ANGOLA DAS CINZAS – LEMBRANÇAS RETROACTIVAS - O escuro das nossas vidas era mesmo só a noite, sem cores repentinas…4
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No repouso sagrado das almas, relembro que nós, eu e ele, o Zeca Kafundanga não tinhamos ausências superlativas porque ainda desconhecíamos os métodos de tristeza que a saudade ainda nos iria trazer. O escuro das nossas vidas era mesmo só a noite sem cores repentinas, nem mesmo eram nuvens, só mesmo a brincadeira que fazia o nosso todo no completo com carrinhos de fingir feito com verguinha, restos de obras, rodas com eixos sem semieixos e complicados chassis, tracção às quatro e guarda-lamas; uma verguinha fazia de rodas com larguras de carreiro e, uma outra mais comprida o guiador com espigão a engatar no travessão das rodas, tudo em ferro robusto para durar e com o motor de vruum-vruum saindo do jeito se DKV, se Mercedes, se Fiat, se Chevrolet ou Dodge, volantes de banga e uma pequena mudança de fingir com manete redonda de madeira, berloque de uma velha cama. Os sons de nossos automotores eram mesmo de uma só categoria, bons e duradouros.
Difícil mesmo era fingir o ruido do guincho e correntes quando enterrávamos. De tudo fazíamos brincadeira e, o tempo, nem se dava conta de passar. Entre malta multicolor tudo era galhofa. Sara Chaves, uma cantora nossa vizinha na rua paralela à nossa gargarejava sua voz bonita, eram agudos e graves mais trinados e nós achando graça cantarolávamos também cantigas de só à toa com inventos vocais de merengues e cantigas do chá das seis do Restauração do tal de Luis Montês, empresário de artistas e eventos da Luua.
Por volta de 1957 ou 1958, meu pai Manuel Cabeças, foi para o Lucala em trabalho; estavam a construir uma nova ponte sobre o rio Lucala às ordens do Engenheiro Paiva Neto da Brigada dos caminhos de Ferro do Norte; refiro o nome deste engenheiro porque mais tarde também veio a ser o meu chefe na mesma Brigada da Divisão de Estudos e Construção. Sucede então que Kafundanga já com os seus dezassete ou dezoito anos foi levado por meu pai para trabalhar como cozinheiro; ele tinha a seu cargo fazer a comida para aquela gente que viviam em barracos em forma de acampamento circular, telha de zinco.
Havia nele chinguiços ao redor com arame farpado a impedir invasões de bichos, predadores; havia também umas latas a fazer de archotes que ardiam iluminando de noite o recinto e também com o objectivo de afugentar felinos que por ali se vinham esfregar no óleo derramado. Fiquei nesse então a saber que as ditas bestas, hienas, mabecos e até leões, faziam isto para se livrarem de carrapatos que a eles se agarravam. Soube disto em uma visita que fiz quando de férias, viajando em magirus, uma aventura e tantos por essas picadas de terra, atasca aqui, desvia acolá e, assim durante dois dias pude rever as aventuras de Kafundanga em sua nova actividade; eu, o patrão-menino ali estava recolhendo as farpas das estórias que virão a seguir nos retroactivos de estórias desse então.
Eram tempos em que nós nos entretínhamos com tudo sem espantos arrepiados ou prefácios elaborados. Mas desta feita fiquei a saber que meu pai ficou umas três horas encavalitado numa nhiwa, uma árvore parecida ao longe com o embondeiro e, porque em um certo dia que se afastou do acampamento para recolher um certo cacto próprio para fazer um certo chá, ele se viu acossado por um solitário, uma pacaça ferida e isolada da manada e, que investiu sobre ele! Ficou por ali em cima gesticulando com sua catana até que um companheiro dando por falta do Cabeças, desferiu um tiro de zagalote bem no crânio do corpulento animal. Foi carne desta peça de caça que eu comi e, ainda me lembro do seu forte sabor a ervas.
Monangamba - trabalhador sem especificação, faz-de-tudo (por vezes pejorativo).
(Continua…)
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