CASSOALÁLA - ANGOLA. Outros tempos
Crónica 3438 – 17.07.2023 - TEMPOS DA DIPANDA*
- Estávamos em Junho de 1975; tinha 30 anos de idade…
Por T´Chingange – Em Cantanhede do M´Puto
Cheguei ao M´Puto ainda a tempo de diligenciar junto ao hospital de Torres Novas a fim de tirar a dita cuja bala ao meu pai, num tempo que só o foi no posterior e no ano de 1997; o meu pai, “o Cabeças” tinha sido bem apetrechado de porrada no após rapto junto ao largo da Maianga, junto aos Correios pelos homens do Nito Alves, foi o que disseram e, parece mesmo ter sido combinação para mandar o velho kota branco meu pai, para a sua terrinha.
Mesmo passado algum tempo “o Cabeças” parecia o mapa-mundo em manchas de sangue pisado, havia pouco espaço por cobrir; deram-lhe um tiro no escuro, algures num sítio quase fatal e, desandaram deixando-o espernear por detrás do então aeroporto Craveiro Lopes ou de Belas e, como quase morto, assim ficou contornado de capim; arrastou-se toda a noite até que, numa picada e já de dia, uma patrulha mais governamental emepelista o levou para o hospital Maria das Pias.
Um hospital abarrotado de gente esperando tratamento em todos os espaços. Dizem as crónicas que morreram nesse então mais de 30 mil angolanos que, decerto, não seriam todos fraccionistas. O kota meu pai, pela descrição posterior teve por demasiada sorte em sobreviver no meio de tantos moribundos; obrigado doutor Boavida do Banco de Angola! Se não fosse o senhor metê-lo no avião ainda hoje estaria imaginando o seu estatuto vivente, envolto numa teia de dúvida entre os muitos abatidos no 27 de Maio de 977.
Esta estória sem direito a “h” foi uma verdade a setenta e cinco por cento, com os restantes vinte e cinco, de inventação para suavizar o quase impossível ou inacreditável mas, eu continuei sendo o mano da UNITA do Kalakata da Caála; desconvocado da guerra, acantonei-me voluntariamente nos mugimbos do degredo da diáspora. Agora posso recordar de quando candengue, ouvir várias histórias passadas nessa terra inóspita, exigente nas suas relações, terrivelmente perigosa, mas simultaneamente atraente e amada.
Lembrar os comerciantes do mato, que viviam absolutamente isolados, originando a criação de alguns Postos Administrativos criados para disciplinar a soberania colonial. Que no tempo, foram surgindo estradas na forma de picadas que, pouco a pouco apareceram as carreiras mistas de passageiros e de carga depois do desenvolvimento de carros Ford, Chevrolet, Dodge e outras mais, como o Nash. Timidamente, a partir de 1920, o M´Puto já sem o Brasil independente já há 98 anos, viraram-se para ali - Angola, terra de onde nunca saímos em lembrança.
Havia as ligações com o interior a partir da costa mas, de ínfima ocupação humana a partir de Sá da Bandeira, Ambriz, Luanda Novo Redondo ou Moçâmedes. Era um problema chegar ao Huambo, atravessar o rio kwanza e de Benguela ao Humbe indo de carroça bóher, lá para as terras do fim do mundo numa eternidade. Só havia transportes lá de longe-em-longe para entrega de produtos, os necessários ao comércio tais com como enxadas, picaretas e ferramentas forjadas em Luanda ou na Metrópole chamada de M´Puto.
Mas, havia aventureiros funantes que se arriscavam a montar um boteco lá no cú de judas, levando sementes para suas lojas originando lavras; introduziram o milho e, com sementes de mandioca levadas do brasil começaram a fazer farinha de funje; levaram laranjas do oriente, abacates da índia introduzindo assim disciplina no uso e amanho da terra. Foram surgindo núcleos de gentios que permutando coisas com os funantes fubeiros mestiços ou brancos melhoravam sua maneira de vida. Ambos prosperaram trocando cornos de elefantes e mel com cachaça ou vinho do M´puto, viveres novos como o arroz a massa e a batata trazida do Peru.
O negócio com o nativo era tão intenso que, essa rude gente rápidamente aprendia por necessidade seus dialectos. Mais tarde formaram Postos Administrativos, e com seus cipaios coordenavam as várias actividades; iniciou-se a cobrança de impostos de cubata e. outros que foram surgindo com o lento progresso. As administrações sem sobrecarregar a autoridade do reino do M´Puto geriam os lugares, os kimbos, as insipientes infraestruturas das povoações. Abriram Delegacias de saúde, centros de sanidade animal e novas linhas férreas.
Glossário
Bandalheiros – sem ordem; Imbambas – coisas, bikuatas; maka – rixa, briga, barulho, confusão; emepelá – movimento popular de Angola; banguista - vaidoso, com estilo; camundongo - rato, natural de Luanda ou arredores; fubeiro – negociante de fuba, tasqueiro de mato em Angola; Pópilas – expressão de admiração; flor-de-congo – eczema na zona das virilhas, parecido com psoríase; esquindivado – escondido de forma fintada; caxinde – erva-do-chá príncipe (Angola); mugimbos – diz-que-diz, boatos, mexericos, conversa por conversar; NT – Nossas Tropas – Militares portugueses; kamba – amigo, conhecido de infância; Catetense – natural de Catete; cazucuta – que vive de expedientes, bandalheiro, dado a embustes; mabanga – bivalve; funje – farinha de mandioca; marufo – vinho, seiva de palmeira fermentada; bazar – dar o fora, fugir; haca! – Exclamação por admiração, espanto em Umbundo (generalizado por toda a Angola); T’ximbicando – acto de navegar com pau longo ou bordão, em zig-zag; candengue – criança, jovem; Porrada – pancada;
O Soba T´Chingange
RECORDAÇÔES ANGOLA
fogareiro da catumbela
aerograma
NAÇÃO OVIBUNDU
ANGOLA - OS MEUS PONTOS DE VISTA
NGOLA KIMBO
KIMANGOLA
ANGOLA - BRASIL
KITANDA
ANGOLA MEDUSAS
morrodamaianga
NOTICIAS ANGOLA (Tempo Real)
PÁGINA UM
PULULU
BIMBE
COMPILAÇÃO DE FOTOS
MOÇAMBIQUE
MUKANDAS DO MONTE ESTORIL
À MARGEM
PENSAR E FALAR ANGOLA