NAS FRINCHAS DO TEMPO
"DOS TEMPOS DE DIPANDA“ - Crónica 3536 – 07.01.2024
“Tropas cubanas para Angola, já!” - “Missão Xirikwata”
Às margens do Cubango - Escritos boligrafados da minha mochila
– Aleatoriamente após 1975 e, ou entre os anos de 1999 a 2018
Por: T´Chingange (Otchingandji) – Em Lagoa do M´Puto
Pude saber pela Wikipédia e outras vias, que o Coronel Raúl Diaz Arguelles que desembarcou em Luanda em Agosto de 1975, utilizando o pseudónimo de Domingos da Silva, era o encarregado de supervisionar e treinar as tropas do Movimento Popular de Libertação de Angola – MPLA. Distinguiu-se, em particular, na Batalha de Kifangondo, ocorrida a 10 de Novembro de 1975.
Apoiado por 88 soldados cubanos, pseudo “exército do MPLA”, esmaga as tropas da FNLA de Holden Roberto, que estavam em número muito superior contando com apoio de combatentes do Zaire, mercenários portugueses, tropas sul-africanas e brasileiras, além de agentes da CIA. Ele, foi o comandante da Operação Carlota, numa altura em que os grupos guerrilheiros deixaram de combater as tropas portuguesas já no seu estágio final.
No desenvolver da contenda militar, este Coronel Arguelles, a 11 de Dezembro, consegue com uma pequena coluna, emboscar por detrás a aldeia de Galengo, tomando-a durante a batalha designada de Ebo. Porém, os estilhaços de uma mina antitanque, que explodiu, cortaram a artéria femoral do coronel Arguelles, tendo sucumbio aos ferimentos.
Saltando os acontecimentos, teremos de recordar Arnaldo Tomás Ochoa Sánchez que foi um general-de-divisão das Forças Armadas Revolucionárias de Cuba. Considerado Herói da República de Cuba acbou por ser condenado em julgamento militar público junto aos outros altos oficiais Antonio "Tony" de la Guardia Font, Jorge Martínez Valdés e Amado Padrón Trujillo, à pena capital.
Assim, por alta traição à pátria produto de acusações de atividades de narcotráfico, foi fuzilado a 13 de julho de 1989. Teatralmente, acusou-se a ele e a mais treze implicados de se contactar com narcotraficantes internacionais; traficar ilicitamente cocaína, diamantes e marfim; também por utilizar o espaço aéreo, o solo e as águas cubanas para actividades de narcotráfico; e envergonhar à Revolução com actos qualificados como de alta traição…
Segundo “O Observador”, Juan Reinaldo Sánchez, ex-guarda-costas de Fidel Castro, revela num livro, o alegado envolvimento do líder histórico cubano Fidel de Castro, no tráfico de droga, tendo dito à Lusa que Havana queria controlar os recursos naturais em Angola. Assim relatou: “Fidel Castro queria mais de Angola. Dizia que ia levar de Angola apenas os mortos, mas em realidade, não foi assim.
Juan Reinaldo Sánchez afirma: - Eu vi no gabinete de Fidel Castro uma caixa de tabaco repleta de diamantes - a caixa estava cheia”… “Fidel, através do seu ajudante José Naranjo e do secretário Chomy, mandou vender esses diamantes e depositar o dinheiro nas suas contas bancárias fora de Cuba”; foi o que disse à “Lusa” o homem que tinha sido guarda-costas do Presidente cubano durante 17 anos. “Eu tenho informações e, além do mais vi. Fidel tinha outra ideias com Angola. Essa ideia sobre o internacionalismo proletário; essa ideia de ajudar os irmãos africanos; essa ideia de ajuda entre os povos é pura propaganda. É um mito”…
Juan Reinaldo Sánchez, ex-guarda-costas de Fidel sublinhou, referindo-se ao envolvimento de Cuba com o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). As memórias do elemento do círculo de segurança mais próximo da cúpula do regime cubano é autor do livro “A Face Oculta de Fidel Castro” que foi lançado em Portugal. Um livro que inclui não apenas questões internas de Cuba, mas também o envolvimento de Havana na guerra em Angola, sobretudo a “Operação Carlota” em 1975 e a batalha do Cuíto Cuanavale, no final dos anos 1980.
(Continua…)
O Soba T´Chingange
KIANDA COM ONGWEVA - XXI de várias partes…
– Crónica 3316 de 14.06.2022 – Republicada a 07.12.2022 na falsa savana do Alentejo do M´Puto
MUXIMA NAS FRINCHAS DO TEMPO - Falar do futuro, até para as kiandas é tabu…
Ongweva é saudade
Por T´Chingange (Ochingandji)
Quem se mete com kiandas fica kiandado ou oxorizado. Morgan Tsvangirai o pai de Roxo ficou avençado pelos Mwana-Pwós com o posto de tenente de segunda linha mandando os escravos m´bikas do kimbo fazer tarefas de soberania. Nesta tarefa de contar a estória lá teremos de ver para onde correm as águas de navegar na boleia da correnteza e eis que do lugar distante de Pernambuco e suas capitânias adjacentes, no reino de Terras de Vera Cruz, estavam carentes de braços para fazer o cultivo da cana para fazer andar os engenhos de assucar.
Os pormenores que podem até ser pensados insignificantes, têm de ser descritos para haver um melhor entendimento nos grandes gestos nos feitos, dos obreiros sertanejos e Mwana-Pwós em lados quase de mesma longitude mas afastados por um oceano na Latitude – Mar kalunga dos iemanjás - os Orixás das águas salgadas, mãe dos demais orixás; Rainha do mar, Mãe das águas ou mãe dos filhos-peixe. Filha de Olokum, dum Iemanjá que foi casada com Oduduá, com quem teve dez filhos orixás. Bom! Latitude serão os movimentos destes ao longo dos meridianos; ao longo do equador ou linha paralela a este.
A preguiça na cultura dos índios americanos dos brasis não permitia seu uso no trabalho – isso era tarefa de mulher e gente, dada ao desprezo. Talvez por isto, seus lugares tenentes mantinham contacto com alguns negreiros portugueses que detinham este negócio, pagando-lhes ainda mais do que a antiga coroa determinava. Era um quase pacto de negócio mantendo-os como principais fornecedores de peças á margem dos interesses dos reis do M´Puto.
As ordens que vinham do Conde Maurício de Nassau a partir de Olinda eram de subornar a todo o custo os intervenientes funantes do mato de N´Gola no negócio escravo. Estava em causa a política comercial da Companhia das Índias Ocidentais... O lucro! E, Portugal que era agora pertença dos espanhóis não havia por isso empenho nestas políticas de tanto trabalho; preferiam estabelecer severas taxas de soberania aos amarídeos de seus territórios com pagas em ouro.
As mordomias dos reis Filipe de Castela, Astúrias, Galiza, Catalunha Portugal e Andaluzia eram muitas - isso impunha uma política restritiva, sem dispersão. A tia da Kianda Roxo, N´ga Maria Káfutila de linhagem nobre do reino do Kongo ajudava Januário Pieter na quinda do mercado da paliça vendendo malavo e quitoto ou permutando com os indígenas ou mesmo n´gwetas produtos da terra como ginguba e fuba de mandioca.
A fuba originava um prato apetecível chamado de funje ou pirão, um preparo a partir da mandioca. E, ela, a Roxo, tornou-se assim uma cozinheira de primeira mão mas, no correr do tempo preferiu lançar suas fluorescências em pinturas. Por obra desconhecida ou talvez de *Olokun rodou trezentos e sessenta graus confundindo essas tais de Latitude e de longitude; hoje dificilmente frita um ovo! A casa dela nem cozinha tem… Ainda intentou fazer uso das folhas do pau de mandioca que era passada por cinco fervuras para anular o veneno da coisa e, desistiu a favor da Saka-Saka.
Agora a isto chama-se assim de Saka-Saka sendo impregnada de azeite de palma, um prato mais típico e requintado. De saber que ainda hoje e do lugar natural dos Mafulos (Holanda), daí advém em latas deste produto enraizado naqueles idos tempos e que perdurou - um caso menor mas de importante e curiosidade de no decorrer do tempo, ali e em todos os povos de fala francesa.
Kiandas e calungas! O tempo, na mística espiritual de N´Gola, não tem fidelidade à linha do tempo, anda do agora para trás e, se sabe no depois, nunca o diz! Também tem medo de virar poeira como o Plutão… O futuro é já a seguir… Como se diz, a calunga ou kianda é assim como um vírus de computador que sem se ver, se faz notar. Nossa kianda Roxo veio como Assunção por alguma razão que, nem ela própria sabe! Melhor seria Ascensão mas quis a semântica do uso dar-lhe esse quase igual nome. Podia ser só Maria mas quis o encontro com as calemas do destino encontrar o T´Chingange que estupfeito com suas bizarras cores do além e seus mágicos gatafunhos psicadélicos, simbiose de Naif com Dali, ascendeu aos espíritos. E, em viagem por esse Universo distribuindo alegrias tomando muito chá de funcho e oliveira a controlar sua intensidade de fazer gaifonas à vida, T´Chingange anda agora beulando porque não mais soube coisas da Oxor, a kianda espelho de Roxo. Acho que sim! Seguiu o rumo de Plutão, fez uafo, uafou…
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*Do Olokun: Para as águas do mar, Olokun, Ye Olokun, Ya Olokun, são pontos de areia. Os destinos brilhando num só Olokun - Ye Olokun, Ya Olokun… Na cultura africana, Olokun possui diferentes representações, em alguns locais ele possui características do sexo masculino (Yorubá) e em outras, do feminino (Ifé). Mas em todas suas formas ele tem o corpo metade peixe e metade homem.
GLOSSÁRIO: Kalunga - mar; Kianda - sereia; Kituku - mistério; Kúkia – sol nascente; Ngana NZambi - Senhor, Deus; Mafulos - Holandeses; Kuatiça o ngoma! – Toquem os tambores;Tambulakonta – toma atenção, cuidado; matona – peixe da bahia da Luua; Luua – Diminutivo de Luanda; kifufutila ou kafufutila – perdigotos ao comer e falar ao mesmo tempo; Xipala, T´Xipala – foto; Malamba – palavra; átoa – de qualquer maneira; beulando – passeando o abandono; uafo – morte, morreu…
(Continua com “fricção”…)
Por: Soba T´Chingange (Ochingandji)
MUXIMA - ROMEIROS DO TEMPO
FÁBRICA DE LETRAS DO KIMBO - 25.04.2019
Por
T´Chingange - No Nordeste brasileiro
Em 1599 o agora santuário da Mama Muxima, logo se converteu num importante destino de muitos romeiros idos de várias partes de Angola e do resto do Mundo. Foi neste Centro de Cristianização, aonde se baptizavam os africanos antes de embarcá-los como escravos para diversas localidades, mas em especial para as Américas.
Tornou-se, igualmente, um importante espaço devocionário para as populações cristãs autóctones, que logo atribuíram, à Senhora da Muxima, a realização de diversos milagres. A festa religiosa da Mamã Muxima tem seu normal início em Setembro e, a missa solene de abertura sempre é celebrada por um ministro apostólico de Angola.
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Muxima, um local de quase quatro séculos de devoção de fieis católicos, continua a atrair centenas de milhar de peregrinos; este ano deverá ir aos 250 mil fieis. A primeira peregrinação a Muxima, aconteceu em 1650 quando se repôs a imagem da santa no altar-mor de uma capela de pau-a-pique que o Kwanza engoliu numa de suas cheias.
Os Holandeses (flamengos - mafulos), adversos à religiosidade, tinham sido expulsos de Angola por Salvador Correia de Sá e Benevides. A kianda de minha criação, Januário Pieter de Cabo Ledo, um personagem de ficção, enviou-me uma mensagem a recordar este acontecimento e, fiquei sem saber se ainda se encontra em Cádiz da Espanha ou se, se transladou por algum portal do tempo para o seu Kwanza.
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Na porta aberta com o passado, encontro no presente os sonhos que se baralham sem ordem cronológica; não é de admirar que a escrita dos encontros tenha um capricho louco de andar à frente dos acontecimentos.
Não importa, kianda é livre de andar no tempo e, neste momento, recorda-me a Muxima cujo reitor se chama de Januário Bernardo, assim era no ano de 2009, dez anos atrás talvez um seu conterrâneo ou um primo de gerações passadas.
Esta devoção do povo inspirou vários escritores angolanos, que, apesar da ampla devoção por toda a população católica angolana, Nossa Senhora da Muxima não é considerada padroeira de Angola pela Conferência Episcopal.
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A imagem de Nossa Senhora da Muxima foi atacada a pauladas por um grupo pessoas pertencente à Igreja da Arca de Noé durante a missa dominical no ano de 2013. O ataque visava ao combate a uma suposta idolatria. A imagem entretanto foi totalmente restaurada.
Mamã Muxima está sempre de braços abertos dando "graças, paz e protecção divina" disse Januário Bernardo. Muxima, Cabo Ledo, Massangano, Sangano, Calumbo, Bom Jesus e todo o Bengo sempre fica em festa nesta altura.
Minhas antigas Kiandas de Toledo decerto não faltarão; as boas e de muito "Suco", como "Simbi" e sua comitiva de "Mutakalombos", os Mwana-Pwós e toda a comunidade Kalunga. Muxima,... um dos lugares místicos de África. Um verdadeiro "Pambu N´Jila"...
O Soba T´Chingange
METÁFORA DA VIDA – 30.12.2017
- FOTOS AMARELECIDAS DA E.I.L. DA LUUA – Se, em um aleatório lugar vires um oprimido, não te surpreendas - tem outro mais alto que o vigia…
Por
T´Chingange
Ontem revi fotos de antigamente, de quando terminei meu Curso de Montador Electricista da E.I.L. - Escola Industrial de Luanda. Quando sucedeu a guerra do “tundamunjila” nada trouxe para o M´Puto, nem mesmo essas fotos que documentaram nossas vidas; isto que descrevo foi da viagem final de curso à barragem de Cambambe - fotos capiangadas da página dos antigos alunos e professores da EIL. Nesta alegria de rever candengues de então noto, foram tempos que nos marcaram.
Coincidiu neste agora e no M´Puto rever no livro dum meu cota amigo e meu vizinho da maianga, rua Dr. Oliveira Barbosa perpendicular à minha com o nome de Dr. José Maria Antunes; trata-se nem mais nem menos de José Luandino Vieira! Tinha nesse então mais dez anos do que eu. Este cidadão, meu camba mais velho, porque teve participação no movimento de libertação do MPLA, deram-lhe cidadania angolana ao invés de mim que sempre andei em outros lados na estória e da guerra de kwata-kwata.
Luandino Vieira foi preso tendo passado oito anos no Tarrafal, sendo libertado em 1972 em regime de residência vigiada na Lisboa do M´Puto. Foi membro fundador da União de Escritores Angolanos até 1992. Enquanto preso descreveu vivências de suas passagens num discurso directo sem rever gerúndios ou particípios e formas gramaticais. Estive com ele há uns bons cinco nos atrás na cidade de Portimão e, foi dele que depois de um fraterno abraço ouvi dizer que nós em Angola tinhamos a cultura do cinema e praia; no resto, eramos inocentemente analfabetos.
E, é bem verdade que assim era! Ele seguiu o rumo da contestação e, é assim que ele descreve em um recente livro, lugares que coincidem com nossa visita àquela barragem de Cambambe. Em seu livro fala a vida verdadeira de Domingos Xavier, um livro só com 97 folhas e aonde revejo o que diz, o fundo do trovão da estória que fez tremer a Luua na forma de chuva de soterrar carros e, aonde uma foto nossa infra colocada, descreve o tubo de descarga por nós visitado.
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Domingos Xavier, nem sei se é uma inventação dele, mas, é em realidade um estereótipo de gente que como muitos, morreu de porrada nos interrogatórios das polícias política e normal, quando e ainda no tempo do Administrador Poeira no lugar de Belas, bem por detrás do então Aeroporto Craveiro Lopes. Com sua pena de rabo-de-junco, escreve que as águas falavam também suas fúrias lá em baixo do paredão, garganta de forma
Num cotovelo do Kwanza as águas indomáveis doutro tempo agora retidas, de novo ali saíam contando as outroras fúrias de montante e a partir do planalto do Huambo aonde nascia. Lá em cima, nos morros, casas pré-fabricadas e de cimento firme, escritórios e barracões-casamatas para trabalhadores, aonde nós alunos finalistas da EIL, pernoitamos. Vimos os alternadores, as grande máquinas diesel e, os tractores; um deles, o manobrado pelo Domingos Xavier esperava por ele.
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É ali que o Kwanza lança os últimos gritos suicidando-se, subindo muitos metros e deixando-se abater lá nas pedras ainda mais abaixo desfazendo a espuma nos contrafortes, muros de defesa que aqueles tractores construíram. Dali, pequenos fios de água enternecem de novo o velho rio. Desde o verde planalto do Huambo trazia rugido que agora reaparece ressoando ecos nas falésias. Zunidos das bolhas turbinadas chispando sua bravura.
Depois a calmaria a passar por Cambambe e Muxima até se insuflar com o sal da barra, lugar de sereias, kiandas e kwangiades a saudar maiores calungas. Recordo nesse tempo ouvir o vento que só gargalhava nos morros na sua força de medrar trovões do céu. Um ressoar de eco a ficar moribundo. Neste muito tempo de descrição Domingos Xavier sentia seu sangue correr muito depressa nas veias, formigueiro nos pés e na mãos no chão da prisão.
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Suas pálpebras iam-se fechando ramelosas nas porradas com xaxualhos estranhos. Tudo assim ficou noite na vida de Domingos Xavier que corria rápido nas cacetadas do cipaio. As ordens de seu chefe, o agente supra das secretas, lhe faziam ver que tudo ficaria mesmo calmo, dentro da noite.
Xavier morre assim mesmo com a própria estória alumiado numa lanterna de óleo-de-palma. Foi então quando as kiandas tomaram conta de si, sua alma de guerrilheiro, chefe dos rios. Eu, juro que não ouvi mas, um candengue seu amigo começou cantar sua tristeza: Uexile kamba diami, Una uolobita. Uafu, Mukonda kajímbuidiê – Era meu amigo, aquele que ali vai. Morreu, porque só ficou calado…
O Soba T´Chingange
ONGWEVA DO TEMPO - KIANDA ROXO – 28.0.2017 - 20ª parte
Kiandas e calungas! De novo em Massangano… O futuro dos povos bantus ainda anda a ser fabricado…
Por
T´Chingange
De novo em Massangano fui ler os catrapázios guardados numa tão velha arca que, até os aloquetes tiveram de ser arrombados com um improvisado escopro e uma maceta com cabo de pau-ferro. Foi assim que retirei um rolo meio a se desfazer muito atacado de bolor estórico com as pontas quase a se separarem por rachadura. Levei à vontade três dias a aquecer o mukifo tão insalubre; entretanto andei pelo mato à procura das resinas apropriadas para enrijar aquele papel em rolo de laço folgado e a se desfazer.
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Com muito cuidado lá consegui estirar a folha, entornar nela o verniz ligeiramente aquecido e, com muita sorte vi que o grudar da resina na velha tinta das letras traçadas com pena de pavão, ressaltaram-nas ficando assim quase salientes e de melhor leitura. Como a sombra, a história tem obscuridades e, foi a palavra escrita na parte superior direita que me despertou ainda mais curiosidade: - Dun. Mais abaixo podia ler-se Balthasar Van Dun, oficial da Companhia das Índias Ocidentais Holandesas.
Sabe-se da estória que quando o almirante holandês da Companhia das Índias Ocidentais tomou Luanda, os portugueses fugiram todos para Massangano, e por ali permaneceram durante a ocupação, até à chegada do luso-brasileiro Salvador Correia de Sá e Benevides, que reconquistou a Fortaleza de S. Miguel, na baía de Luanda em 1648.
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Vim a saber neste então muito posterior àquela onda do tempo que a construção deste Forte tinha também em vista a defesa das redes comerciais de mercadorias tais como cera, peles, dentes de marfim, pedras preciosas mas, e especialmente da venda de escravos às Américas, e também para segurança do presídio de Massangano, que a monarquia portuguesa utilizava como local de degredo.
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Pois é aqui que situo a minha epopeia neste romance mussendo de três continentes por via de seguir a peugada das kiandas, kwangiades ou calungas Roxo e Oxor de Guaxuma. Pois, em uma outra minha andança ao serviço da rainha de Portugal D. Maria I e, com o cargo de tenente, tive de escoltar uma leva de prisioneiros participantes da chamada Inconfidência Mineira nos fins do século XVIII, um movimento militar no Estado de Minas Gerais do Brasil.
As vidas são assim, intemporais e fui no ano de 1790 chamado desde a vila de São Vicente para escoltar presos militares, uns revoltosos capitaneados por Joaquim José da Silva Xavier, conhecido pela alcunha de Tiradentes. Reclamavam contra o pesado pagamento de um tributo em ouro cobrado aos mineiros brasileiros pela coroa portuguesa e, vai daí e para exemplo enforcaram o Alferes por liderar aquela insurreição.
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O curioso disto são os contornos que dão às conjuras para aproveitamento político e, vai daí o pobre alferes viu-se metido em alhadas pelos ideólogos políticos que conjugaram o facto, tal como sendo uma revolta a favor da independência do Estado de Minas Gerais. A tal revolta, quase uma inventação a que chamaram de Inconfidência Mineira. Reinava então a rainha D. Maria I e, ainda estou para saber por que carga de água, fui eu o nomeado para tal tarefa, quando um sargento ou cabo-de-guerra o poderiam fazer sem transtorno algum para a administração.
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A estória tem assim destas nuances, mas vim a saber que diplomaticamente assim fui nomeado para me retirarem do Comando da capitânia de São Vicente. Já naquele tempo havia bufos que enchiam as orelhas às gentes de mais galões e querendo livrar-se de mim, um inveterado rebelde que não via a monarquia com bons olhos, aproveitaram a deixa e lá me mandaram para aquele longínquo presidio às margens do rio Kwanza. Há bens que vêem por males…
José Alvares Maciel era o nome mais sonante de entre aqueles degredados e com quem ainda mantive alguns contactos. Foi por ele que vim a saber ser esta peripécia urdida pelos políticos; sei que veio mais tarde a ser solto para divagar como pombeiro (vendedor ambulante) nos matos da Matamba e, acabando por morrer lá para os lados de N´Dalatando, deixando uma prole de filhos com o nome de Alvares.
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Outros supostos mentores civis faziam parte do lote que estiveram presos por algum tempo, destacando-se mais tarde como cidadãos de carreira, uns como funcionários do reino e outros como comerciantes. A luta pela independência do Brasil saiu-lhes pelo cano com as estrias invertidas. Eu mais tarde acabei por ficar destacado na Fortaleza de São Miguel chefiando um destacamento policial situado na rua do Casuno bem junto às cubatas do Palácio do Governador Manuel de Almeida e Vasconcelos de Soveral, 1.º Conde da Lapa - Governador e Capitão-General com quem mantive muito boas reacções.
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Foi nesta minha ida para a Fortaleza de São Miguel da cidade de São Paulo de Assunção de Loanda que tive de recolher elementos e documentos em Massangano a fim de para ali os levar e arquivar. Foi neste então que tive de enrijar o papel mofado, o tal que tinha a palavra Dun no lado supra direito. Ali estava descrita a linhagem de Dun em África que vem de Balthasar Van Dun, também conhecido como Van Dunem.
Dun foi para África como funcionário da Companhia das índias Ocidentais Holandesas mas tinha uma função dupla, a de militar e a de negociador de escravos com os descendentes de N´Gola Kilwanje. Quis a estória que nessa missão dupla e de também negociador com os portugueses, ficar por ali com uma prole de filhos mazombos mamelucos. Os negócios sempre suplantam as políticas e, eis que eram os próprios portugueses que vendiam escravos a este inimigo holandês de origem, um súbdito de Maurício de Nassau.
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Van Dun teve forçosamente de lidar com o pai da Kianda Roxo, Morgan Tsvangirai pois era ele que cobrava as taxas para o reino através de posturas lançada pelos governadores Pedro César de Meneses, em oposição aos Holandeses e Francisco de Souto-Maior, ambos capitães generais. Como almoxarife de Massangano, tinha a seu cargo o trato comercial e a recolha dum percentual na venda individual ou lotes de peças e, aqui ficavam arquivados os livros em estas malas seladas com lacre e chancela real do M´Puto. Lamentavelmente, todo este material envelhecia sem os necessários resguardos dum bibliotecário.
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Os escravos “peças negras” eram enviados para o Recife, base de Nassau no Brasil. Van Dum era um bom comerciante, sabia como fazer os seus tráficos, tanto com os portugueses como com os Reis e Sobas de Angola. Sua esposa era negra, e era mais racista que ele próprio. Tudo isto me foi confidenciado já nem sei em que circunstâncias, pela Kianda Roxo em plena quiangala. Sei que isto se passou na rua do Casuno, em um terraço cheio de buganvílias rosas; isto, eu lembro! Ainda posso cheirar aquele aroma à mistura com o ar húmido vindo do mar da baia de Loanda à mistura com as muitas flores que ali havia.
Ela, a kianda Roxo tinha uma relação próxima com as filhas de Van Dunem; E, nem uma kianda consegue guardar confidências para todo o sempre. E, foi logo a seguir a estes encontros que a mente de Roxo se sumiu gerando um outra versão de calunga escafedendo-se nas brumas de uma outra e mais outra kianda com nova posturas de espirito matumbola, assim como numa metamorfose complicada.
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As Kiandas Roxo e Oxor de agora, andam entre continentes não se recordando da cor de sua casca holográfica naqueles idos tempos de mar muito azul. E, ora são gente de carne e osso e, logologo mudam para uma assombração invisível para todos, menos para mim; mas, só após introduzir uma palavra secreta e uma reza curta perante N´Zambi, o mago dos magos. Recordo que já nesse longínquo ano, eu e ela víamos as implicações éticas que este fenómeno tem naturalmente, o de ter em conta que a escravatura não começou com a chegada dos Europeus a África.
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A Rainha N´Zinga, com o nome cristianizado de Dona Ana se Sousa “N´Gola”, seu título real em quimbundo, dominou a região conhecida hoje por Angola. Para além de ser considerada a primeira nacionalista de Angola, foi também a sua primeira grande colonizadora pois que durante o seu reinado anexou outros reinos e territórios, submetendo e escravizando seus súbditos, vendendo-os aos portugueses e Mafulos que os levavam para o Brasil.
Por isso dizer-se que a escravidão, sob formas diversas, já existia nas tribos locais. Com um copo de gim e água tónica no lugar do Gato Preto de Rio Maior, a 27 de Maio de 2017, pude recordar aqueles longínquos dias e, de novo falar em sonhos ao som de merengues kizombados com terna amizade. E, curiosamente nem se falou nessa “Gloriosa Família” do tempo dos flamengos e, que deu ao M´Puto a primeiríssima ministra de pele morena, de um preto menos preto. A nossa Ministra da Justiça! Vejam só como a estória dá voltas…
(Continua…)
O Soba T´Chingange
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