TEMPOS PARA ESQUECER – 19.08.2016 - ANGOLA DA LUUA XIV . NA GUERRA DO TUNDAMUNJILA. … Nesta lengalenga de lembrarmos coisas mortas, cada homem é um mundo - “Consolidação do poder popular” na Luua…
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(…) A Força Aérea transportou o grosso do resto da fracção Chipenda para Gago Coutinho. Nos dias que se seguiram, foram as cantorias a enaltecer o herói Valodia assim ao jeito de rumba com bolero de Cuba do tipo que fez crescer a imagem do Che Guevara; a mística música, enaltecia as contendas da guerra provocando um estado de euforia misturando sonhos de libertação, incentivando o erguer de punhos, catanas e armas que rebentam casas, gentes de fazer fugir o capeta, como se estivessem a defender uma Baia de Cienfuegos.
Lá a Sul daquela Angola, fazendo meus trabalhos de urbanismo na Câmara Municipal da Caála, afligia-me tal situação. Era neste então Secretário de Informação e Propaganda da UNITA do Comité da Caála. Pensei que poderia assim contribuir para a boa ordem na região que até aqui se tinha mantido pacífica, o planalto do Huambo. Jonas Malheiro Savimbi "leader" da UNITA esperou ir a Nova Lisboa depois de estar legitimado pelo acordo de Alvor e, chegou triunfalmente tendo a recebê-lo mais de meio milhão de cidadãos. Esta recepção triunfal aconteceu a 28 de Janeiro de 1975.
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Savimbi o “Mwata”, estava em alto neste então, sendo considerado o mais moderado e com ideias mais viradas para o progresso de Angola. Os militares do CR, portugueses, tentavam manobrar sua imagem tirando dividendos do confronto com um MPLA cada vez mais radical e raivoso. Savimbi ia acompanhado por seu secretário-geral do movimento, Miguel N´zau Puna, e doutros elementos ligados à UNITA; chegou ao aeroporto de Nova Lisboa (Huambo) cerca das 10.30 horas com uma surpreendente multidão a esperá-lo.
Os jornalistas que fizeram a cobertura do acontecimento referiram ter sido um espectáculo altamente elucidativo da "força" que aquele tinha no planalto central. Toda a zona do aeroporto estava apinhada de gente que, entretanto, qual rio caudaloso, se escoava por toda a parte nos quase três quilómetros que o separam da cidade propriamente dita. Neste tempo e até o mês de Junho sentia-me confiante mas, não foi possível conter a tarefa de rebelião que o MPLA todos os dias e à semelhança de Luanda fazia junto dos kimbos assediando gente, revirando-lhes a vontade da mente, alinhar com esta onda de e contra o dito colono que era sempre branco.
Sentia-me acarinhado entre aquela gente laboriosa da UNITA e, numa revisão de tarefas fui indigitado Secretário de Relações públicas! Durante a minha vigência tudo correu dentro de uma normalidade aceitável mas sentia que o câncer da liberdade era venenoso demais para continuar a ser um paraíso. Não me sentia convincente no suficiente. Pouco a pouco fui ficando nada confiante no futuro! E, mesmo falando em comícios dando tranquilidade, não me conseguia acreditar e fazer passar a mensagem a cem por cento! Os brancos, dia a dia abandonavam tudo! Fazendas, padaria, marcenaria serração e tudo o que se define como actividade comercial. O câncer alastrava…
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Num repente já nem tinhamos médico, no outro dia já não havia enfermeiro; um e outro iam zarpando de avião, carro ou comboio. Ia ficando no dia-a-dia um deserto sem a gente capacitada para gerir o que quer que fosse; já não tinhamos veterinário nem mecânico que curiosamente ou não, já tinha vindo refugiado anos antes do Congo, e o desespero quer se queira ou não, um dia chega! Ninguém é permanentemente de ferro! Em uma ida na carreira EVA levei minha sogra a Luanda em Julho e, foi quando deparei com o caos à medida que me aproximava da Luua.
Havia controlo de zonas, primeiro da UNITA e depois para lá do Alto Ama eram da FNLA, do MPLA, assim uma coisa de filme tipo guerrilha do Ruanda como Tutsis e Hútus e marginalidades ao jeito de “apocalypse now” com gente não habilitada para zelar pela ordem, gente drogada que nem falar sabiam! Em Muquitixe mandaram sair os passageiros do machimbombo e ali ficamos encostados a uma casa esfolada de tiros; assim, esperamos que revoltassem nossas malas.
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Um furriel camarada, farda portuguesa, negro de cor com afectos ao MPLA, a dado momento mostra seu cartão de mando conseguindo convencer a nos deixarem seguir. Estávamos ali brancos, mestiços e negros olhando de soslaio uns para os outros, tendo por fundo um paredão ruina de casa em adobe que bem poderia vir a ser o nosso sítio de dia final! Depois seguiram-se o Dondo, deserto queimado com cães rondando as quitandeiras que vendiam sobrevivência na forma de peixe seco; nada mais!
Nada de sandes, café ou o que fosse e, depois e muito pior, seguiram-se as povoações de Zenza do Itombe, Maria Teresa, Catete, Kassoneca, Colomboloca, e por fim Viana. Uf!... Finalmente, Luanda à vista! O holocausto foi tão cruel, a visão era tão catastrófica que fermentava na minha cabeça a fuga! Não via outra solução plausível. Aquilo era pior do que poderia imaginar; pior que mau ou péssimo! Deixei a sogra e regressei de avião a Nova Lisboa com a definitiva ideia de regressar ao M´Puto. Meu compadre neste meio tempo já estava na Namíbia no campo de refugiados.
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Estava combinado ir com eles mas o comboio de viaturas não podia deixar de seguir seu rumo para Grootfontein com vigilância de uma das NF, forças portuguesas. Cheguei à Caála e descrevi aos meus parceiros manos do movimento que iria inscrever-me no Município nas listas dos Adidos. Falei com Kalakata, o chefe do destacamento militar de Robert Williams e fiz uma despedida de “mais-tarde-nos-veremos”. Kalakata viria a morrer em uma maka organizada, das muitas que sucediam e, um tiro perdido mandou-o pró paralém.
Aquele ataque às sedes do Chipenda em Luanda foi visto com o prelúdio do que aconteceria tanto à FNLA como à UNITA. Holden Roberto, com um tom bélico e a partir do Zaire fez um discurso de aviso ao MPLA de Luanda. Ele não estava ciente do poder de fogo dos comités da acção popular, vulgo “poder popular” dos bairros periféricos da Luua. Ele só fanfarronava de lá de longe com a protecção de Mobutu; seus maus concelheiros só queriam quimbombo com chuço (churrasco de galinha) no espeto…
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Também ele não acreditava que seu exército bem equipado e formado, poderia ser saraivado de balas pela guerrilha urbana, pelas balas G3 ofertadas pelo Alto-comissário Rosa Coutinho e seus guedelhudos capangas formados no Sarajevo e Praga, oficiais progressistas do M´Puto que queriam virar o mundo do avesso; o nosso mundo! Este passado tão inglório, tão medroso, tão traiçoeiro, foi ficando um sítio demasiado perigoso!
Por detrás daquele poder popular estava gente com raivas sem freio, mulatos abandonados pelos pais, brancos sismosos de Che Guevara, vizinhos muito doentes nas filosofias esquizofrénicas e pretos que nem sabiam o que isto era, todos comandados além do Valodia, do Monstro Imortal, do Lúcio Lara, do Iko Carreira e uma parafernália de gentinha má e mesquinha, mal formados, também por militares de aviário formados em quarteis do M´Puto às ordens dum tal de Concelho da Revolução e adjacências…
(Continua…)
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