CINZAS DO TEMPO – Outra vez mo reino das aroeiras …
MALAMBA: É a palavra.
Por
Saí de casa com a luz ténue entrando pelas frinchas das persianas das janelas; já se ouviam os melros e gaios lá fora piando suas espertezas matinais. Rodei na cama para a esquerda, para a direita e não havendo hipótese de ficar na sorna de olho aberto, preparei-me ao jeito de passear o cão e, de roupas folgadas e com minhas botas de galgar o Kwazulu Natal, calções de caqui, fiz-me ao caminho, o carreiro habitual. Meu cão proletário, um chouriço com leves traços de collie barbudo, saudou-me com suas quatro patas; naqueles meus propósitos, não lhe foi difícil adivinhar que iriamos passear à praia, andar na falésia por cima das furnas.
Não há maior religião do que a verdade! A pensar nisto, internei-me no mato que bordeia a costa rendilhada em falésias até à Cama da Vaca. Passei por praias que lá no fundo contrastavam sua areia doirada com o verde e azul do mar com algas bailando ao sabor das pequenas ondas e, já no torreão no alto da falésia entre a praia do Mato e a praia da Lapa pude ver o redondo da terra com seu horizonte de um azul nublado coladinho ao céu. É de todos, o meu passeio preferido, andar nos trilhos de entre estevas, funchos, zimbros, aroeiras e espargos floridos com suas muitas flores de cores variadas, cores de fim de Maio.
Aqui e além poças nas rochas lavadas aonde os pequenos mamíferos e diversos pássaros saciam sua sede; poças de onde recolho poejo para fazer minhas açordas com pão alentejano. Mais adiante também recolho uns ramos de tomilho dum fresco verde. O faísca, meu velho cão, arfando, também ali pára a satisfazer sua sede. Coitado, já vai com a língua a arrojar o chão! Foi neste então que vi o quanto me está a fazer bem o milongo que meu amigo da onça do Porto-à-mão me indicou para tomar: - Extracto de guaraná em pó, beterraba em pó, ácido pantoténico, pó de algas mais uma catrefada de vitaminas! Isto de misturas com levedura de selénio e extracto de cúrcuma é mesmo bom!
Neste reino da aroeira surgem tufos de palmeira anã, daquelas que a tia Anica de Loulé fazia seus capachos para abanar seus calores e sua lareira. Também se encontram pinheiros, zimbreiros, tomilho, rosmaninho, zambujeiros, trovisco e arranha cão entrelaçado em malvas dos barrancos, espargueiras e arruda de cheiro intenso de fazer defumações para espantar maus espíritos.
Há isto e muito mais, plantas ainda não catalogadas em minha memória, de flores bonitas que saem às primeiras chuvas e que mostram sua beleza até serem fecundadas e, depois morrem de novo ficando ali enterradas por mais um ano. Os mistérios da vida neste mundo vegetal são enormes e para quem quer quebrar a rotina, fazer passar o stress de coisas desavindas, sigam por aí nesse carreiro que até está assinalado a azul na forma de azulejo cimentado de quando em quando em rochas mais salientes. Haja vontade de ver e, decerto se alegrará com estas pequenas coisas.
As alfarrobeiras podem ser vistas ao longo da falésia. O alvoroço da primeira hora é o melhor porque não é só o pardal que chilreia, o pombo bravo que arrulha, um sem número de gralhas que esvoaçam no promontório defendem-se dos gaviões ou mesmo das gaivotas que por ali intimidam relações. Talvez até veja uma raposa (já foi normal encontrá-las). Faça o favor de ser feliz, um dia de cada vez!
E, lá fomos nós por entre fragas, no fundo do vale e nos cumes do reino das aroeiras, um reino de largas vistas e de onde se vê um mar enorme confundindo-se com o céu e sem uma nítida separação do distante nevoeiro trazido pelos ventos alíseos, um cheirinho do Saára ou da brisa do Siroco.
Rascunhei-me em cardos, arruda, estevas e chorões com flores lilases, cores vistosas; subi e desci arfando, resvalando com o cão soluçado em vapores com língua de fora. Neste meu passeio foito entre toutinegras, gralhas e pombos bravos encimados em buracos escarafunchosos e esbarradoiros, as lagartixas miram-me curiosamente como se fosse um agente do além.
Nestas terras do meu latifúndio, com oliveiras bravas, carrascos, arranha-cão e zimbros entre pedregulhos calcários, corro o risco de apanhar carrapatos, mas tal como os afoitados desbravadores de terras por conhecer, adentro-me aquém bombordo mirando o estibordo como um tal de Cadamosto que às ordens do D. Henrique e de cabo em cabo chegou em tempos idos à Gâmbia.
Lá em baixo barulhando-se ora perto, ora manso, ora longe mais encapelado, o mar testemunha o que construo a cada passo uma estória ao meu modo; um mussendo, um missosso entre ave Marias encavalitadas de prefácios que se baralham e que logologo se esquecem; esticando os ossos, construo-me a cada passo na estória e, vem outro e mais outro muxoxo como que cumprindo ordens dos meus espíritos a quem risco na areia os sinais do cho-ku-rei ou do sei-he-ki. Um lugar nobre e muito cheio de adrenalina com iodo que de certo modo nos inebria. Um Pambu N´gila como é costume eu dizer…
Aquele senhor Cadamosto, que descreveu as primeiras descobertas além-fronteiras do M´Puto cumprindo ordens do Senhor rei e príncipes consortes, desconhecia todas estas modernas finuras de dialogar em coisas etéreas. Sempre veremos coisas novas se o quisermos, se tivermos vontade para isso e, não é forçoso ter um qualquer rei por detrás, um presidente ou um outro qualquer decadente. Chegado a casa escrevo os lembrados prefácios encavalitados nas arbitrárias e aleatórias recordações daqui e dali, do meu mundo, só para ginasticar a mente. Um dia de cada vez. (Ufa! Terminei!…)
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