem sido encontrados metais preciosos como foi o caso dos espanhóis em suas possessões. Após a inviabilidade das Capitanias Hereditárias, a colónia do Brasil, passou por uma reforma administrativa sendo instituído o cargo de Governo-Geral, prática também iniciada nas possessões africanas de Angola e Moçambique.
Convém aqui nesta leitura da história do M´Puto – Portugal, falar de algumas curiosidades sobre as Capitanias Hereditárias. Elas impulsionaram o crescimento das vilas, que aos poucos se transformaram em províncias e, mais tarde constituíram alguns estados brasileiros. A herança dos sistemas de capitanias hereditárias pode ser sentida até hoje através do coronelismo e das famílias que seguem mantendo o poder em certos estados. Martim Afonso de Sousa permaneceu pouco tempo em sua capitania, pois foi deslocado para ocupar um posto nas Índias. Quem administrou a terra foi sua esposa, Ana Pimentel. Ando a rever isto vendo a novela “Escrava Isaura” que foi escrita pelo romancista Bernardo Joaquim da Silva Guimarães…
(Continua…)
O Soba T´Chingange
PAJUÇARA - SETE COQUEIROS - “A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso - a palavra foi feita para se dizer”- Crónica 3235 - 01.02.2022 em 7 coqueiros da Pajuçara
Republicada a 17.07.2022 do AlGharb
Por T´Chingange (Otchingandji )– No AlGharb do M´puto
Eram 5 horas e 45 minutos quando furei a areia para colocar meu chapéu-de-sol na praia de Sete Coqueiros. Fui o primeiro a colocar um chapéu naqueles 4 quilómetros de areal e bem em frente do Pavilhão de Artesanato. Após dispor as duas cadeiras bem aselhadas e, muito próximo do máximo espraiar das águas em maré decrescente, meti-me na água até meus ombro serem cobertos por esta.
O início de minha hidroginástica começa bem aqui, virado para a orla marítima e apreciando a azáfama matinal que é bem diversificada. Daqui posso ver como num anfiteatro todos os movimentos, sentir cheiros e os muitos sons que vão subindo ao longo do passar do tempo. Observo uma senhora que percorre a linha de ondulação da máxima maré com um saco de plástico e abaixando-se amiudadamente apanha algo com sua luva transparente; pareceu-me ser pequenos objectos, utensílios feitos em plástico como garfos, facas e canudos de plástico.
Pode até ser conchas mas tudo indica andar a cumprir uma promessa de limpar a praia de desperdícios deitados no bota fora na óptica do quero lá saber. Deve ser mesmo um compromisso de sonho de limpar os maus hábitos. O mesmo homem de sempre passa em corrida de passos ou pulos pequenos em direcção ao porto do Jaraguá. E, passa um tal de Mateus, um quase atleta de futvolei, conhecido de há anos e dizendo adeus, some-se na lonjura com suas passadas enérgicas.
As ondas à medida da descida da maré vão ficando menos altas pois que suas antecedentes ficaram lá atrás retidas nos arrecifes. É um lençol de água de cor esmeralda, que depois, no meio e antes dos recifes vai fiando azul e mais escura a caminho do horizonte. Estranho não voltar a ver uma velha senhora que caminhava na via ré, andando às arrecuas para ganhar mocidade. Ou então, andará envolvida nos rolos do medo covidesco na progressão de delta para ó-mi-com ou, na pior análise já foi nessa leva abalroada para o jardim das tabuletas.
Posso ver daqui o trilho que sei estar pintado de vermelho, pista de bicicletas e aonde se cruzam donzelas de justas pregas e todos os demais e, até vendedores de café da manhã que com seus zingarelhos de caixas, de pastéis bem dentro de outras caixas de isopor, esferovite de onde se pode divisar as tampas dos termos com café, com leite e outras garrafas com suco e quenturas de caldo de feijão; tudo numa ordenação estudada na resiliência. Ao lado, a gente correndo no calçadão vão dando colorido por entre os muitos chapéus de praia que vão surgindo a partir das sete e meia…
Contornando o calçadão, há dispostos altos coqueiros a emparceirar com as largas copas verdes de amendoeira, do figo da índia como eu conhecia em Luanda, capital de Angola. E, pela marginal posso acompanhar com os ouvidos o andamento de um carro discoteca que lança uma música tracejada de comprimido, mistura de kuduro com pera abacate. Parece, não haver noção dos decibéis enfiados a contragosto em todos os demais e, tudo numa boa, ninguém parece importar-se. A batida correu na avenida soando em tracejado ao meu ouvido já de si dolorido e carecido…
E, passa junto á beira da água molhada o mesmo general, caricaturado por mim já lá vão uns três anos e, sem jeito de baixar sua proeminente barriga de ginguba. Com suas flanelas protectoras do rei sol lá vai variando do amarelo fosfórico ao azul reluzente, tudo num passo rápido e convincentemente só. Pelas sete e meia surgem os trabalhadores empresários de chapéus no suficientemente largos para cobrir uma família. Fazem rasgos com os pé na areia a condizer com o seu licenciamento de capitania de praia e depois com uns negócios de enxadas gémeas fazem buracos o suficientemente fortes para aguentar sua estrutura.
Num rápido, já tudo está enxameado de cadeiras multicolores, mesinhas e chapéus; bem na berma do calçadão estão seus carros cangulos gigantes de serem levados por mão ou empurrão, depósito de todos aqueles trastes de artelhos com corotos e também caixas com gelo e bebidas para vender ao povão, cocos, cerveja e licores de jenipapo a misturar com iguarias de suco de ananás, acarajé de dendém e doces mixórdias de animar um qualquer ateu.
Bem perto duas mulheres com chapéus de palas largas em suas cabeças, rezam e cantam com as mãos elevadas para a kalunga ou iemanjá; mais longe saem as balsas dos jangadeiros levando turistas para as piscinas naturais; lugar do recife aonde a água transparece mostrando variedades de peixes que acostumados, vêm picar e debicar restos de pão, bonito de ver aqui e em qualquer lugar que tenha este jeito de recifes.
Escrevendo em verde o que vai por aqui, sei que lá fora todos andam inquietados com as movimentações, canhões de Putin na Ucrânia, ameaças da UE e a NATO, enfim. Desde a estória do Adão e a Eva que andamos assim em permanente transgressão. A culpa é mesmo da EVA que comeu o fruto proibido quando tinha tantos outros para se lambuzar… mais logo vou comer canjica e queijo de coalho no meio da tapioca, ver pela TV pela segunda vez “A escrava Isaura” e depois … Depois, amanhã será outro dia - FUI!
O Soba T´Chingange
TEMPO COM CINZAS – 27.01.2022 - No Nordeste brasileiro
E, aqui na PAJUÇARA - Se Deus salva as almas, e não os corpos, teremos de ser nós a resguardarmo-nos porque nem sempre é necessária a culpa para se ficar COVIDADO…
Crónica 3233. Republicada a 13.07.2022 no M´Puto
Por T´Chingange (Otchingandji) no AlGharb do M´Puto
Embora o Senhor esteja em toda a parte, é de ter em conta de que Ele às vezes parece não nos ver, fazendo-nos sofrer por culpa de outrem. Na Praia da Pajuçara leio a notícia que é coisa que se tira a desejo, do fim do Sol espojando-se para o sono da noite. Foi um ontem transladado para hoje como um espelho preto. Da tristeza que sempre é notícia de toda a hora, o gráfico da ó·mi·cron que corresponde à letra “O” do alfabeto latino, subiu aqui e ali e, mais gente morreu.
Neste meio tempo de escrita, vou sendo rodeado de chapéus coloridos, cadeiras e mesas, caixas térmicas isopor ou esferovite com estampas de cerveja a estalar de frio, gulosas que chega, gente gira com barulhos de linguajar de Gravatá. Mais logo virão a música de forró e anedotas de repentistas caboclos, matutos e gente gira de cu-ao-léu, sereia mostrando a barbatana, os fios entalados na alegria dos olhos e cheiros de entaladinhos mais coxinhas de galinha e o acarajé da tia Alzira.
E, assim e aqui na praia com algum aperto de desânimo aproveito para olhar para a banda de onde ainda se praz qualquer luz da manhã. Posso ver as velas enfornadas ao vento que vem do horizonte fazendo nadar as jangadas. Assim, mesmo sentado vou lambendo a fantasia de afinal quando é que a velhice começa surgindo de dentro da mocidade. Coisa endoidada de lembrar ao espaço pensamento em minha cabeça…
Lamber a maldição é castigo, mas a noticia que sempre a há, a gente tem de ir por ela, com ela e, entrar assim num mundo para buscá-la. A mulher caranguejo passa caminhando, bem, descaminhando ginástica de para trás, agarrando juventude na prática exercitada. Andando assim para trás diz-nos bom dia! Conhece-nos por temporada! Eu sou o que sou mas ela, mesmo andando à ré, continua a ser ela…
A mulher caranguejo já nem nos via há três anos mas, reconheceu-nos; quis saber notícias das maldades do mundo e, foi-lhe dito as balelas que todos sabem. Aos olhos da minha vazante, a maré já começava a subir, teria tempo de falar algo tal com falei e, eram 8 horas e 20 minutos, estava a meia hora de regressar ao meu mukifo no PortVille já ginasticado com a dose habitual de talassoterapia, escrever depois a minha crónica número 3233 para a Kizomba (esta).
Passar a limpo a mesma no computador, tomar o meu café da manhã “santa clara” e provar a canjica de milho branco com umas sementes de girassol e erva-doce porque a memória que Deus me deu não foi para palavrear às arrecuas; andando assim como a mulher caranguejo. E, sou mesmo forçado a criar tabus no meu espírito para me manter são na guerra da vida.
Ou fico em silêncio, ou falo dizendo impropérios à falta do fervor alheia. De todo o modo, assim ou assado, com este ou aquele, no M´Puto ou aqui em terras de Vera Cruz, terei de aceitar o meu posto de cidadão, mesmo faltando-me a confiança; mesmo que daqui advenham tempos sombrios e confundidos. Terei de ir mandando pontapés aos espíritos, às arrecuas e de costas, pois!
Todos iremos morder o pó ou o fogo consoante a forma como desejarmos dispor do nosso bem-amado esqueleto. Toda a vez que vejo ou ouço "todo mundo usando máscara" impossível que minha mente não rebusque os estudos escatológicos da marca da besta que para mim é a mesma coisa. E falo isto agora, porque ainda me é permitido, porque eventualmente, em um futuro próximo já não me permitirão mais dizer o que penso. A vida anda muito perigosa...
O Soba T´Chingange
MOKANDA DA LUUA – KAPIANGO - Luanda do Mu Ukulu… Era uma vez … O temp ruge.
Da Luanda actual - Crónica 3177 – 09.08.2021
- Kinguilas, as fugitivas da Independência - II de IV
Por T´Chingange no AlGharb do M´puto
Do BCI não é o urinol da esquina, que não funciona, nunca funcionou. Importado a peso de ouro do Brasil, a “casa de banho” faz parte de outras talvez centenas espalhadas pela cidade que nunca funcionaram. Ninguém conhece os contornos do negócio, apenas se sabe que nunca funcionaram, nem se conhece ninguém que tenha lá dentro urinado. O Rialto já não existe, só ficaram as saudades dos apetitosos pregos com jindungo e os finos tirados com a pressão exacta. Em seu lugar, recentemente, foi construído um alvo Monumento ao Soldado Desconhecido.
Os jovens não sabem o que isso seja, imaginam, segundo me disse um deles na rua, ser um soldado sem registo de nascimento. Ali ao lado estão os Correios, já centenários, mas de que ninguém parece tirar utilidade. Perguntámos a um jovem, vagabundeando por ali, o que são os correios. Ele olhou, tranquilo e respondeu muito sereno “não sei, pai”. Ninguém sabe nada, aqui nesta cidade. Também não precisam de saber. O tempo parou, sitiado entre a madrugada das 6 horas e o pôr-do-sol das 18 horas, vaivém, a cidade se povoa e despovoa, aqui se faz tudo, mas ninguém é daqui, as pessoas desabitam aqui, por isso não há tempo.
As kinguilas, fugitivas da Independência e da puliça, andam nos extremos da extensa avenida N´Zinga ou Ginga dominadas pelo banco estatal BPC, a agência Kaponte e a agência lá do fundo perto do Eixo Viário, ao lado da Unitel. Ninguém sabe o que é Kaponte, os jovens, desempregados, não sabem nada, não lhes diz respeito. Mas Kaponte pode ser uma pequena ponte, aquela ponte que liga à Praia do Bispo e onde se mataram, dizem, brancos desesperados com dívidas ou com desamores, naqueles tempos remotos antes do setentaecinco, tudo junto…
Lá dentro do BPC, para onde os mais velhos espreitam, diz-nos o jovem M´Bambi, nunca há sistema nos computadores, especialmente, reforça, depois das 14h - 14h30. Os funcionários querem ir para casa e não toleram mesmo, ser retardados por clientes sem dinheiro, mas com problemas complexos deles, de primos e tios que obrigam a consultas demoradas. Lá fora, um mundo mudo, ninguém fala, toda a gente parada sentando-se onde pode ou polindo esquinas…
É o mundo das kinguilas, as cambistas de rua, as verdadeiras bancárias do sistema, que também vendem recargas da Unitel, são dezenas largas de mamãs opulentas, vigilantes, carregadas de kwanzas e de divisas, inexistentes nos Bancos. Usam um balaio de mateba ou de plástico colorido; cada uma usa sua própria cor. A operação “Transparência” não lhes toca, parecem da família, tudo mancomunado com a grande máquina de lavar dinheiro; as purificadoras do sistema com adestramento no antigo “tira biquíni!” e mais suprimentos e até complementos do tal tão falado de “Roque Santeiro”. Um ar adstringente com cheiro a maboque derramado com mistura de tamarindo…
Só dão berrida nas pobres zungueiras que povoam a Baixa durante o dia, sempre com um olho aqui outro ali, já estrábicas, tipo ciganas na Europa, prontas a correr em defesa da mercadoria. São as fugitivas da esquindiva, da finfia com finta no aprendizado da Independência.
Mas é também o mundo dos pensionistas, centenas, ou milhares todos os dias desde manhã cedo, ainda quase escuro e ao som dos primeiros pio-pio dos agora raros pardais, seres ainda vivos se abeirando do óbito, tentando ver se a pensão já caiu…
O tempo clareou obscuridades trazendo o lixo na corrente da estória que os fez junto com os saídos de Angola involuntárias marionetes – a tal de dipanda do tundamunjila. Podia já ter esquecido todo este assunto, um tema deprimente para muita gente e descendentes matutos de mescla escura com mazombos e virgula no entretanto mas, eu mesmo prometi não esquecer este lado negro em terra que por via da descolonização se branqueou… O dólar tem de ser com o tal George de cabeça grande. O próprio George Washington…
Num aiué, todos os mitos em torno da “Nação de N´Gola”, as coisas mudam na percepção independente, tudo mudou mesmo muito nos anos da dipanda. Na Luua num repente também passou a ter também pretos de primeira e de segunda só que não querem que isto se saiba por ser assim muito tão cruelmente cruel. A preocupação com a etnogénese podia e pode ser muito bem motivada com a preocupação na degenerescência racial, da “eugenia positiva”, tem mwangolés de primeira e gente de chinelo do pé, tipo rafeiros mas isto, nunca passarão dum tal mito de que África dos trópicos de Capricórnio nunca vai querer analisar com profundidade …
(Continua…)
T´Chingange do kapiango na Diáspora dos AlGharb`s do M´Puto
KIBOM . I – É um sorvete gostoso
TEMPOS BRABOS DE CALOR… 16.01.2020
Por
T´Chingange – No Nordeste do Brasil
Espetei meu chapéu verde e branco bem junto à Kanoa na pequena enseada da Pajuçara da Ponta Verde. Ainda não eram seis horas da manhã e, meu chapéu era o primeiro a ser fincado na areia de cor amulatada. Um homem bem moreno, cambuta de baixote no atarracado, mas ágil nos movimentos, espeta na areia bem junto de mim e no final da borda do beijo molhado da maré cheia, suas canas de genuíno bambu.
Galho recto e nodoso de simples natureza quanto baste, um escasso metro e meio de seda de nylon enrolada a partir do fino extremo e presa com um atilho saído dum vulgar pneu de bicicleta. Nada de sofisticados carretos a dar ares de pescador abastado. Ajustou seus dois baldes com letras de tintas de pintar paredes bem ao lado das esguias canas, meteu seus chinelos de dedão junto dos trapos dentro das mesmas e deu-se aos preparos finais.
Calçou sua cabeça com um chapéu camuflado de cobrir orelhas, pescoço e pala saliente a encobrir seus olhos e, em actos contínuos de mestria conhecedora, entrou na água de mansidão verde, cor de esmeralda, iscou seu ínfimo anzol na ponta dos cento e cinquenta centímetros, mais coisa menos coisa e, apontou a água num indefinido ponto de horizonte bem na curva como se fora num longínquo paralém. O pedaço de quase nada penetrou na água.
Assim e num repentemente, daquele lençol aguado, não demorou muito a puxar da água um peixe reluzindo pintura de prata chamado de xexéu. A cada lançada, novo peixe metido em seu pequeno balde pendurado no pescoço com um baraço de tira larga. Não demorou a ficar bem cheio com outros pequenos variados peixes daqueles que depois de fritos na forma crocante fazem babar vontades de apetite.
No transbordo do peixe da lata pequena para a outra grande na areia e, muito perto de mim, o senhor olhando para minha ansiedade falou: - Moço, quer pescar? - Quero! Foi a resposta. Já com meio corpo dentro de água, apercebi-me da pequenez do anzol na forma de unha de gato quando enfiei um pedaço de camarão cru passado na pega entre os grossos polegar e indicador do senhor pardo matuto.
Enfiando pedacitos de camarão cru, fui lançando frustrações seguidas de ansiedade do vai ser agora e, bolas, pica, pica e num lança e tira e mete o isco, dá repelão e fugiu o filho da peste; assim num nadica de nada de só mesmo a picada, talvez por falta de jeito ou mesmo sorte fui lançando muxoxos de sundiameno aos pequenos roncadores. Assim apontando o horizonte fui ficando cansado dos pedaços frustrados de coisa nenhuma até que resolvi dar continuidade à minha talassoterapia.
Num meche perna, num torce e estica e roda, alonga braço e salta endurecendo músculos meus aperreados de tempo, idade e moleza, ele o senhor fala de novo: - Como é seu nome? À pergunta feita e respondida iniciámos falas de aproximação, nome de peixes, este é bom, este é espinhoso e assim por diante sem recta definida.
Meu nome é Isaac, estou meio aposentado e ainda vou mexendo com minha macarronaria, sabe! Deduzi que isto tinha algo que ver com macarrão, massa de comer mas e, entretanto enquanto lança o caniço acrescenta: - Macarronaria do Isaac! Fica ali mesmo na paralela da Durval Guimarães, depois do Bom Preço, vira à direita, vira à esquerda e, é logo ali.
Negócio na parte baixa e residência no lado de cima. Hoje tenho de levantar dinheiro no banco para pagar aos meus seis empregados, visse! Agora, eu só fico entre as dezoito e vintiuma horas – meu tempo já foi, noé!? Pois! Disse eu poupando as falas entre outras ouvidas bem mais interessantes. Vá até lá seu António – vá provar minha macarronada de camarão, gostosa de roer vontade! Acredito seu Isaac, irei sim senhor!
Já quase no ir, foi-me dizendo que voltaria sábado a horas de maré alta que é quando o peixe pega. Hoje é quinta-feira e, talvez no sábado próximo lhe pergunte pelo biónico personagem, o tal de General Emérito Fala Kalado, meu amigo de velhas antiguidades; quem sabe não é seu freguês lá na sua venda tasca ou lá o que seja, talvez restaurante. Quem é chambeta de pena falsificada e tem uma orelha plastificada decerto, sempre ficará preso na retina da ideia.
Sabendo eu das particularidades de FK, dos gostos de matumbola reciclado em gente, dissimulado nas manhas e sempre prazeroso no trato, que gosta de whisky puro como quem só é fanático de água, bem pode ser um seu dissimulado cliente mesmo que o seja no incerto pois que, o personagem não é muito de usar roteiros rotineiros, um defeito desses propícios modos de surtidas com tocaias. O hábito faz o monge talqualmente os tempos sangrados servem para assossegar segurança. Tomei um gelado Kibom com sabor a graviola e segui o rumo de casa a pensar de como vai ser o futuro, dos altos prazeres…
Muxoxo é uma espécie de estalo que se dá com a língua aplicada ao palato, em sinal de contrariedade. No M´puto costumam chamar de “chocho", com o sentido de beijo.
O Soba T´Chingange
“Olha a cabeça do Zezé, será quele é!?” … Será que ele é? Há problemas, trauteei!? Reconheci-o pela cicatriz que baixa da sua falsa orelha até ao meio do queixo papudo – Há batalhas que não adianta ganhar e outras que vale a pena perder. - 03.03.2019
Escrito por – José Eduardo Agualusa
Por
T´Chingange, vulgo António Monteiro . No Nordeste brasileiro
Livros em cima do criado mudo (mesa da cabeceira)
1 - A minha Empregada - Editorial Estampa de - Maggie Gee
2 - O ano em que Zumbi tomou o Rio - Quetzal - José E. Agualusa
3 - O Último Ano em Luanda - ASA - Tiago Rebelo
4 - BURLA EM ANGOLA – Burla em Portugal - Guerra e Paz – Susana Ferrador
5 - História da riqueza de brasil – Estação Brasil – Jorge Caldeira
6 - GLOBALIZAÇÃO de Joseph E. Stiglitz
7 – VIDAS SECAS – Graciliano Ramos
8 - A viagem do Elefante – José Saramago – Da Caminho
9 - O Livro dos Guerrilheiros de José Luandino vieira - Da Caminho
10 – O CORTIÇO - Romance de Aluísio de Azevedo – IBEP – S. Paulo, Brasil
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Eram 5.55 horas deste dia. O telefone tocou!... Preparava-me para ir à Praia da Pajuçara - deposito a xicara de café Santa Clara ainda muito quente no balcão de granito preto. Surpreso pela hora tão matinal e com o carnaval a desfilar na televisão tão cheio de cor no sambódromo de São Paulo penso: Quem será!? Vou atender pensando ser a Margarida a dizer que afinal, mesmo depois de passar a noite na refrega do samba do Jaraguá, sempre vai à praia. Atendo com um alô, alô! … Num espanto de quase susto, ouço: Sou o José Agualusa, o dono do Zumbi!... E, segue-se um espaço descolorido em cima dum branco fosforescente… Caramba é ele, o próprio! - Mas que prazer, disse assim meio tremendo de emoção com um formigueiro nos gémeos das quinambas. O José Agualusa!?
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Mas que prazer, repeti de forma escusada, meio encafifado e, ainda tendo na cabeça a musica “Olha a cabeça do Zezé, será quele é!?” … Será que ele é? Há problemas,… trauteei!? Não! Diz Agualusa meio a rir-se de meu titubear feito bobagem de susto! Não, diz ele do outro lado da linha… (uma pequena pausa, creio que um gole de whisky, dum surdo e insuspeito gluk…gluk…)… É para te agradecer pela propaganda que tens feito do meu livro do Zumbi!
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Também para te desejar um bom carnaval!... Estou em Curitiba num “Work Shop literário” e ontem vi alguém que tu descreves nas tuas mokandas do Kimbo! Também na Kizomba! Alguém que anda por aqui a farejar negócios - reconheci-o pela cicatriz que baixa da sua falsa orelha até ao meio do queixo papudo, disse isto como se eu apreendesse a mensagem vendo a figura. Não sei do que falas nem de quem falas! Disse eu, muito verdadeiro na surpresa. Nem tampouco conheço quem tenha uma orelha postiça. Pois, eu assim disse: - Não sei de quem falas amigo? Ele, o Agualuza, tinha sido meu vizinho lá no Huambo, podia dar-me a estas íntimas aproximações… Afinal quando ele cresceu, eu estava na Caála (Robert Williams).
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Resposta rápida: Do teu personagem Coronel Fala Kalado, o morto vivo! Pópilas… (eu, no discurso directo) nem sabia que assim era! Às tantas até tem uma perna de pau que vira metralha ou catana em casos de periclitãncias e, eu sem saber. Pois é! O cara andou por aqui rondando. Não fosse eu saber de vossas relações e nem te iria perturbar a esta hora! Assim, como quem demonstra estar muito ocupado e após um Hic…Hic… xuk…xuk…krás…krás disse: - Fui! E, foice, digo foi-se mesmo!
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E, eu que fazia o Coronel emérito das FALA estar bem perto de Poconé a traficar armas em troca de pó feito chocolate de canábis lá para os lados da Bolívia. Assim confuso, resolvi desvendar um pouco mais de sua escrita matrix das guerrilhas do Morro da Rocinha, lendo e relendo sem conseguir atinar na quietude do desassossego. Como é que descobriu meu telefone deste mukifo? Coisas por desvendar. E, que quereria ele dizer-me com esta descrição do cara ter na cara uma cicatriz bem por debaixo da orelha esquerda que era falsa. Vou-te contar (disse de mim para comigo mesmo!)
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RIO DE JANEIRO, IPANEMA, CLUBE FRANCÊS, NOITE – Na zona do CV – Comando Vermelho; Euclides, o jornalista, levanta a voz: Ouviste o que te disse? – Ouvi. O Presidente baicou… (morreu…) - E não te interessa? Francisco Palmares franze as sobrancelhas. Toda a sua atenção está concentrada no grande mapa da sala de comandos. Coloca e retira alfinetes. Desenha círculos a tinta vermelha em redor de determinadas posições. Enlaça os dedos e estala-os. Finalmente volta-se para o jornalista: - Então o velho baicou? Morreu como? – Faleceu durante o sono, enquanto fazia a sesta, ele era do tempo em que ainda se fazia a sesta. Ataque cardíaco. Foi Monte quem o encontrou… (parecem referir-se ao JES, o dono d´Angola)
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- Monte? O nosso amigo tem um talento especial para encontrar defuntos… Diz isto distraído e retoma o trabalho. O destino de Angola já não o entusiasma. Euclides senta-se numa cadeira. Abana a cabeça. Afaga perplexo o farto bigode. Aborrece-o o alheamento do outro: - Pensei que te agradaria a notícia. A morte do Velho vai abrir caminho para a democracia plena. O regime está a viver os seus últimos dias. Se a vossa aventura tiver um final feliz, entendes?, se o Governo aceitar as vossas condições … (este governo, é referente ao Brasil do tempo do PT - José Inácio, ainda liberto…) Pois tu não entendes, coronel?!...
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Se o José Inácio amnistiar toda a gente, podes depois regressar à Luua (Luanda). Francisco Palmares enfrenta-o de novo. Desta vez olha-o com intensidade. Pousa a mão nos ombros dele. Euclides sente-lhe a febre. Uma serena tristeza: - Eu já não volto meu kota. Não terei a alegria de morrer na Luua. Primeiro porque encontrei o meu destino. E depois, talvez nem se chegue a um acordo com o Governo (de novo o Brasil), talvez não haja um final feliz. A coisa aqui está a ficar preta (feia)… - O que dizes? Tu sabes que temos problemas…
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Começa a faltar comida na cidade e, como dizia a minha avó, em casa que não tem pão todos ralham e ninguém tem razão… Há divisões no movimento (do CV-Rio - Comando Vermelho), tem gente que quer assaltar os supermercados, os armazéns…Está a ser difícil lidar com algumas pessoas… O jacaré!?... Olha, por exemplo, o Jacaré. Muito destes mwadiés não têm formação politica. Em Angola vivemos um processo semelhante, não foi?, em setenta e cinco, quando o partido do M decidiu recrutar o lumpens (?), a bandidagem dos musseques, gente habituada a fazer tiros… Mas não eram militares, faltava-lhes a disciplina… (refere-se aos pioneiros e outros desclassificados). E a seguir, ainda por cima, para saldar a dívida, deram-lhe cargos de responsabilidade… (de cabos fizeram generais num piscar de olhos).
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- Pareces o teu pai… O meu Pai? O erro do meu pai, kota, aquilo que o perdeu, foi nunca ter sido capaz de passar das palavras aos actos. Democracia plena em Angola? Não, não penses nisso. Vai ficar tudo na mesma. (já Agualusa feito osga, estava a ver o filme bem afrente, com o laranja JL…). Há batalhas que não adianta ganhar e outras que vale a pena perder. Como assim? – Em Angola talvez seja possível derrubar o regime, mas não vai mudar nada. Aqui (Referia-se ao Brasil), ao contrário, podemos até perder esta batalha. Mas, depois da nossa derrota, acredita, nada será como antes. Mesmo derrotados, teremos vencido.
(Continua…)
O Soba T´Chingange
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